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sexta-feira 29 de julho de 2022 às 07:43h

Em crise financeira, UCSAL é vendida a grupo de Brasília

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Maioria das universidades locais já é administrada por grupos de fora da Bahia

De acordo com matéria do jornal Correio*, a Universidade Católica de Salvador (Ucsal) passará a ter uma nova direção. Mantida pela Associação Universitária e Cultural da Bahia (AUCBA), a segunda universidade do estado está em fase de negociações, em vista de um contrato, com o Ecossistema Brasília Educacional. De acordo com informações da instituição de Brasília, eles estão cientes das dificuldades financeiras e de gestão da universidade baiana e pretendem “dar fôlego” para poder resolver as demandas.

Em agosto do último ano, os professores da universidade chegaram a indicar que fariam uma greve por tempo indeterminado devido a atrasos salariais, o que acabou não acontecendo após acordo. Mas as reclamações sobre a deterioração na Ucsal são antigas, e se intensificaram após 2004, quando denúncias de desvio de dinheiro na instituição — estimado em R$ 36 milhões —, levaram ao indiciamento do seu então diretor financeiro.

Os alunos também são prejudicados. Em 2017, estudantes da instituição protestaram contra o reajuste de 9% na mensalidade. A Ucsal é uma universidade privada sem fins lucrativos, mantida basicamente pelos recursos advindos das mensalidades dos estudantes. Com isso, todos os recursos financeiros que são gerados a partir do negócio, têm que ser reinvestidos no próprio curso, para que se auto financiem. Mas pelo histórico recente da universidade, com acúmulo de dívidas e passivo de salários, a instituição não é capaz de se manter a médio e longo prazo.

Em nota, a Ucsal afirma que a mantenedora AUCBA, “com o intuito de melhorar e aperfeiçoar sua gestão administrativa e acadêmica e superar suas dificuldades financeiras, estabeleceu negociações em vista de um contrato com o Ecossistema Brasília Educacional, para a gestão de suas atividades, passando a contar com o seu apoio técnico”.

Professores temem o resultado da fusão, a partir da experiência de outras universidades particulares baianas, mas preferem não se manifestar. Mesmo representantes da Associação Baiana de Mantenedoras do Ensino Superior (Abames) afirmam que o assunto deve ser tratado diretamente com a Católica. “Assunto delicado”, dizem. Por parte da Arquidiocese de Salvador, também não há opiniões.

Quando foi fundada, em 1961 a universidade explicou em documento ter surgido “em decorrência da preocupação da Igreja Católica, sob os auspícios do primeiro Grão-Chanceler, D. Augusto Cardeal da Silva, Arcebispo da Bahia e Primaz do Brasil, de preservar uma identidade e uma unidade de formação do ensino superior inspirada no ideário cristão e com a finalidade de “contribuir […] para o aprimoramento da cultura e da educação”, de “estimular a investigação” e de favorecer “o desenvolvimento da solidariedade humana””.

Desde então, formou grandes nomes da política como o atual prefeito de Salvador, Bruno Reis (União), o senador Otto Alencar (PSD), o procurador-geral da República Augusto Aras. Intelectuais como os historiadores João José Reis e Carlos Zacarias também passaram pela universidade, além de artistas como a cantora de axé Cláudia Leitte.

Após 61 anos de história, no entanto, o futuro da universidade é incerto. De acordo com a doutora em Educação Vanessa Borges, autora do livro “Inserção Internacional às avessas: ensino superior na periferia do capitalismo”, o que acontecerá com a Ucsal é de fato a venda. “Isso de nova gestão é só uma maquiagem. A gente vai ouvir um discurso que é repetitivo e é muito comum por parte desses grupos empresariais, que eu chamo de Edu business”, afirma.

Brasília Educacional

O Ecossistema Brasília Educacional é um grupo educacional que se apresenta como uma entidade que busca “expandir e consolidar o mercado educacional nas regiões Centro-Oeste, Nordeste e Norte do Brasil”. Eles atendem à educação básica, superior, técnica, e o Ensino à Distância.

Educação de negócios

A grande maioria das universidades baianas já é administrada por grupos empresariais nacionais e internacionais. A primeira faculdade privada da Bahia a ser comprada por um grupo estrangeiro foi a Unijorge. Hoje, Unifacs — comprada inicialmente por um grupo estrangeiro chamado Laurent e agora por um grupo nacional —, a Área 1, UniFTC e Unime também integram o time de instituições administradas por capitais de fora do estado. Uma das poucas que permanece sob gestão dos mesmos sócios fundadores é a Faculdade Bahiana de Direito.

Segundo Vanessa Borges, que dedica estudos ao assunto, essa é uma tendência nacional de entender a educação como um negócio. “A lógica entre abrir e manter um clube recreativo e uma faculdade é a mesma: gerar um lucro”, afirma. A lógica mercantil, entretanto, aconteceria em detrimento da educação de qualidade.

Entre 2019 e 2021, dados do Ministério Público da Bahia (MP-BA) apontaram que 469 denúncias foram registradas, somente em Salvador, contra estabelecimentos privados de ensino superior, entre 2019 e 2021.

A especialista, com base nos estudos e experiência de outras universidades baianas, arrisca um palpite sobre o que acontecerá com a segunda universidade da Bahia dentro de pelo menos 18 meses.

“As práticas que acontecem com maior regularidade são uma forte ingerência por parte do novo grupo gestor, que são pedagogicamente incoerentes, mudanças nas matrizes curriculares, criação de disciplinas institucionais comuns a todos os cursos, diminuição de carga horária das disciplinas, diminuição de professores em tempo integral — vinculados a pesquisa, uso de 40% de disciplinas na modalidade EAD”, afirma.

O grupo Brasília Educacional afirma, em seu projeto de futuro, que prioriza o modelo de ensino em formato híbrido. A Católica já oferece alguns cursos em modelo EAD, mas isso deve ser aprofundado.

O ensino nas universidades privadas da Bahia pode também ter uma mudança de perfil. “A gente vai ter uma formação profissional mais tecnicista porque uma outra característica dessas instituições de ensino superior é a diminuição das disciplinas que ofereçam reflexão. Isso pode trazer consequências sociais profundas e duradouras porque estamos falando em formar pessoas – em sua completude – não só prepará-las para exercício profissional”, diz Vanessa.

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