Presidente da Câmara pelos últimos quatro anos, o deputado Arthur Lira (PP-AL) afirmou em seu discurso de despedida ter buscado “convergências”, que sai do cargo com a sensação de “dever cumprido” e será um “soldado do parlamento
— Estarei ao lado de cada um de vocês no bom debate do Plenário. Seguirei como um soldado do Parlamento, representando não somente os mais de 220 mil alagoanos que confiaram a mim essa missão, mas também toda população do meu estado, além dos mais de 200 milhões de brasileiros a quem servi de peito aberto, com muito amor, honra e espírito público.
Em meio à uma queda de braço do Congresso com o Supremo Tribunal Federal sobre a execução de emendas, Lira também defendeu a “participação ativa” do Legislativo no Orçamento.
— Defendi, com toda convicção, a importância da participação ativa do Poder Legislativo na confecção da peça orçamentária, considerada a pluralidade natural de ambas as Casas e o profundo conhecimento que cada parlamentar carrega de todos os cantos de nosso gigante país — disse Lira, em referência às emendas parlamentares.
Lira também se disse confiante na eleição de Hugo Motta (Republicano-PB), candidato que tem o seu apoio, para sucedê-lo.
— Bom trabalho, meu amigo Hugo Mota. É uma alegria passar o bastão para você, depois da costura fina que nos permitiu chegar a um nome de consenso, com ampla capacidade de aproximar opostos — disse Lira.
Lira se despede do cargo sendo um dos fiadores da expansão das emendas parlamentares, no centro de uma crise com o Supremo Tribunal Federal (STF), patrocinando um recorde de projetos tramitando em regime acelerado e com a entrega de pautas há anos na gaveta, caso da Reforma Tributária.
Após se mostrar como aliado fiel de Jair Bolsonaro , a despeito de alguns solavancos como no pronunciamento em que alertou para um “sinal amarelo” sobre a condução do governo na pandemia, Lira fez uma leitura rápida da mudança de cenário. Telefonou a Lula assim que a vitória eleitoral foi anunciada em 2022, se aproximou de Fernando Haddad, que assumiria o Ministério da Fazenda, e ajudou na aprovação da PEC da Transição, que deu fôlego fiscal na largada do terceiro mandato de Lula.
Meses antes, quando Bolsonaro tentava a reeleição, Lira havia ajudado na aprovação de uma série de benefícios que expandiram gastos públicos, como a ampliação do Auxílio Brasil. A empreitada teve o auxílio do deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), escolhido por ele para a sucessão em uma caminhada que motivou o estremecimento da relação de Lira com Elmar Nascimento (União-BA), amigo de longa data que contava com o apadrinhamento. Com a virada de governo, Motta foi mais um a se aproximar da gestão petista e herdará a necessidade de resolver um impasse que vem se arrastando desde o ano passado.
Controle de verbas
Com a explosão das emendas, que saltaram de R$ 19,1 bilhões em 2019 para R$ 50,1 bilhões em 2024, foi crescendo também a tensão entre Executivo e Legislativo pelo controle das verbas. No ano passado, o ministro Flávio Dino, do STF, ex-titular da pasta da Justiça sob Lula, determinou a suspensão de pagamentos e impôs a criação de novas regras de transparência. O Congresso aprovou um projeto, que virou lei após a sanção presidencial, mas Dino deu novas decisões estipulando outras normas para a liberação.
Integrantes dos três Poderes apostam que não haverá solução rápida para a crise, panorama bem diferente do ritmo veloz imposto por Lira para aprovar projetos do seu interesse. O “tratoraço” resultou no recorde de propostas que ganharam regime de urgência, mecanismo que permite a votação diretamente no plenário.
Virou praxe para Lira discutir com os líderes de partidos projetos que eles avaliavam como relevantes nas manhãs de terça-feira e, muitas vezes no mesmo dia, à noite, levar a proposta diretamente para votação em plenário.
— A excessiva aprovação de requerimentos de urgência foi um ponto de crítica. Embora garanta rapidez na votação, também acaba limitando o debate em temas de maior complexidade — diz o deputado Gilberto Abramo (Republicanos-SP), futuro líder da sigla.
Lira, por sua vez, diz que não usa “o regime de urgência sozinho” e argumenta que sua gestão foi marcada pelo maior protagonismo do Legislativo, que antes, segundo ele, era um “carimbador de Medidas Provisórias” do Executivo.
Lira foi o presidente da Câmara que conseguiu aprovar a Reforma Tributária, projeto que sempre foi prioritário, mas ainda não havia deixado as gavetas. Foi mais um caso em que a agenda esteve alinhada à do governo Lula e a setores do mercado, de quem se aproximou com viagens frequentes a São Paulo e conversas com investidores.
— A principal marca do Arthur (Lira) foi a entrega da Reforma Tributária, que é a mais importante reforma para o Brasil. Sem ele e o presidente do Senado (Rodrigo Pacheco), isso seria impossível — afirma o deputado Baleia Rossi (SP), presidente do MDB.
Lira conseguiu para o governo votos favoráveis em outros projetos da área econômica, como o arcabouço fiscal e a taxação de lucros dos “super-ricos” em aplicações financeiras offshores. Já a regulamentação das redes sociais ficou travada diante da pressão da oposição. No momento que qualifica como o mais “duro” dos quatro anos, Lira viu um assessor próximo ser alvo de um mandado de busca e apreensão em uma operação da Polícia Federal sobre fraudes na compra de kits de robótica. A investigação acabou arquivada.