O bilionário rei da droga mexicano Joaquín “El Chapo” Guzmán ostenta uma meteórica carreira criminosa. De mulheres ao característico bigode, uma série de aspectos o conectam a Escobar, seu antecessor colombiano.
Segundo Nicolas Martin , da DW, a vaidade foi o que colocou narcotraficante mexicano Joaquín “El Chapo” Guzmán atrás das grades. Ao que tudo indica, seu encontro com o ator Sean Penn, num local até então desconhecido, deu a pista aos investigadores. A intenção era discutir com o ator americano o possível elenco de um filme autobiográfico.
Após a captura de El Chapo, Penn publicou um relatório da entrevista, salpicado com absurdos situacionais (como quando o ator solta flatulências) e citações megalomaníacas do gênero: “Forneço mais heroína, metanfetamina, cocaína e maconha do que qualquer outra pessoa no mundo.”
Na verdade, entretanto, não há muito mais informações sobre a vida e atividades do traficante, nascido em 1954 e 1957 (ponto em que as fontes se contradizem). Porém sabe-se bem mais sobre seu antecessor, um rei da droga latino-americano e hoje legendário: Pablo Escobar Gaviria (1949-1993), da Colômbia.
As semelhanças de que se tem conhecimento até o momento são espantosas: se ambos tivessem atuado simultaneamente, com grande probabilidade seriam inimigos. Confira:
1. De joão-ninguém a multibilionário
O pai de Escobar criava gado, o de El Chapo trabalhava no campo. Desde cedo, ambos os futuros criminosos trocaram a agricultura pelo submundo. “Pode ser que eu seja pobre, mas não vou morrer pobre”, proclamava o colombiano já após a primeira comunhão, segundo um primo. Ele começou a carreira com cigarros contrabandeados, passando depois para automóveis roubados.
Tendo entrado no mundo do crime através de um tio, aos 15 anos El Chapo já vendia maconha. Passadas duas décadas, já chefiava seu próprio narcocartel, o de Sinaloa. Em 2013, a revista econômica Forbes o colocava em 67º lugar entre as personalidades mais influentes do mundo. Já a fortuna de Pablo Escobar foi avaliada pela publicação em 30 bilhões de dólares.
2- Bigode, gosto e tamanho
Ambos fizeram de tudo para cultivar uma imagem de macheza brutal, desde o bigode a uma vasta coleção de camisas havaianas (Escobar) ou de caubói (El Chapo).
Em relação ao apelido, Escobar foi quem teve mais sorte, sendo reverenciado por seus subalternos e pela imprensa como “El Patrón”. “El Chapo” por sua vez, se refere à baixa estatura do mexicano, entre 1,68 m e 1,72 m. Uma injustiça irônica, pois o rei da droga colombiano era ainda mais baixo, medindo apenas 1,66 m.
3- Fraco pelas mulheres
Além de Sean Penn, na captura de El Chapo uma mulher também desempenhou um papel ainda não totalmente esclarecido. A atriz mexicana Kate de Castillo estava envolvida na planejada filmagem da autobiografia do criminoso. A partir da prisão e, mais tarde, do esconderijo, ele já tentara enviar-lhe flores e presentes.
Além da esposa, Escobar esteve envolvido com várias amantes e prostitutas. Entre essas ligações amorosas, a mais importante foi com a jornalista Virginia Vallejo, que entre 1983 e 1987 manteve um relacionamento com o chefe do cartel de Medellín.
4- Humilhação para o Estado
Os bilhões de narcodólares dos dois criminosos latino-americanos estendiam seu poderio até os mais longínquos confins do México e da Colômbia, respectivamente. Sob o lema “plata o plomo” – dinheiro ou chumbo –, ambos compravam advogados, políticos e opositores.
Prova da extensão dessa corrupção foi a segunda e última fuga de El Chapo de um presídio de alta segurança, através de um túnel ventilado. É praticamente consenso que funcionários de alto escalão estatal tinham que estar sabendo dos planos de fuga.
Escobar foi um passo adiante, construindo a própria prisão. Após a captura em 1991, ele se retirou a um cárcere de luxo. Segundo “Popeye”, um dos assassinos de aluguel do colombiano, “eles construíram uma cerca elétrica em torno do presídio, com 10 mil volts, e o interruptor ficava na cela de Pablo”.
5- Inteligentes e globalizados
Costuma-se atribuir inteligência e instinto de poder aos homens de negócios bem sucedidos. Escobar é considerado o pioneiro do narcotráfico global, estabelecendo parâmetros que El Chapo mais tarde aperfeiçoaria. Sob o gerenciamento de Escobar, não só a produção explodiu, graças aos laboratórios industriais na selva colombiana: ele também criou uma extensa rede de exportação. Nos tempos mais prósperos, 80% da cocaína nos Estados Unidos provinham do cartel de Medellín.
O cartel de Sinaloa, de El Chapo, foi um passo mais adiante, vendendo também anfetaminas, heroína e maconha. Segundo especialistas, o cartel atua em mais de 50 países, empregando milhares de pessoas em inúmeras firmas ilegais e mais de 250 legais, nas quais os traficantes “lavam” seus lucros.
6- Amor excêntrico pelos animais
Embora ainda não haja fotografias do estilo de vida extravagante de El Chapo, na ocasião de sua segunda captura calculou-se que possuísse 16 casas, numerosas fazendas, alguns aviões particulares, uma coleção de automóveis e até mesmo um jardim zoológico pessoal, onde – segundo boatos – mantinha também ursos, crocodilos e tigres.
Escobar também partilhava essa paixão por animais exóticos: em sua monstruosa propriedade, a Hacienda Nápoles, ele mantinha quase 2 mil espécimes dos cinco continentes. A megalomania de Escobar se manifestava sobretudo em seu desejo de se tornar presidente da Colômbia. No fim, foram justamente tais ambições políticas que o colocaram na linha de fogo.
7- Filhinhos da mamãe
Diz-se que o amor é cego. Tal se aplica, sem dúvida, às progenitoras dos maiores traficantes da história. A mãe de Escobar, Hermilda Gaviria, defendeu o rebento até o fim: “Ele está no céu, pois a caridade apaga todos os pecados terrestres”, dizia a católica devota.
Numa rara entrevista a um documentarista, também a mãe de El Chapo se mostrou pouco crítica: na varanda de sua enorme residência, ela diz considerar uma vergonha o governo culpar seu filho por todos os atos vergonhosos.
8- Brutais e sem consciência
Um atestado psicológico de 2005 traz a prova de que El Chapo está longe de ser inocente. Matar faz parte dos negócios: no caso de se sentir ameaçado, toda forma de violência é legítima para ele, que não conhece o remorso. Sem ser capaz de dar uma cifra exata, após sua recaptura em 2015, El Chapo declarou estimar entre 2 mil e 3 mil os homicídios por que é responsável. A guerra do narcotráfico já matou mais de 150 mil pessoas no México.
Por sua vez, o colombiano Escobar mandou plantar bombas e assassinar políticos e cidadãos inocentes. Também para ele todo meio era válido para defender a si e a seu cartel. Para seus assassinos de aluguel, os “sicários”, ele prometia recompensa pela morte de policiais. “A vida não vale nada”, disse numa entrevista.
9- Adorados como Robin Hood…
Apesar das monstruosas trilhas de sangue que atravessam as vidas dos chefões do narcotráfico, ambos são venerados em suas regiões natais. Escobar doou grandes somas em Medellín e redondezas, mandou construir hospitais e até mesmo habitações sociais para todo um bairro pobre. Hoje, um bairro traz o seu nome.
Também El Chapo é celebrado como herói popular na terra natal, o estado de Sinaloa. Longe de ser visto como assassino em massa, lá ele é visto como um nobre patrocinador de escolas, ruas e igrejas.
10- … e odiados
Com o sucesso, também cresce o número de inimigos. El Chapo e seu cartel têm de combater em diversas frentes. De um lado, contra outros cartéis mexicanos, na competição por mercados e territórios. De outro, contra os EUA e as autoridades do México. A agência americana antidrogas (DEA) chegara a oferecer até 7 milhões de dólares como recompensa por pistas do traficante.
Quase 20 anos atrás, em contrapartida, Escobar já valia 5 milhões de dólares para as autoridades dos EUA. As informações que levaram ao fuzilamento do colombiano pela polícia, em Medellín, partiram de cartéis rivais, os quais assumiram os negócios após a morte de El Patrón.
A diferença
Escobar conseguiu se opor com sucesso à extradição para os EUA. Sob sua pressão – reforçada por atentados a bomba – os políticos chegaram a revogar leis aprovadas. Certos analistas interpretam seu assassinato, em 2 de dezembro de 1993, um dia após completar 44 anos, como um ato de desespero do Estado: a admissão de que todos os juízes, carcereiros e políticos da Colômbia não bastavam para punir o chefão com os meios da lei.
Já beirando os 60 anos, pode ser que El Chapo ainda chegue à idade de aposentadoria – sob a condição de que seja extraditado, para apodrecer numa pacata penitenciária americana. Segundo informações atuais, ainda pode levar um ano até a extradição ser efetuada. Caso ele consiga escapar novamente até lá, então, pode ser que o Estado mexicano perca a paciência e que El Chapo termine como Escobar: fuzilado durante a tentativa de fuga.