O presidente Jair Bolsonaro assumiu o governo com a promessa de avançar em pautas de costumes e de segurança públicas. De lá para cá, matérias caras ao mandatário não progrediram no Congresso. Mesmo com a ida do Centrão ao governo, e a presidência da Câmara sob Arthur Lira (PP-AL), integrante e articulador de uma legenda de centro, o governo não conseguiu avançar no que considera prioritário das pautas de costumes.
Agora, o governo quer tentar, em seu último ano de gestão, aprovar alguma matéria antes das eleições, em um aceno à base. Líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR) afirma que a intenção é pautar os assuntos e “ir no voto”. “Vamos enfrentar as matérias e aí ver se temos voto. É um esforço”, disse.
A ideia é aproveitar o ano eleitoral para pressionar lideranças a votar a favor de matérias de costumes e de segurança, como educação em casa (homeschooling) ou o projeto que libera o porte de armas para diversas categorias de servidores públicos.
Ao R7, Barros afirmou que não houve erro por parte da articulação do governo ao não conseguir avançar nas matérias. “Simplesmente não houve ambiente para votação. A gente aguarda o momento certo”, disse. “Acho que poderá existir [ambiente] agora em ano eleitoral. As pessoas vão ter que tomar uma posição, sim ou não. Esses são temas que estão na pauta da sociedade. Vão votar a favor ou contra, e isso vai ser julgado pelo eleitor”, pontuou.
De cinco projetos que se encaixam na pauta de costumes que foram entregues pelo governo à Câmara como prioritários no início do ano passado, nenhum foi aprovado. Um deles é o texto que prevê excludente de ilicitude (ou seja, ausência de penalização até em casos de morte) para militares que participarem de operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO).
Dois tiveram avanço: um que inclui pedofilia como crime hediondo, que foi aprovado na CCJ (Comissão de Constitutição e Justiça) no fim do ano passado; e o outro que aumenta a pena para crimes contra crianças e adolescentes, aprovado na comissão em maio do ano passado. Ambos ainda precisam passar pelo plenário da Casa.
Outras matérias sempre comentadas por núcleos bolsonaristas, como a chamada “escola sem partido”, não tiveram mudança alguma no Congresso. No caso do Senado, os três projetos de costumes enviadas ao presidente Rodrigo Pacheco (PSD-MG) como prioridade do Executivo no começo do ano passado não avançaram.
Um deles altera regras de registro, posse e comercialização de armas de fogo por CACs (caçadores, atiradores e colecionadores). Houve tentativa de votação do projeto na CCJ no fim do ano passado, mas, sem sucesso, ficou para este ano.
A situação deve ficar ainda mais difícil no Senado após a saída do líder do governo Fernando Bezerra (MDB-PE) no fim de 2021. O clima se complicou para o governo devido à forma como o senador saiu, após uma derrota acachapante na eleição para conselheiro do TCU (Tribunal de Contas da União). O governo ainda não conseguiu definir uma nova liderança. No fim do ano passado, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho do presidente, defendeu a ideia de que o mandatário precisaria escolher um novo líder ainda em 2021, para que pudesse começar as articulações no início deste ano.
O governo, entretanto, segue sem liderança no Senado. Tendo em vista que as Casas trabalham de forma conjunta, é ineficaz aprovar uma matéria na Câmara e não conseguir passá-la no Senado. Apesar do cenário, Barros afirma que o governo está correto ao esperar o fim do recesso, com o posicionamento de partidos, para “equacionar uma solução dentro do contexto político que seja adequada”.
“Escolher o partido certo do novo líder, escolher o perfil certo do novo líder, que vai depender do alinhamento das forças para a eleição. A conjuntura política é ampla, é preciso ter a visão do conjunto para poder avançar”, disse.
Outras pautas prioritárias
Além das matérias tidas como de costumes, o governo tem como prioridade assuntos criticados por especialistas e organizações da sociedade civil. O líder do governo citou os projetos de licenciamento ambiental e regularização fundiária. Esse último foi aprovado na Câmara em agosto do ano passado e, agora, está no Senado. O projeto foi apelidado de PL da Grilagem, quando regulariza a ocupação indevida de terras públicas, inclusive de áreas visadas como a Amazônia.
Já o projeto sobre licenciamento ambiental altera processos, facilitando-os em alguns casos ao dispensar o licenciamento para várias atividades e obras (como postos de combustíveis e pontes), questão criticada por ambientalistas. Ambos os projetos já foram citados em carta enviada por parlamentares alemães ao Congresso, apontando receio de que as matérias que flexibilizam regras de proteção ao meio ambiente sejam aprovadas.
Barros também citou como matérias prioritárias a modernização do setor elétrico e a redução do valor mínimo das PPPs (parcerias público-privadas). “Essas pautas são as pautas que estão tramitando já, maioria está no Senado, estamos esperando voltar para resolver. Defensivos agrícolas também são uma matéria importante”, pontuou.
Apesar da extensa pauta, sabe-se que, em ano eleitoral, o foco dos parlamentares fica em seu estado de origem, seja na tentativa de reeleição, seja na busca de se elegerem a outros cargos. Barros garante que, ainda assim, haverá tempo para analisar projetos caros ao presidente Bolsonaro a tempo das eleições. “As convenções [partidárias] são só depois do recesso, em agosto. Tem muito chão ainda”, afirmou.