A decisão do ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), de anular as provas obtidas a partir do acordo de leniência da Odebrecht, pode ter como consequência o arquivamento de ao menos três inquéritos em andamento na Corte. As investigações envolvem segundo Daniel Gullino, do jornal O Globo, os senadores Ciro Nogueira (PP-PI) e Renan Calheiros (MDB-AL), o deputado federal João Carlos Bacelar (PL-BA) e o ex-senador Romero Jucá (MDB-RR).
Esses inquéritos foram abertos a partir da homologação da delação de executivos da Odebrecht, em 2017. Em dois deles já houve denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR), mas o STF ainda não decidiu se aceita.
Um ponto central das três investigações é o sistema chamado Drousys, usado pela empreiteira para registrar os pagamentos de propina feitos a políticos. Toffoli, no entanto, decretou que todos as provas retiradas desse sistema devem ser desconsideradas, porque não houve a preservação da chamada cadeia de custódia. O termo, de acordo com o Código de Processo Penal, se refere à manutenção da história cronológica dos vestígios coletados relacionados a crimes, de seu reconhecimento até o descarte.
Em 2020, Ciro Nogueira foi denunciado pela PGR, sob a acusação de que teria recebido R$ 7,3 milhões em propina para beneficiar a Odebrecht. Entre as provas listadas, há diversos registros de pagamento no Drousys com codinomes que seriam referentes a Nogueira, como “Piqui” e “Cerrado”. Em um desses registros, há uma observação de que a entrega deveria ocorrer em um endereço de um assessor do senador.
As entregas de dinheiro foram comprovadas, segundo a PGR, por e-mails e conversas no Skype, além de depoimentos e documentos apresentados por outros delatadores. “O acervo probatório, para muito além da mera versão dos colaboradores, constitui um oceano de provas”, afirma a denúncia.
No ano passado, a defesa de Nogueira citou decisões do STF que já haviam consideradas inválidas as provas do Drousys e pediu que ela fosse aplicada neste caso. Essa solicitação ainda não foi analisada, mas deve ser reforçada com a decisão de Toffoli.
Em 2022, o deputado João Carlos Bacelar também foi denunciado com base na delação da Odebrecht. A PGR afirma que ele recebeu R$ 400 mil para favorecer a empresa.
Durante a eleição de 2010, há registros no Drousys de dois pagamentos para o codinome “Ferrovia”, somando R$ 200 mil, que foram efetuados em Salvador. Delatores afirmaram que Bacelar foi o beneficiário. Em retribuição, a partir do ano seguinte o deputado teria passado a atuar em benefício da empresa, como ao retirar um requerimento e ao evitar que uma medida provisória (MP) perdesse a validade.
Na eleição seguinte, em 2014, Bacelar recebeu R$ 200 mil da Braskem, subsidiária da Odebrecht, mas de forma oficial. A PGR considera, contudo, que era propina. Em 2015, o deputado teria auxiliado a empresa em uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI). Em agosto, a defesa de Bacelar pediu a rejeição da denúncia, citando também, entre outros elementos, a nulidade dos elementos do Drousys.
Um dos últimos inquéritos que seguem tramitando no STF tem o senador Renan Calheiros (MDB-AL) e o ex-senador Romero Jucá (MDB-RR) como alvos. O ponto de partida é justamente uma anotação no Drousys de um suposto pagamento de R$ 5 milhões, acompanhado da palavra “exportação”.
De acordo com delatores da Odebrecht, o pagamento seria devido a uma atuação dos senadores em favor de uma medida provisória (MP) que beneficiaria subsidiárias da Odebrecht que atuavam no exterior. Em junho, a PGR defendeu a continuação do inquérito. Quando a investigação foi aberta, os dois negaram a acusação.