O deputado federal Felipe Rigoni (PSB-ES) apresentou na última segunda-feira (16) a primeira versão do relatório do projeto de lei 4372/2020, que regulamenta o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), do qual é relator. O novo fundo foi aprovado em 25 de agosto e, apesar da vitória, continua ameaçado, caso a sua regulamentação não seja aprovada até o fim de 2020. Se isso não acontecer, o Fundeb fica sem recursos para 2021. A expectativa dos congressistas é a de que o projeto seja pautado ainda nesta semana na Câmara dos Deputados. Para a deputada federal Tabata Amaral (PDT-SP), a demora da votação se deu em virtude de vários fatores. “A questão da votação ser online acaba complicando no sentido de conseguir se reunir e criar consenso. O período eleitoral também teve um impacto gigantesco e o principal ponto nesse momento são as obstruções”, afirma. A base do governo tem barrado as votações devido a um impasse na disputa pelo comando da Comissão Mista do Congresso que discute o Orçamento da União. A oposição também vem atrapalhando os trabalhos pedindo a votação da medida provisória que prorroga o auxílio emergencial até dezembro.
O grande problema para Tabata, no entanto, é a chamada MP da Cabotagem, que é o projeto que prevê o transporte entre portos de um mesmo país. O objetivo da MP é simplificar o frete de navios internacionais para aumentar a frota que navega internamente no Brasil. A proposta é apresentada como prioritária pelo governo federal. A base do governo prometeu parar a obstrução das votações caso temas como esse, do interesse do Executivo, sejam votados. “Enquanto não votarmos essa MP, não podemos sequer votar urgência de projetos em que eu e o Rigoni somos autores ou relatores”, conta a deputada. “Estamos com um texto já apresentado, com um ou dois pontos em discussão para criar consenso, mas o próprio presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), falou na quarta-feira, 18, que ele depende do posicionamento do governo em relação da MP da Cabotagem para colocar o Fundeb em pauta. Ou se cria consenso e se vota ou o governo retira a MP, porque de outra forma, regimentalmente, não conseguimos votar a regulamentação do fundo”, explica Tabata.
Felipe Rigoni elencou a falta de organização para designar um relator como um dos motivos que atrasaram a construção e votação do texto, mas garantiu que a demora não deve impactar a votação. “Essa demora não vai prejudicar o funcionamento do Fundeb nem vai precisar de uma Medida Provisória”, afirmou. Isso porque, caso a regulamentação não seja aprovada em 2020, existe a proposta do governo federal de enviar uma MP. “Nós estamos fazendo o texto de tal forma que existe uma transição para operacionalização do Fundeb que não vai prejudicar o financiamento. Vai permitir que o governo faça a operacionalização em cerca de dois ou três meses e, ao mesmo tempo, faça compensação desse tempo para os estados e municípios. Isso vai permitir que a gente discuta o projeto com calma e não precise de uma MP”, argumentou o relator.
“Conversamos isso na quarta, 19, com o líder do governo e me pareceu que ele se convenceu de que uma MP não é a melhor solução, porque já colocamos uma provisão no relatório de que, caso seja aprovado com atraso, vai ter um momento de transição”, ressaltou Tabata sobre reunião com Ricardo Barros (PP-PR). “E tem uma questão, quando falamos de educação, que é de legitimidade. O que é construído depois de várias audiências públicas com os líderes e com a sociedade tem um peso. Uma medida provisória chega com outro peso”, pontua a deputada.
Os sete eixos apresentados pelo relatório:
A nova metodologia de distribuição geral dos recursos (VAAT) vai corrigir o desequilíbrio do modelo atual e atender os municípios mais pobres;
A proposta prevê que 50% dos recursos gerais (VAAT) deverão ser aplicados na educação infantil;
Criação de um repasse complementar vinculado ao desempenho das escolas (VAAR). As redes de ensino que conseguirem reduzir a desigualdade no aprendizado e melhorarem suas próprias notas levarão mais recursos;
Distribuição de parte dos recursos para entidades credenciadas que pode compensar o déficit no ensino técnico, modernizando o ensino médio e diminuindo o índice de desemprego entre jovens;
Padronização da prestação de contas no sistema do MEC;
Repasse de recursos por desempenho (VAAR) terá algumas condições, mas duas se destacam: a adoção de critérios técnicos para seleção de diretores, diminuindo as indicações políticas; e a aprovação de uma lei que vincule o repasse de parte do ICMS ao desempenho da educação, em modelo similar ao realizado no Ceará;
Definição de prazo para a publicação de novos estudos e estabelecemos um processo técnico, via MEC, garantindo a participação de especialistas em educação na decisão.
Segundo Rigoni, a grande demanda divergente do relatório é em relação às entidades sem fins lucrativos. “Existe um problema redistributivo que, se a gente faz o cômputo das matrículas das filantrópicas dentro do Fundeb, você faz uma redistribuição de municípios pobres para municípios ricos. Isso porque nos municípios ricos é onde está a maioria das matrículas das entidades filantrópicas. Ainda não encontramos uma solução para essa divergência”, completa o relator. “Tem um ponto que é em relação às escolas conveniadas. O relator optou por só deixar essa abertura naquelas instâncias em que o Estado, o poder público, não consegue prover as vagas. A gente tá falando de dois extremos: primeira infância, creches, e ensino técnico, porque hoje não tem essa estrutura montada e o investimento inicial é muito caro”, exemplifica Tabata. “Há uma demanda forte por parte do governo, de alguns líderes, para que isso também se estenda ao ensino fundamental e médio. Se você traz as conveniadas para essa distribuição, você infla o número de matrículas dos municípios mais ricos e, com isso, muitos municípios ficam de fora da distribuição. O Fundeb foi criado para aumentar a distribuição e diminuir as desigualdades, e não o contrário”, completa a deputada, que informa que as questões já estão sendo discutidas.
Próximos passos
Tabata Amaral afirma acreditar que a proposta passará integralmente na Câmara e no Senado, pois a votação acontecerá apenas quando o texto for de consenso entre as Casas Legislativas. “Precisa ser aprovado esse ano. É um compromisso tanto do líder do governo como do Rodrigo Maia de que, com essa obstrução e essa trava da MP da Cabotagem saindo da frente, o Fundeb é prioridade máxima. Eu imagino que o texto vai ser aprovado integralmente, porque, nesse meio tempo, conversamos com muitas pessoas. A ideia é levar para o plenário um texto que já seja consenso entre todos”, diz. Após a aprovação, alguns pontos devem ser revistos em 2021. “Vai existir uma próxima etapa no ano que vem, especialmente no que se trata da revisão dos ponderadores das matrículas das várias modalidades educacionais que a gente tem e dos três novos ponderadores introduzidos pela PEC: o de potencial de arrecadação, o de disponibilidade de recursos e o de nível socioeconômico dos alunos”, finaliza o relator Felipe Rigoni.