Segundo reportagem do jornal O Globo, a participação política igualitária entre deputadas e deputados nas Assembleias Legislativas do país está longe de ser uma realidade. Mesmo nas Casas com previsões regimentais para garantir a representatividade feminina nas Mesas Diretores, a equidade de gênero não ocorre. Nos estados do Amazonas, Ceará e Paraná, os três que tratam do tema em seus regulamentos internos, os representantes masculinos são maioria.
Segundo o IBGE, a população brasileira é em sua maioria feminina: 51,1%, enquanto 48,9% são homens.
No Paraná, são duas deputadas nos oito cargos da Mesa Diretora, apesar de o regimento estipular que a composição deve observar a “representatividade feminina”, sem especificar como ela se aplica. No Amazonas, as regras preveem a “representatividade proporcional de gênero, assegurada a participação em cargo da Mesa Diretora de, no mínimo, um parlamentar de cada sexo”. Dos oito cargos, só dois são ocupados por mulheres.
No Ceará, o regimento interno é vago: afirma que, “tanto quanto possível”, deve-se assegurar “a proporcionalidade dentre os parlamentares do sexo masculino e feminino, assegurando, preferencialmente, uma vaga para o sexo feminino”. A redação não fala em equidade, o que valida a composição atual, com apenas três mulheres entre os 10 postos principais da Casa.
A advogada Lízia Coelho Medina, especialista em Direito Público e mestre em Ciências Sociais, explica que os regimentos são insuficientes, por não tratarem especificamente da divisão igualitária:
— As normas que estabelecem percentuais para os partidos ou coligação não são suficientes para assegurar a paridade na política. A sub-representação se reflete na composição das Mesas.
Para Mayra Goulart, professora de Ciência Política da UFRJ, a falta de mulheres em cargos de destaque dentro das Assembleias cria uma invisibilidade:
— As figuras de liderança têm prerrogativas com influência determinante no processo decisório. E uma vez que as mulheres não estão nestes cargos, não têm uma ascendência. Não adianta só ter mulheres no Legislativo, é preciso que elas ocupem papéis de poder nas Casas — diz.
A falta de equidade é mais grave em estados como Minas Gerais, Bahia, Goiás e Rondônia, onde nenhuma mulher foi indicada para os postos. Em São Paulo, também não havia mulheres na Mesa Diretora da última legislatura — a atual começa em 15 de março, quando será votada a nova composição. No âmbito federal, o cenário de desigualdade se repete. No Senado, não há mulheres na Mesa Diretora. Na Câmara, dos 11 cargos, apenas a 2ª secretaria é ocupada por uma deputada: Maria do Rosário (PT- RS).
Mulheres nas presidências
Das 27 Assembleias do país, apenas duas — Amapá e Maranhão — são presididas por mulheres nesta legislatura que se iniciou em 2023. No Congresso Nacional também há baixa representatividade feminina em cargos de liderança, que garantem a participação na definição da pauta de votação e espaço para falar no plenário. No Senado, dos 15 postos de liderança partidária, apenas um é ocupado por uma mulher: a senadora Tereza Cristina (MS) está à frente da bancada do PP. Na Câmara, o cenário se repete. A única sigla que escolheu uma mulher como sua representante foi o Novo, com a deputada Adriana Ventura (SP), mas como não atingiu a cláusulas de barreira, o partido não tem direito a estrutura de liderança.
Para Michelle Fernandez, professora e pesquisadora do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB), há um prejuízo na discussão de políticas públicas voltadas para as mulheres por conta da falta de representatividade feminina no Legislativo.
—Vários estudos nos mostram que temas que impactam nas vidas das mulheres não são amplamente debatidos pelos homens nas Casas Legislativas. E, quando são discutidos, muitas vezes deixam de fora questões fundamentais para as mulheres — alerta.