O ex-secretário de Saúde da Bahia, exonerado após xingar a chef de cozinha Angeluci Figueiredo de “vagabunda”, gravou um vídeo de despedida e postou nas redes sociais. Na publicação, ele diz que “honrou missão” do cargo e que aprendeu muito com os servidores.
No vídeo, Vilas-Boas não voltou a comentar o episódio de agressão verbal. O ex-secretário aproveitou para falar sobre os investimentos na saúde pública e o legado que deixa para a próxima pessoa a liderar pasta. Por enquanto, interinamente, o cargo é ocupado pela subsecretária Tereza Paim.
“Considero que chegamos aqui, nesses seis anos e meio de governo, tendo avançado bastante na construção do sistema público de Saúde. Não só na assistência básica, mas também na assistência de média complexidade e na assistência hospitalar. Fizemos uma revolução na saúde pública, investimos bilhões de reais na construção de mais de 20 policlínicas regionais de saúde, 10 hospitais e mais de 36 unidades sendo reformadas, ampliadas e sendo modernizadas”.
“Deixo para o meu sucessor uma secretaria organizada, unida, com projetos em andamento para serem lançados para os próximos quatro a seis anos”, destacou Vilas-Boas.
O ex-secretário também agradeceu ao governador Rui Costa pelo convite para assumir a pasta. Ele estava no cargo desde 1º de janeiro de 2015.
“Quero agradecer a todos os servidores da Secretaria Estadual de Saúde, que estiveram ao meu lado. São dezenas de pessoas que trabalharam diretamente comigo, foi um grande aprendizado e quero agradecer a cada uma dessas pessoas pelo que me ensinaram. Aprendi bastante aqui na secretaria e vou levar essa bagagem comigo. Deixo a eles todo o meu abraço, a minha estima e o meu respeito”.
“Tenho a convicção de que ao longo dos próximos anos da minha vida nos encontraremos de novo em outras oportunidades. Eu tenho a certeza de que soube honrar a missão que me foi confiada, soube honrar o nome da minha família e soube honrar à minha família e aos meus amigos. Considero aqui a minha missão cumprida”, avaliou.
Exoneração
Fábio Vilas-Boas pediu exoneração do cargo, na terça-feira (3), dois dias após o episódio de agressão verbal. O governo da Bahia informou que o substituto dele será anunciado nos próximos dias.
Vilas-Boas tem 54 anos e é graduado em medicina pela Universidade Federal da Bahia (Ufba), Residente e Doutorado em Cardiologia pelo InCor e pela Faculdade de Medicina da USP, além de Fellow do American College of Cardiology.
Ainda na manhã de terça, ao G1, o governo havia informado que não ia se manifestar sobre a situação. No entanto, por volta do meio dia, a gestão voltou atrás e emitiu uma nota em que afirma lamentar a agressão verbal.
“Por meio da Secretaria de Comunicação, o governo do estado afirma lamentar o episódio, considera inadmissível qualquer tipo de agressão e manifesta total solidariedade à empresária Angeluci Figueiredo e a todas as mulheres”, disse a nota.
Agressão verbal
A ofensa foi feita no domingo (1º), depois que a chef comunicou a Vilas-Boas que a reserva feita por ele, para o restaurante que fica na Ilha dos Frades, na Baía de Todos-os-Santos, em Salvador, teria que ser cancelada, por causa do tempo chuvoso na capital baiana.
O xingamento foi feito por uma mensagem de texto em um aplicativo. No dia seguinte, após a repercussão do caso, o secretário chegou a pedir desculpas à chef e às pessoas que “se sentiram ofendidas”, por meio de sua conta em uma rede social.
No último final de semana, a Capitania dos Portos recomendou a restrição de navegação na Baía de Todos-os-Santos, por causa da instabilidade do tempo e das variações do vento, o que causa má condição de navegação. Por causa da mesma recomendação, a travessia Salvador-Mar Grande também foi suspensa.
Diante da orientação da Marinha, a chef Angeluci optou por não abrir o restaurante e cancelar o atendimento. Com o cancelamento da reserva, o secretário de Saúde então passou a ofendê-la por mensagens.
“Esqueça de me ver de novo aqui. E ainda paguei R$ 350 para desembarcar. “Amigo o caralho! Vagabunda”, escreveu ele.
Depois de sofrer a agressão verbal, a chef Angeluci questionou a postura agressiva do secretário e os xingamentos.
“O que o autoriza, no exercício de uma função pública das mais relevantes do estado – a de secretário de Saúde do Estado da Bahia e, durante uma pandemia, o que torna a sua função sinhá mais responsável – chamar uma mulher de VAGABUNDA?”, disse Angeluci.
“Os tempos mudaram, secretário: inexistem contextos que justifiquem essa relação de senhorio e vassalagem. Eu não sou vagabunda. Sou uma mulher digna, honrada, profissional, empresária, geradora de empregos e com uma árdua rotina de trabalho, física, inclusive, para realizar um sonho e um projeto de oferecer aos meus clientes um serviço de qualidade”.
Angeluci também identificou o posicionamento de Vilas-Boas como misógino. Misoginia é a palavra usada para determinar a relação de ódio de homens, com relação às mulheres.
“O senhor sabe o que é ser misógino, secretário? Sabemos que sim, o senhor sabe. Mas sabemos que nesse país ninguém é racista, ninguém é misógino. Aqui não há nunca vítimas, só ‘vitimismo’ e ‘mimimi’, afinal devemos garantir que autoridades se sintam à vontade para sacar o telefone e chamar uma mulher de vagabunda, simplesmente porque pode, porque um desejo foi frustrado pelo tempo”.
A chef também questionou se o secretário chamaria o dono de um restaurante de “vagabundo”, caso a mesma situação ocorresse com um homem branco. Angeluci é uma mulher negra.
“O senhor sabe que não sou vagabunda, não sou irresponsável, não vivo de mesada de quem quer que seja e que, diferentemente do que o senhor me escreveu, eu preciso trabalhar”, disse a chef.