O anúncio de que o juiz Sérgio Moro ocupará o cargo de ministro da Justiça e Segurança Pública no governo de Jair Bolsonaro (PSL) repercutiu no meio jurídico e dividiu opiniões. Juristas ouvidos pelo Blog acreditam que a decisão de Moro abre brecha para críticas mais duras ao seu trabalho, mas não invalida as decisões tomadas no passado, na Operação Lava Jato.
Para Bernardo Strobel Guimarães, mestre e doutor em Direito do Estado que não atua na Lava Jato, Moro fez uma “aposta ousada”, mas sua escolha de aceitar um cargo político não traz qualquer efeito sobre decisões anteriores.
“Do ponto de vista estritamente processual, não me parece que haja qualquer irregularidade. Não é o fato de ele aceitar um cargo político que traga qualquer efeito sobre as decisões que ele tomou anteriormente”, explica Bernardo, que leciona em Curitiba.
Para ele, a grande dúvida está sobre o andamento que será dado à Operação Lava Jato com a saída de Moro e a entrada de um novo juiz no caso.
“O juiz que assumir a Vara dele é o juiz natural da Lava Jato. Perceba então que é um cargo que já começa com o holofote bastante grande. Em alguma medida, isso significa que a Lava Jato pode ser completamente outra”, afirma.
De acordo com Francisco Monteiro Rocha Júnior , doutor em Direito e presidente do Instituto Brasileiro de Direito Penal Econômico, Moro também não deve ser considerado suspeito em nenhum dos processos da Lava Jato pois a jurisprudência sobre as hipóteses de suspeição é conservadora e se baseia estritamente na lei.
“Se nós tivéssemos uma jurisprudência um pouco mais razoável no que diz respeito a esse ponto, ou uma lei que abarcasse outros aspectos, eu diria que isso seria muito mais que suficiente para determinar, para deixar claro a suspeição dele”, diz Francisco Monteiro, que também não atuou como advogado na Lava Jato.
O jurista tem uma visão mais crítica à atuação de Moro na Lava Jato. “Quer queira, quer não, ele foi um ator político determinante nessas eleições, na condução como ele teve em relação ao Lula”, disse.
Francisco Monteiro lembrou o episódio em que o juiz se manifestou, durante suas férias, para impedir o habeas corpus de Lula, concedido pelo desembargador federal Rogério Favreto, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
“A intervenção de um juiz de 1º grau na decisão de um desembargador, que é hierarquicamente superior, ainda estando esse juiz de 1º grau em férias, é uma situação que levanta muitas suspeitas nesse proceder, é algo inusitado, eu nunca vi isso na vida, duvido que alguém poderia trazer uma outra situação em que isso tivesse acontecido”, afirma Francisco Monteiro.
Durante a condução dos processos da Lava Jato em Curitiba, o juiz Sérgio Moro tomou decisões polêmicas que voltam à tona após o anúncio de que o magistrado aceitou ser Ministro da Justiça no governo de Bolsonaro.
Em março de 2016, Moro divulgou um grampo telefônico em que os ex-presidentes Lula e Dilma conversavam sobre a nomeação de Lula para ser o novo ministro-chefe da Casa Civil. Na ocasião, a atitude de Moro gerou críticas sobre o levantamento do sigilo da conversa, e foi criticado por ex-ministro Teori Zavascki. Moro pediu desculpas.
Em julho deste ano, Moro impediu a concessão de habeas corpus ao ex-presidente Lula durante suas férias. Após a autorização dada pelo desembargador Rogério Favreto em um domingo para a liberação de Lula da prisão, Moro, que estava de férias, afirmou que o desembargador plantonista era autoridade incompetente para conceder habeas corpus.
No início de outubro deste ano, às vésperas do 1º turno das eleições, Moro divulgou parte do conteúdo da delação do ex-ministro Antônio Palocci e foi criticado. Em seu depoimento, Palocci envolveu diretamente o ex-presidente Lula nos casos de corrupção da Petrobras.
“Então, esses elementos, esse cenário todo, mais do que um único fato aqui ou outros acolá, o somatório disso evidentemente questiona sua imparcialidade, após aceitar um convite desse do outro candidato que foi beneficiado justamente por essas decisões”, diz Francisco Monteiro.