Como uma forma de ocupar mais espaços e fazer campanha sem gastar muitos recursos, candidatos passaram a divulgar suas plataformas não só nas redes sociais, mas também segundo Camila Turtelli, do UOL, no Tinder, aplicativo de paquera mais popular no país.
As regras do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) permitem o uso de redes sociais para a campanha neste ano, desde que os candidatos não impulsionem o conteúdo. Os candidatos que estão no Tinder afirmam não usar conteúdo pago na plataforma.
Em quem dar um match. Em sua terceira disputa por um cargo eletivo, o candidato à Câmara dos Deputados pelo Distrito Federal Raphael Sebba (PSOL) decidiu divulgar sua plataforma também no Tinder.
No perfil no aplicativo, ele divulga seu número de candidato e suas plataformas da campanha. “O que a gente faz quando não tem orçamento secreto? Vem pro Tinder fazer campanha”, diz o candidato na área em que o usuário apresenta seu perfil para os interessados.
A ideia de usar o aplicativo, segundo Sebba, surgiu de conversas entre pessoas engajadas na sua campanha.
É uma tática de guerrilha ocupar todos os espaços possíveis, inclusive esse lado da paquera”Raphael Sebba (PSOL)
Neste ano, o partido de Sebba, o PSOL, recebeu R$ 100 milhões de fundo eleitoral — dinheiro público destinado para financiar campanhas eleitorais — que deve ser dividido entre os mais de 900 candidatos da legenda, seguindo os critérios do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e as definições da sigla.
“Entramos nos aplicativos e o retorno está sendo muito bom. Óbvio que não queremos enganar ninguém, então deixamos explícito que é um perfil de política para a gente falar sobre isso, é um convite a um match político, para ver se a pessoa gosta da gente e dá o voto”, diz Sebba.
Até o momento, ele recebeu R$ 120 mil da direção partidária, segundo os dados informados à Justiça Eleitoral. “Temos pouco recurso, mas estamos conseguindo alcançar muita gente a partir de um engajamento orgânico”, disse.
Outro candidato que tem usado a plataforma com o mesmo propósito é o deputado federal em busca de reeleição Kim Kataguiri (União-SP).
O líder do MBL (Movimento Brasil Livre), no entanto, não é novato nestas inovações. Em 2018, fez campanha até em jogos, como Pokemon Go. “É ótimo, milhares de gamers veem minha campanha todo dia, e aí um reconhece o outro e começa a trocar ideia e jogar junto”, afirma ele.
Kim já estava no aplicativo antes mesmo da campanha. No seu perfil, faz uma piada com sua performance na rede:
Já que não pego ninguém aqui, ao menos, vou usar para fazer campanha”Kim Kataguiri (União-SP)
O partido de Kim, o União Brasil, foi o que recebeu a fatia mais gorda do fundo eleitoral neste ano: R$ 782,5 milhões. O deputado se diz contra o uso do dinheiro público para o financiamento de campanhas e votou pela manutenção do veto para segurar o aumento da verba em dezembro do ano passado no Congresso.
Mas pode fazer campanha no Tinder? As regras da propaganda eleitoral estão contidas na Resolução nº 23.610 do TSE, que dispõe também sobre o horário gratuito e as condutas ilícitas na campanha.
A legislação permite a propaganda eleitoral em blogs ou páginas na internet ou redes sociais das candidatas e candidatos, partidos políticos, coligações ou federações.
É proibido veicular qualquer tipo de propaganda eleitoral paga na internet. A exceção é o impulsionamento de conteúdo, que deverá estar identificado de forma clara e ter sido contratado, exclusivamente, por candidatas, candidatos, partidos, coligações e federações partidárias ou pessoas que os representem legalmente.
Para o cientista político Marcelo Issa, do Transparência Partidária, o uso da plataforma pode promover uma interação mais direta e sem custo.
“É uma forma interessante e criativa de driblar a falta de recursos de alcançar um público mais segmentado também que eventualmente tenha mais afinidade com o candidato. Pode ser uma maneira de criar um engajamento dos eleitores, por meio de uma interação mais efetiva entre o candidato e o eleitor que não ocorre nos mecanismos tradicionais de publicidade”, diz Issa.
Advogado especialista em direito eleitoral pela USP, Renato Ribeiro de Almeida alerta sobre a possibilidade do uso pago da plataforma. Isso porque o Tinder, apesar de ter acesso e uso gratuito, permite que o usuário, mediante pagamento, impulsione seu perfil para que haja maior visualização.
“A grande questão é: o candidato está impulsionando sua visualização no Tinder ou a utiliza como usuário comum?”, afirma. Para ele, se houver pagamento, “há que se verificar se esses valores estão sendo declarados na prestação de contas, se o Tinder dispõe de cooperação com a Justiça Eleitoral no sentido de propaganda eleitoral, se esses valores estão sendo transferidos pelas contas de campanha”.
O especialista reforça que “a não observância dessas regras pode implicar ilícitos como o chamado caixa dois, o qual pode levar à cassação do registro/diploma [do mandato], multa e inelegibilidade por oito anos, nos termos da Lei da Ficha Limpa”.
O UOL procurou a assessoria do Tinder a respeito do uso político do aplicativo, mas não teve retorno. Os esclarecimentos serão publicados se forem recebidos.
Como funciona o Tinder? A plataforma é um aplicativo de relacionamento que pode ser usado em sistemas Android e iOS. O aplicativo combina pessoas a partir de um “match”, quando os dois usuários se curtem mutuamente.
Você pode se cadastrar de maneira gratuita com uma conta do Facebook ou número de celular, para criar um perfil com nome, idade e fotos.
Os pretendentes aparecem para o usuário a partir de critérios pré-definidos como idade, geolocalização ou orientação sexual. É possível então arrastar para o lado direito os quais despertaram interesse (dar um like) ou dispensar jogando para esquerda. Se uma pessoa também curte a outra, ocorre um match, e o chat fica disponível para ambos conversarem.