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quarta-feira 13 de novembro de 2024 às 08:57h

Disputa por precatório federal se acirra e retorno cai

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Depois de o governo federal pagar R$ 95 bilhões em precatórios atrasados neste ano, com outros R$ 100 bilhões estimados para 2025, a disputa por esses ativos ficou mais acirrada. Com mais atores no segmento, a gordura que havia em relação à Selic e ao CDI tem segundo reportagem de Adriana Cotias, do jornal Valor,  diminuído e as gestoras especializadas têm buscado diversificação nas obrigações judiciais contra estados e municípios.

Os precatórios são uma ordem de pagamento determinada pela Justiça. O que os fundos dedicados fazem é antecipar o dinheiro para quem tem direito ao crédito, comprando-o com um desconto. Depois, ganham com a diferença quando o governo efetivamente quita a obrigação, com o valor corrigido pela Selic. Para o investidor que começou a se aventurar pelo segmento, o risco é achar que está entrando numa operação de renda fixa trivial. Não é. Ainda mais com o governo às voltas com um pacote fiscal para equacionar as contas públicas.

Historicamente, a preferência é pelas ações de caráter alimentar, ligadas ao governo federal, que são prioridade no orçamento, consideradas uma alternativa de risco mensurável. Mas o setor ainda tem na memória o trauma daquela que foi apelidada como “PEC do calote”, a Proposta de Emenda Constitucional que durante a gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro interrompeu em 2021 esse fluxo sob a justificativa de ajustar as contas públicas.

Com a normalização dos desembolsos e até a antecipação neste ano pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com o objetivo de impulsionar a economia, a originação ficou mais difícil, diz Alexandre Bastos, responsável pela carteira de precatórios da G5 Partners. Como resultado, parte do excesso que havia diminuiu, e hoje os créditos são adquiridos com um retorno estimado entre 19% e 22%, ante 30% de alguns anos atrás.

A percepção de quem tem alguma ação judicial, afirma, é que vai receber em dia ou até antes do esperado. “Imagina um senhor aposentado que tem precatório, está endividado no consignado e acredita que vai receber ali em janeiro porque o governo pagou o último adiantado. Ele não vende”, afirma Bastos.

“Com o CDI a 3%, 4% ou 5% e o retorno dos ativos da ordem de 30%, tinha espaço para muito desaforo”, diz. “Hoje, as margens estão cada vez menores, tem muita gente ofertando, e de outro lado, as taxas [de juros] estão subindo, com o prêmio cada vez mais espremido.

Ele cita que a oferta de alguns precatórios federais flerta com taxas entre 19% e 22% porque o mercado ficou congestionado, com agentes interpostos onerando a cadeia. “O custo hoje é como se você comprasse dezenas de imóveis por mês com todos os riscos. Tem que ter um tíquete mínimo para justificar a diligência”, afirma.

A Oriz Asset, no seu novo braço dedicado a ativos judiciais, tem dado preferência a precatórios federais de curto prazo, para evitar a transição política, diz Khalil Kaddissi, sócio responsável pela vertical. “O retorno é mais previsível e diminuo o risco de troca de governo. Se o risco do próximo presidente se provar menor, a gente faz outro fundo e retorna o dinheiro para o cliente.”

Roberto Dib, executivo que cuida de estratégias alternativas da Tag Investimentos, acha difícil ter uma retenção de pagamentos aos moldes da PEC dos precatórios, mas lembra que as contas do governo estão sempre apertadas. “Se amanhã os [atrasos nos pagamentos dos] precatórios parecerem parte da solução, pode acontecer, com impacto para o fluxo.”

São os precatórios estaduais e municipais que oferecem ainda um retorno satisfatório, por serem mercados menos explorados, mas é mais complicado fazer uma originação de qualidade, diz Bastos, da G5. “Muita gente compra para entrar em acordo com o estado ou município e, aos poucos, o federal vai deixando de ser o queridinho.”

Os precatórios de natureza alimentar do governo federal, relativos a salários, auxílio e pensões são ainda seguros porque o “governo não mexe muito com o servidor público”, a exemplo de policiais e juízes federais, afirma Luiza Oswald, chefe de produtos estruturados da JGP.

Para driblar preços mais salgados, ela diz que tem dado preferência aos pré-precatórios, em que a ação judicial não chegou ao ponto de ter a ordem de pagamento expedida. Consegue assim comprar o crédito com deságio maior.

Há toda uma inteligência por trás no processo de análise de precatórios quando se vai para os estaduais e municipais, diz Oswald, da JGP. É preciso conhecer a lei orçamentária de cada município ou estado, se teve crescimento do PIB e de receitas, se a tese jurídica do precatório foi bem construída, e, por fim, o resultado das contas públicas.

Na avaliação das obrigações estaduais, ela diz ser necessário estudar ainda as particularidades de cada governo e dos respectivos tribunais. No Rio Grande do Sul, por exemplo, a fila de pagamentos está parada em 1999, enquanto Amazônia, Pará e Acre estão pagando em dia, e Alagoas nunca atrasou. “É preciso fazer toda uma pesquisa, não só jurídica e financeira; é olhar o fiscal e a economia mesmo.”

Se amanhã os precatórios parecerem parte da solução [fiscal], governo pode atrasar pagamentos”
Roberto Dib

As prefeituras, que acabaram de passar por renovação nas eleições recentes merecem o mesmo cuidado. “O Rio de Janeiro é mais pobre do que São Paulo, no entanto, está pagando todo ano certinho. São Paulo está em 2009 ainda”, afirma a gestora da JGP. Uma insegurança à vista, alerta, é a PEC 66, que permite que os municípios renegociem suas dívidas previdenciárias. O texto prevê limites das receitas correntes que podem ser usadas para os pagamentos de precatórios.

O boom dos precatórios como investimento veio entre 2021 e 2022, em meio à política de juros ultrabaixos na transição pós-pandemia, com várias casas lançando fundos dedicados de diferentes perfis, lembra Bastos, da G5.

Ele cita que a casa tem uma estrutura exclusiva que trabalha para a gestora, com um call center e parcerias com advogados para levar o melhor preço para o cedente e ao mesmo tempo trazer retorno condizente para o investidor, evitando intermediários. “Se bem trabalhado, os riscos são bem indentificáveis, fica justo o risco em relação ao retorno.”

No caso dos municipais, o cuidado é avaliar a proporção da dívida em relação ao estoque, a receita corrente líquida para estimar o fluxo no pior cenário, aquele de estresse, diz Bastos. Neste caso, a G5 trava em créditos com pagamentos previstos em 2028 e 2029.

Primeiramente destinados ao investidor profissional, com patrimônio financeiro a partir de R$ 10 milhões, os precatórios começaram a chegar a bolsos menores via securitização, tokenização e plataformas de financiamento coletivo. Com a modernização do setor de fundos, trazida pela resolução 175 da CVM, a expectativa é que esses portfólios ganhem mais popularidade.

A Tag Investimentos tem o plano de atingir um patrimônio de R$ 500 milhões no seu quinto fundo dedicado ao tema no ano que vem, ao buscar a distribuição de plataformas externas, diz Dib. O objetivo é descer a régua para o qualificado, com aplicações e partir de R$ 1 milhão.

A 175 promoveu mudança relevante ao retirar dos fundos de recebíveis que compram precatórios federais o carimbo de “não padronizado” (NP), diz Dib. Isso abriu as portas para algumas assets que tinham restrição para atuar.

Para a pessoa física que tem sido sensibilizada por esse tipo de oferta, ele diz que um dos riscos é o investidor não saber o que está comprando. “Às vezes, o precatório é vendido como se fosse uma renda fixa, um CDB de banco, e não é. A rentabilidade depende da qualidade do precatório, das análises feitas e de proteções no momento da cessão”, alerta Dib. “Se não tiver uma boa gestão, da compra até o recebimento e o prazo se estender muito, vai acabar comprometendo o retorno.”

No fim de 2023, a Tag levantou R$ 120 milhões para seu último veículo e abriu recentemente uma nova rodada de mesmo valor. A gestora adquiriu uma participação minoritária na fintech mineira Precato, em abril de 2023, para acelerar a sua esteira de originação.

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