A disputa pelo protagonismo político no Amapá virou um problema para o Palácio do Planalto gerir. O senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), e o líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), realizam embates nos bastidores e, segundo interlocutores que estão acompanhando as movimentações, “estão em guerra”.
A situação ficou explícita recentemente, diz Caetano Tonet e Julia Lindner, do jornal Valor, quando Randolfe foi excluído de uma agenda com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o governador do Estado, Clécio Luís (Solidariedade), em novembro. O encontro foi solicitado por Alcolumbre, na véspera.
Na reunião, usada para pressionar Lula a barrar o reajuste de 44% nas contas de luz no Amapá, o presidente da CCJ reclamou do líder do governo no Congresso ao presidente da República por supostamente agir de forma individual, sem alinhar as decisões com o grupo.
A ideia do encontro aconteceu após Randolfe conseguir uma liminar na Justiça impedindo o aumento da conta de luz. Para mostrar sua força, Alcolumbre articulou a vinda do governador do Estado para o encontro com Lula e os ministros Rui Costa (Casa Civil), Waldez Góez (Desenvolvimento Regional) e Alexandre Silveira (Minas e Energia) em busca de uma solução definitiva. Os dois últimos compareceram a pedido do próprio senador.
O chefe do Executivo comprometeu-se a editar uma medida provisória para resolver a questão. Já Randolfe fez chegar ao Palácio do Planalto a sua insatisfação, segundo aliados, por não ter sido nem sequer avisado do encontro.
Alguns dias após a reunião, o líder do governo divulgou o compromisso do presidente nas redes sociais e detalhou parte do que seria a medida provisória. De acordo com Randolfe, a MP vai criar um fundo de amortecimento dos reajustes da tarifa de energia elétrica para os amapaenses.
“A MP passará a valer assim que o presidente Lula assinar, e já vale também para o reajuste divulgado pela Agência Nacional de Energia Elétrica e Equatorial Energia, previsto para iniciar em dezembro”, disse Randolfe. “Além disso, continuamos acompanhando a ação popular que protocolamos na Justiça Federal do Amapá, para barrar o aumento de 44,41% da tarifa de energia no Estado”, acrescentou.
A divulgação por parte de Randolfe incomodou Alcolumbre, que ainda tratava do teor do texto com o governo e aguardava o melhor momento para divulgá-lo.
Além disso, Alcolumbre pleiteia mais atenção do governo em relação ao Estado. Ele articula uma ida de Lula ao Amapá para apresentar medidas definitivas para frear o aumento da tarifa de energia elétrica. Há sinalizações de que Lula poderia participar da entrega e retomada de obras, além do lançamento do novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
A expectativa é que Lula vá ao Amapá até janeiro. Integrantes do Planalto que atuam na articulação política já trabalham para viabilizar a viagem, uma vez que o presidente da CCJ tem sido crucial para o governo, especialmente agora, ao acelerar os trâmites para a sabatina do ministro da Justiça, Flávio Dino, após a sua indicação ao Supremo Tribunal Federal (STF).
O voto do líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), a favor da proposta de emenda à Constituição (PEC) que limita as decisões monocráticas de ministros do STF também foi encarado como um gesto direto do governo para agradar Alcolumbre.
A medida é parte da estratégia do parlamentar para reunir apoio entre os oposicionistas para a sua eleição à presidência do Senado em 2025. A posição também foi vista como um aceno que de Lula poderá apoiar o amapaense na disputa pela sucessão de Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
Randolfe, por outro lado, atuou como um dos principais críticos da matéria. O líder chegou a telefonar para ministros do STF garantindo que a matéria não avançaria.
A disputa pelo protagonismo político do Estado remete à próxima eleição. Os dois já se colocam em lados opostos para 2026. Alcolumbre quer lançar o ministro Waldez Góes (Desenvolvimento Regional) ao Senado. Ele ainda estuda quem apoiaria para a outra vaga, mas antecipa que não será Randolfe.
O pleito de 2026 também pode mexer no futuro político-partidário do líder do governo no Congresso. Desde que saiu do Rede em maio, ele não esconde que seu desejo é retornar ao PT, partido a que foi filiado de 1989 a 2005. O problema é que a legenda local é comandada por Antônio Nogueira, aliado de Alcolumbre.
Outra opção cogitada pelo líder é o MDB. Durante a CPI da Covid, Randolfe aproximou-se de Renan Calheiros (MDB-AL), que deseja tê-lo como correligionário. A questão é que o presidente do partido no Estado é o deputado federal Acácio Favacho, que, mesmo não sendo adversário de Randolfe, já manifestou o desejo de disputar uma das vagas no Senado nas próximas eleições.
Um outro episódio que estremeceu ainda mais a relação entre Alcolumbre e Randolfe foi a atuação crítica do atual líder do governo ao colega por causa do chamado orçamento secreto.
Randolfe negou o mal-estar. “Não existe nenhuma disputa entre mim e o Senador Davi, somos aliados no Amapá, junto com o Governador Clécio, ao qual apoiamos e a participação dele conduzindo o União Brasil é indispensável na obra da reconstrução nacional liderada pelo Presidente Lula, a maior prova disso é que votei nele para coordenar a bancada amapaense no Congresso Nacional”, disse Randolfe.
O líder do governo acrescentou que ele e Alcolumbre trabalharam em conjunto para aprovar a PEC 7 no Senado, que propõe a inclusão de servidores dos ex-territórios aos quadros da União. Segundo Randolfe, os dois também uniram forças para “fazer acontecer a 52ª Expofeira do Amapá”. Procurado, Alcolumbre não comentou o assunto.