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quarta-feira 15 de janeiro de 2025 às 08:24h

Déficit nominal do Brasil dispara e se distancia do de países emergentes, mostra FMI; confira

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O Brasil terá um dos maiores déficits nominais do mundo em 2024 e 2025, em um nível bem acima de outras economias emergentes. O déficit nominal considera o resultado primário (receitas menos despesas) mais os gastos com juros. Ele é importante porque é o que determina a trajetória da dívida pública, que está no foco dos investidores e por trás da forte piora nos preços dos ativos locais.

Segundo dados do Fundo Monetário Internacional (FMI) compilados pelo BTG Pactual e publicados por Anaïs Fernandes, do jornal Valor, além de informações do Banco Central e projeções do próprio banco, o Brasil deve fechar 2024 e 2025 com o segundo pior déficit nominal entre 23 países emergentes de renda média e economias desenvolvidas.

Os déficits nominais esperados pelo BTG para o Brasil são de 7,8% do PIB em 2024 e de 8,6% em 2025, atrás apenas da Bolívia, com déficits de 10,4% e 9,7%, respectivamente. Vale notar, porém, que a tendência da Bolívia é de desaceleração do déficit entre os anos.

“Focamos muito, nas análises, o resultado primário porque são os botões que estão na mesa de controle de quem está operando a política fiscal. As metas são desenhadas a partir dele. Mas, no fim das contas, é o déficit nominal que vai importar para a projeção de dinâmica da dívida”, diz Fábio Serrano, economista do BTG Pactual. “No Brasil, especificamente, em que o pagamento de juros é bastante elevado, faz todo o sentido olhar também para o déficit nominal.”

Em comparação com pares latino-americanos, o país será o único a passar por um aumento no déficit nominal entre 2024 e 2025, aponta o BTG. Países como México, Chile, Colômbia e Peru deverão registrar déficits abaixo de 4% do PIB neste ano. A Argentina, que tem promovido um ajuste duro, deve ter déficits ao redor de zero.

“Aos olhos dos estrangeiros, Brasil não está mais ganhando de W.O.”

— Fábio Serrano

“Pensando no investidor estrangeiro, a história que se ouvia dois anos atrás era que o Brasil, no comparativo com seus pares, ganhava mais pelos problemas dos outros do que por suas virtudes próprias, já que há países em conflito armado ou com desorganização macro muito maior. Agora, começamos a ver alguns pares do Brasil com histórias interessantes, como a Argentina, que tem feito um ajuste fiscal agressivo. Aos olhos dos estrangeiros, o Brasil não está mais ganhando de W.O. [por “walkover”, ou seja, quando o adversário nem pode competir]”, diz Serrano.

O déficit nominal esperado para o Brasil também deve ficar acima da média de economias emergentes (-5,7% do PIB em 2024 e -5,6% em 2025) e de economias desenvolvidas (-5% e -4,5% do PIB, respectivamente), aponta o BTG. “Não importa muito o subgrupo que pegamos para comparar, a conclusão é a mesma: temos um dos déficits nominais mais altos do mundo. A média da América Latina está em 4,2% do PIB”, afirma Serrano.

O déficit nominal do setor público brasileiro até pode desacelerar em 2024 dos 8,8% do PIB de 2023, porque o déficit primário do governo central deve ser menor, de 0,4% do PIB, ante 2,4% em 2023, quando houve antecipação de pagamentos de precatórios. Os gastos com juros, porém, devem passar de 6,6% do PIB em 2023 para 7,5% em 2024 e avançar a 8% do PIB em 2025, de acordo com o BTG.

“Tem uma história que vem da política monetária. Temos uma Selic que, pela nossa projeção, sobe até 15,25% e se mantém nesse patamar ao longo do ano inteiro. Isso acaba refletindo na conta de juros”, afirma Serrano. Além disso, o resultado primário do governo central também deve voltar a piorar neste ano, para um déficit de 0,8% do PIB, segundo o BTG. “No ano passado, teve uma espécie de vale no pagamento de precatórios, cujo ritmo deve se normalizar em 2025. Há também uma série de receitas extraordinárias previstas, mas, como estamos começando o ano, prefiro ter uma projeção mais conservadora e ir vendo como isso se mterializa”, afirma Serrano.

Economistas ponderam que não é possível “culpar” os juros elevados pelo déficit nominal alto e crescente no Brasil. “O Brasil é um dos emergentes com o maior estoque de dívida. Logo, a despesa de juros sobre essa dívida também é maior. Então, não é só uma questão de que o nível de juros hoje, a Selic, é maior. E uma coisa retroalimenta a outra. Se você tem dívida alta, é natural que seja um dos motivos para pagar juro mais alto. Isso vale para qualquer ente, pode ser pessoa física, jurídica ou setor público. Se tem dívida maior, tem mais risco”, diz Pedro Schneider, economista do Itaú.

Ele projeta déficits nominais de 7,9% do PIB em 2024, 9% em 2025 e 9,5% em 2026, com déficits primários de 0,4% em 2024 e de 0,7% neste e no próximo ano. Os gastos com juros devem ser de 7,2%, 8,3% e 8,8% do PIB, pela ordem.

A XP estima que o país fechou 2024 com um déficit nominal de 8,6% do PIB (0,4% do PIB de déficit primário e 8,2% de pagamento de juros). Para 2025, a expectativa é que o déficit nominal possa se aproximar de 10% do PIB.

“Até meados de 2024, tivemos um ciclo de afrouxamento monetário, o que, em tese, deveria reduzir o custo da dívida. Só que essa redução aconteceu em um prazo muito curto e não foi acompanhada da mesma forma pelo mercado, que continuou precificando uma taxa de juros alta”, diz Tiago Sbardelotto, economista da XP. “A visão do mercado de que a dívida vai continuar subindo faz com que o prêmio de risco aumente, especialmente para prazos mais longos, e o mercado começa a cobrar mais caro para financiar a dívida. Por outro lado, quando há um custo mais alto da dívida, faz com que ela cresça a taxas maiores. Gera um ciclo vicioso”, afirma.

O que é “particularmente preocupante”, segundo ele, é que os juros nominais “ainda refletem muito pouco o atual estágio de aperto monetário e de deterioração das expectativas”, afirma. “A perspectiva é que esses juros nominais continuem subindo em 2025. É um custo muito elevado”, afirma.

A Instituição Fiscal Independente (IFI), ligada ao Senado, espera que o déficit nominal passe de 8% do PIB em 2024 para 9,6% em 2025. A estimativa resulta tanto de um primário pior (de -0,4% para -0,7% do PIB) quanto de mais gastos com juros (de 7,7% para 8,9% do PIB).

Mesmo no cenário otimista da IFI, em que o déficit primário desaceleraria de 0,4% do PIB em 2024 para 0,1% em 2025, o déficit nominal seguiria aumentando, de 8,1% para 8,8% do PIB, porque as despesas com juros continuariam avançando, de 7,8% para 8,7% do PIB.

“A lógica do resultado primário é que você tem uma dívida que precisa ser atenuada como proporção do estoque do que o país produz. Para isso, precisa fazer poupança operacional e ter superávit. Senão, o país paga juros com mais dívida”, afirma Marcus Pestana, diretor-executivo da IFI.

Nesse sentido, ele se diz “estupefato” com o nível da discussão fiscal no Brasil. “Dizem que cumpriram a meta [de primário para 2024], porque o déficit foi de 0,4% do PIB, mas, com os descontos legais, vai para -0,1%. Tudo isso é irrelevante, porque estimamos que precisamos de um superávit primário de 2,4% do PIB”, afirma.

Na semana passada, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, antecipou que o governo deve fechar 2024 com um déficit de 0,1% do PIB, sem contar créditos extraordinários, por exemplo, com o socorro ao Rio Grande do Sul. A meta de primário do governo para o ano era zero, mas com tolerância para um déficit de até 0,25% do PIB. “Esse ‘desconto legal’ para a meta não interessa para a dívida. Para ela, gasto é gasto”, afirma Pestana.

Mesmo assumindo que o governo consiga cumprir o arcabouço fiscal e as metas de resultado primário, o país continuará com um déficit nominal médio de 8,2% do PIB no governo atual (2023 a 2026), resultando em um crescimento de 14 pontos percentuais da dívida pública, em porcentagem do PIB, no período, estima o BTG. Segundo o banco, a dívida bruta/PIB deve sair de 73,8% do PIB em 2023 para 86,1% em 2026.

A IFI projeta a dívida bruta/PIB chegando a 86,3% em 2026, último ano do atual mandato presidencial de Lula. Em 2027, no início do próximo governo, essa dívida estaria em 91% do PIB e, até 2030, superaria 100%, sem perspectiva de estabilização em todo o horizonte projetado pela IFI, até 2034.

“No fim, o déficit nominal é uma aproximação de quanto a dívida sobe. Países com ‘rating’ [nota de crédito] parecido ao do Brasil estão com déficit nominal menor. Então, se olhar só pelo fiscal – e sabemos que as agências de risco não fazem isso -, é difícil imaginar que movimentos de ‘upgrade’ vão continuar”, diz Schneider, do Itaú.

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