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terça-feira 4 de janeiro de 2022 às 09:58h

Deputado admite fadiga do PT, mas defende legado

NOTÍCIAS, POLÍTICA


O deputado estadual Bira Coroa Lula (PT) reconhece existir uma “fadiga” do partido à frente do governo da Bahia, mas não considera essa “saturação” determinante para mudança. “A reflexão está aí na aceitação de Lula”, afirma. Autor de projetos que instituem o Dia Estadual do Reggae, feriado no Dia da Consciência Negra e Milton Santos como nome da nova rodoviária de Salvador, Coroa se diz defensor dos menos favorecidos. “Meu mandato foi intitulado como ‘mandato dos Ps’ – pretos, pobres, pederastas, putas”. Confira nesta entrevista também transmitida pela TV Alba (canal aberto 12.2 e 16 na Net).

Quais as principais conquistas ao longo de sua atuação parlamentar, já em seu quarto mandato?

 

A trajetória de chegar aqui já é uma grande conquista. O Poder Legislativo foi constituído para uma pequena elite. Essa Casa foi projetada para um domínio. E posso dizer que a atuação nossa no mandato tem realizações. Uma delas é a aprovação do Estatuto da Igualdade Racial do Estado da Bahia. Fui relator e um dos protagonistas. Quando cheguei aqui, em 2007, estava arquivado um projeto de estatuto feito pelo então deputado Valmir Assunção. Nós desarquivamos, abrimos um debate amplo com a sociedade civil organizada, reestruturamos, no mesmo momento em que estava sendo discutido o Estatuto Nacional. E chegamos à conclusão de que, para ser implantada a nova lei, era preciso ter um fundo de reserva. Até porque, defendíamos aspectos importantes como o reconhecimento dos saberes e fazeres, contrário ao movimento academicista. Para ministrar, por exemplo, aula de capoeira, tinha que ser um profissional de educação física. Para ministrar um curso de artesanato, tinha que ser um artista plástico. Isso vai de encontro ao que nos trouxe até aqui, que foi a oralidade. O candomblé e a capoeira nos provou isso. Os maiores mestres de capoeira, na sua quase totalidade, eram analfabetos ou semianalfabetos. Muitos pais e mães de santo sequer sabiam ler e escrever e conseguiram cultuar e trazer na originalidade da religião princípios de formação social e de ordenação familiar. Além do mais, [queríamos] o direito ao empreendedorismo afro a partir de recursos com linhas de financiamento.

Tudo isso a partir do estatuto.

 

Esse estatuto assegura isso. Temos conquistas também na representação dos interesses dos povos e comunidades tradicionais. Costumo dizer que meu mandato foi intitulado como “mandato dos Ps” – pretos, pobres, pederastas, putas. E pra mim, uma satisfação muito grande, porque é pra esses segmentos que as políticas têm que ser focadas. E aí quero destacar o acerto da política implementada no governo Lula e Dilma, porque foi um foco para os setores menos favorecidos da sociedade brasileira e, consequentemente, baiana.

O senhor é natural de Salvador mas atuou como vereador de Camaçari por dois mandatos, inclusive como presidente da Câmara Municipal. Quais demandas desses municípios procura atender?

 

Nasci no subúrbio ferroviário de Periperi e fui morar em Camaçari muito jovem. A relação com Salvador, principalmente o subúrbio, e a região metropolitana sempre foi intensa. O mandato tem atuado muito nessa região. Em Camaçari, por exemplo, apesar de ser o maior complexo químico e petroquímico da América Latina, convivíamos com bairros que sequer tinham energia e água tratada. Através do mandato nosso, conseguimos que essas comunidades passassem a ter acesso à energia elétrica, à água, a equipamentos para melhorar a produtividade no campo, que é outro grande desafio. Temos potencializado várias comunidades rurais na sua produtividade. Estamos agora com uma Casa do mel que atende a 120 famílias. Na educação, temos as escolas estaduais de Monte Gordo, de Arembepe, de Barra de Pojuca e de Vila de Abrantes, que está iniciando as obras agora. Intervenção nossa. E agora, intervindo para a transformação do ensino técnico profissionalizante nessas escolas.

Qual tem sido seu esforço para que a educação pública da Bahia seja um exemplo de primeiro mundo?

 

Estamos discutindo esse contexto. Antes dessa entrevista, estava num ato em que a Casa homenageava o reitor [José] Bites, da UNEB. E debatíamos exatamente isso: um plano de gestão e educação. O governo Rui Costa está, acertadamente, reconstruindo a estrutura física e material das escolas, mas precisamos mais do que isso. Precisamos de um plano de gestão e educação, porque a educação não é um resultado imediatista. É de médio pra longo prazo.

Já não era tempo de ter esse plano em prática?

 

Não tenho dúvida. Só que encontramos um processo da educação no estado bastante sucateada. Como disse, não é coisa que se consegue da noite pro dia. Já houve melhora. Se olharmos bem, antes da pandemia a Bahia vinha num processo de recuperação acentuada no conceito da educação. Com a pandemia e o distanciamento social, fechamento das escolas e piora da condição socioeconômica dos educadores, tivemos um baque significativo. Mas concordo que tínhamos que antecipar esse plano. É por isso que no plano de governo para a próxima gestão, que, acreditamos, a gente possa estar reconduzindo Jaques Wagner como governador, já estamos discutindo um plano de gestão pra fazer avançar a qualidade da educação.

O senhor é autor de um projeto de lei que institui o Dia Nacional da Consciência Negra, 20 de novembro, como feriado estadual. Caso aprovado, não poderia esvaziar o debate sobre a consciência negra?

 

Pra nossa avaliação, é um amadurecimento. Eu venho do movimento negro desde o final da década de 70. Defendíamos que [o 20 de novembro] fosse um dia de consciência, não aceitávamos ser um feriado. O objetivo era criar visibilidade e o debate político na mudança de concepções e racismo. Avançamos. Chegamos a uma semana da consciência, celebramos agora um mês e conquistamos depois a década afrodescendente. É um avanço significativo a partir desse debate, onde o 20 de novembro, celebrando a morte de Zumbi, tinha o objetivo de introduzir nos anais da história a nossa presença negra, que até então não era citada. A proposta do feriado não esvazia mais esse debate, porque estamos num processo crescente.

O senhor tem também o projeto de lei que institui o 11 de maio como Dia Estadual do Reggae. Qual a justificativa?

 

É fruto de um debate com a sociedade. O reggae é uma filosofia de vida, movimento sociocultural e político que nasce na Jamaica com o objetivo de protestar contra o domínio do capital internacional. E tem também relação muito forte com o princípio religioso. Na Bahia, inclusive, criou vertentes como o samba reggae. Vertente nossa. É um movimento forte no estado. A criação do Dia do Reggae é esse reconhecimento. O projeto já passou pela Comissão de Constituição e Justiça e está agora na Comissão de Educação. Acredito que deve avançar.

Outro projeto de sua autoria é o que batiza a nova rodoviária de Salvador, no bairro de Águas Claras, com o nome do professor e geógrafo Milton Santos. Por que a escolha deste nome?

 

Primeiro, é a identidade. A gente não percebe, mas a sociedade nos excluiu de perpetuar a nossa presença. Sou um dos defensores de que a homenagem deve se fazer em vida. No pós-vida tem que ser marco. E não temos isso com os nossos líderes negros. O professor Milton Santos, uma das maiores expressões da educação baiana, um dos maiores geógrafos do País, conceituado no mundo inteiro, foi responsável pela real distribuição da Bahia em territórios de identidade, respeitando a produção socioeconômica e cultural e os aspectos físico-geográficos pela sua discriminação. E nada mais justo do que você pegar o que congrega isso de fato. A rodoviária recebe todas as regiões do nosso estado. É um ponto de convergência dessa distribuição de identidade sociocultural e econômica da Bahia. Poderia ser um viaduto, uma avenida, qualquer outro patrimônio público, mas a rodoviária, na minha avaliação e dos que nos seguem, é a mais lógica pra pontuar a identidade e o reconhecimento com o nome do professor Milton Santos.

Sobre sucessão estadual, o PT caminha para 16 anos à frente do governo e há colegas seus que dizem que existe um cansaço natural nesse processo. O senhor concorda com essa percepção?

 

A gente não pode negar que, por hábitos culturais, há uma fadiga, uma saturação. Mas o que coloco, claramente, é que o que está sendo apresentado como novo representa o retrógrado. Nós tínhamos a Bahia dividida e conduzida por dois cabos eleitorais: transporte de doentes para Salvador e o carro pipa. Com uma nova dinâmica de gestão política, de acessibilidade e de direitos, a gente quebra esse elo e tira esses dois cabos eleitorais do cenário. Tínhamos 70% de toda a saúde concentrada em Salvador e cerca de 30% em Feira de Santana. Hoje são 16 novos hospitais regionais já em funcionamento e 23 policlínicas como centrais para multiatendimento, principalmente com exames que não eram oferecidos. Hoje não tem um município que não tenha um equipamento a partir da iniciativa do estado, seja uma ambulância, um ultrassom ou outro para um pronto atendimento no PSF [Programa Saúde da Família]. Esse é um processo de modernização.

Mas o que justificaria o sentimento de fadiga?

 

Temos um processo em curso natural de debate e discussão. Na prática, vou lhe responder com as pesquisas: nunca estivemos tão bem quanto agora. Vamos lembrar a história? Wagner quando se candidatou e ganhou o primeiro mandato, três meses antes não chegávamos a dez por cento e ganhamos no primeiro turno. Quando foi pra reeleição, seis meses antes as pesquisas apresentavam Wagner muito atrás, e se reelegeu no primeiro turno. Rui [Costa] quando foi apresentado como candidato à sucessão, despontou com menos de um por cento e foi eleito também no primeiro turno.

O senhor está querendo dizer então que, na verdade, não existe fadiga?

 

Existe, não vou dizer que não existe, mas não é determinante nesse exato momento para mudança. A sociedade hoje, no senso crítico, quer saber o que você vai e pode apresentar pra melhoria da sua condição de vida. Ela não é mais daquela política de curral eleitoral, onde as pessoas fechavam os olhos, baixavam a cabeça e seguiam a orientação do mestre, entre aspas. A reflexão disso está aí na aceitação de Lula. É um processo que pra gente é muito tranquilo. É um debate natural e nós vamos a esse debate. Não tenho dúvidas de que a gente ganha no plano federal com Lula e no estadual com Wagner. E acho que a tendência, mais uma vez, da chapa onde está a defesa de Wagner é fazer o maior número de deputados nessa Casa. A prova disso é que tem uma movimentação muito forte de deputados e deputadas querendo estar no PT pra fazer essa próxima disputa eleitoral.

 

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