Fora do ministério do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a mandatária do partido, Gleisi Hoffmann, nega em entrevista a Sérgio Roxo, do O Globo, que será “porteira fechada” a aliados do petista nas pastas. Segundo ela, novas nomeações de cargos no Planalto ainda serão negociadas. Na avaliação da dirigente partidária, legendas de centro e de centro-direita recém-chegados à aliança lulista terão de entregar votos no Congresso e se alinhar ao projeto petista: “É um governo que tem linha”.
Para ter mais votos no Congresso, Lula negociou ministérios com partidos que não o apoiaram e que têm parlamentares críticos ao PT. Dá para garantir que essas siglas de centro e centro-direita vão entregar os votos no Parlamento?
Eu espero que sim. Se está dentro do governo tem que entregar os votos. É um casamento. Espero que esses partidos cumpram exatamente com a missão deles para dar governabilidade.
Há um prazo para que seja avaliada a posição desses partidos no Congresso?
Vai depender das votações no Congresso. Sempre as coisas podem ser reavaliadas.
Como a senhora vê o fato de o partido (União Brasil) do Sergio Moro, um dos principais adversários do PT, estar na base?
Quem deve estar desconfortável é o Sergio Moro. Não tenho opinião sobre isso. O que importa é o apoio do partido. É um problema dele.
Os aliados acusam o PT de querer ter os principais cargos. Como a senhora responde?
O PT é grande, é o partido do presidente da República. É o partido que dá a maior sustentação. Natural que ocupe seus espaços. E nesse governo diminuíram os espaços do PT, até porque nós fizemos uma composição mais ampla do que em 2003 e 2006.
Os ministérios vão de porteira fechada para os aliados?
Não tem isso. Os cargos dos ministérios têm que ser discutidos com o conjunto de partidos da coligação. Não é porque o ministério está com tal partido que todos os cargos vão ser preenchidos por aquele partido.
Não tem porteira fechada?
Não tem.
Muitos ministros não têm relação com a área que vão comandar. Qual foi o critério?
Indicação de ministro é sempre um critério político. Temos que considerar as indicações que o partido traz. Agora, acho que essa preocupação pode ser diminuída porque tem condições desses ministros terem nas suas secretarias, nos cargos de segundo e terceiro escalão, pessoas técnicas, que entendam do assunto.
Essa relação não é fisiológica?
Acho ruim essa leitura. O partido é que elabora um programa. É no partido que a gente constrói as candidaturas, é o partido que faz a disputa eleitoral. Por que seria fisiológico? Daqui a pouco nós estamos criminalizando até indicação política para ministério. Já chega o que fizeram nas estatais, onde há uma criminalização da política clara, do movimento sindical.
O PT passou no seu governo por crises do mensalão e da Lava- Jato. Vocês discutiram lições do passado que vão ser aplicadas agora para esse tipo de situação não se repetir?
Acho que todo mundo tem consciência e deve exercer o cargo público da melhor maneira possível, com a maior retidão e, principalmente, prestando contas à população. Isso é o que o presidente quer fazer.
Foram escolhidos ministros desconectados da linha de pensamento do PT. Juscelino Filho, por exemplo, votou e a favor da privatização dos Correios e vai comandar a pasta de Comunicações, responsável pelos Correios.
Ele não privatizará os Correios porque não foi a proposta que ganhou na urna. É óbvio que se pegar os ministros do União Brasil, eles vão ter mais divergências conosco do que convergência. Por isso que é uma aliança.
Eles vão ter que se adaptar?
É claro. Eles estão entrando num governo que tem linha, tem projeto claro, que saiu das urnas com essa direção.
Esse tipo de divergência pesou para Simone Tebet não ficar com o Ministério do Desenvolvimento Social?
Sempre quisemos a Simone no ministério. Ela nunca chegou a expressar a questão do Desenvolvimento Social, pelo menos não para mim, não sei se expressou ao presidente. Agora, o Desenvolvimento Social é um ministério do DNA do PT. Está ligado com a nossa história. É muito difícil o PT abrir mão de um ministério como esse. É um ministério que é quase a causa da nossa existência.
Tebet tem uma visão econômica mais liberal, diferente da do PT e de Haddad, ministro da Fazenda. Como administrar isso?
Na economia, a posição é de governo, não é de ministério. Não tem posição da Fazenda e do Planejamento. Nós ganhamos uma eleição com uma proposta para o país, que prevê expansão de gastos em projetos sociais e também o desenvolvimento do país na geração de emprego e nos investimentos. Quem quer que esteja em qualquer ministério tem que ter essa diretriz.
Como vê a preocupação do mercado financeiro com a expansão de gastos?
Acho que é uma preocupação exacerbada. O mercado financeiro conhece o Lula. Ele já governou o país. Ele sabe que o Lula vai cuidar do povo, mas não vai ser uma pessoa irresponsável. Agora, a responsabilidade social será maior.
A responsabilidade social é maior do que a fiscal?
Veja a PEC da Transição. Se não quiséssemos fazer nenhum gasto, a gente cortava os benefícios. Fizemos uma opção de elevar gastos para segurar os benefícios, para segurar os projetos e programas porque sabemos que isso também vai influenciar na recuperação da economia, das finanças do governo. Então, é uma questão de tempo. Quem pode esperar um pouquinho mais? A pessoa que está passando fome ou o mercado? Isso, a gente tem sempre que ter em mente: o mercado não morre de fome.
Cinco partidos que apoiaram Lula na eleição não indicaram ministros, e têm manifestado descontentamento. Esses partidos estarão contemplados no segundo escalão?
Sim, nós estamos conversando. Eu fiquei triste de todos não estarem contemplados. E acho que o presidente também. Infelizmente, a gente tinha as limitações, inclusive a questão da governabilidade no Congresso. Mas têm muitas funções do governo que eles podem assumir. Compreendo essa posição deles. Infelizmente, mesmo com a representação da nossa coligação, que era de dez partidos, a gente não conseguiu aumentar significativamente as bancadas. Isso leva a gente a ter que fazer composição para ter governabilidade. Espero que compreendam e que continuem no projeto.
Por que Lula demorou tanto para montar o governo?
Não tem um prazo definido. Ele teria que estar no dia 1º com os ministros escolhidos. Nós temos uma coligação grande. Buscamos também contemplar uma governança no Congresso. E fazer composição de um ministério que tenha 14 partidos que estão na base, ter preocupação de também com recorte de gênero, raça e contemplar as regiões, não é uma uma questão simples.
Ficou chateada por não ter sido escolhida ministra? No dia que o Lula anunciou isso, parecia que a senhora estava abatida.
Eu ando abatida porque eu ando cansada com tanto trabalho. Mas eu recebi numa boa. Não tem problema, não. Acho que o PT é muito importante. Para o Lula, tem uma importância muito grande. Ele trata quase como filho o PT. Ele tinha muita preocupação de a gente não ter agora no PT uma sucessão conflituosa. Se fosse para ser ministra, eu teria que ter preparado a sucessão no partido.
O presidente vai continuar morando no hotel mesmo depois de tomar posse?
Ele vai ter que permanecer mais uns dias no hotel até fazerem as adaptações no Palácio da Alvorada, avaliarem se vai precisar reformar. Mexeram na estrutura, mexeram no mobiliário.
Há alguma preocupação com espionagem ou é só logística?
É de logística, de adaptação. Tem que fazer uma varredura também, mas isso é normal em todos os lugares.