O centro histórico da cidade ucraniana de Odessa, às margens do Mar Negro, foi inscrita nesta quarta-feira (25) na lista de Patrimônio Mundial em perigo da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura). Para o prefeito Guennadi Troukhanov, a decisão vai proteger a localidade dos bombardeios russos.
A inscrição na Unesco foi decidida em uma sessão extraordinária em Paris, onde fica a sede da organização. Por seis votos a favor, um contra (Rússia) e 14 abstenções, o Comitê de Patrimônio aprovou a medida.
“É uma vitória colossal para todos os odessenses e para toda a Ucrânia. A cidade merece muito todo esse interesse”, disse Troukhanov à reportagem da RFI. “Na origem, ela é uma cidade europeia: foi construída por grandes arquitetos italianos, foi administrada pelos franceses, pelos gregos. Sinto alegria e orgulho, porque isso acontece em um momento em que as nossas forças armadas defendem a nossa independência. Os nossos soldados hoje combatem por cada pedaço da nossa terra”, ressaltou.
Localizada a 500 quilômetros ao sul da capital ucraniana, Kiev, Odessa é muito simbólica para a história da Rússia. É considerada a terceira cidade do antigo Império Russo e seu segundo porto.
O prefeito lembra que, no início da invasão dos russos em 2022, os moradores de Odessa protegeram o patrimônio cultural da cidade com sacos de areia em volta de todos os monumentos, da ópera e das estátuas. Ele relata que, quando iniciou os procedimentos para a candidatura junto à Unesco, poucos acreditavam que seria possível. “Me perguntavam: você acha realmente que isso vai protegê-los? Eu sempre pensei que sim”, ressaltou Troukhanov.
O pedido de inscrição foi feito em outubro passado, pelo presidente ucraniano, Volodymir Zelensky.
Apelidada de “Pérola do Mar Negro”, Odessa é uma cidade portuária conhecida no mundo pela monumental Escadaria de Potemkin. “Uma cidade livre, uma cidade mundial, um porto lendário que deixou sua marca no cinema, na literatura e nas artes, fica, assim, sob a proteção reforçada da comunidade internacional”, afirmou a diretora-geral da agência especializada da ONU, Audrey Azoulay.
A cidade sofreu bombardeios russos desde o início do conflito, em fevereiro de 2022, mas seu patrimônio permaneceu praticamente intacto. A Escadaria de Potemkin, concebida como a entrada da cidade pelo mar, foi imortalizada no filme histórico “O Encouraçado Potemkin” (1925), do diretor soviético Serguei Eisenstein.
“Enquanto a guerra continua, esta inscrição encarna nossa determinação coletiva de garantir que esta cidade, que sempre se ergueu acima das convulsões do mundo, seja preservada de novas destruições”, acrescentou Audrey.
A designação como patrimônio em perigo “dá acesso a mecanismos reforçados de assistência internacional, tanto técnica quanto financeira”, segundo a Unesco. “A Ucrânia pode solicitar para garantir a proteção do sítio e, caso necessário, ajudar na sua reabilitação”, disse a agência.
Rússia critica instrumentalização da Unesco
A Rússia tentou adiar a votação repetidas vezes e, durante a sessão, criticou a apresentação de um “dossiê superficial” feito com base em um “copia e cola da página da Wikipédia”. Moscou também acusou as autoridades ucranianas de serem responsáveis pela destruição dos monumentos.
Depois da votação, a missão russa na Unesco denunciou, em nota, uma decisão “tomada sob pressão do Ocidente” e acusou o Comitê do Patrimônio de ter se transformado em um “instrumento para acerto de contas políticas”.
O debate foi marcado pelo cenário político. Antes do início da sessão, a Ucrânia protestou, em uma carta aberta aos membros do comitê, contra a inclusão de uma referência à imperatriz russa Catarina, a Grande, como fundadora de Odessa no final do século 18.
“O desenvolvimento de Odessa como cidade portuária remonta ao século 15”, disseram os representantes da Ucrânia.
Em novembro passado, a Câmara Municipal de Odessa votou pela remoção da estátua de Catarina, a Grande, após uma consulta local. O monumento à czarina – que se tornou, para muitos, um símbolo da opressão russa desde o início da guerra na Ucrânia – foi removido no final de dezembro.