O desembargador Luciano Carrasco Falavinha, do Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR) fez relatório favorável ao senador Sergio Moro (União Brasil) e se manifestou nesta segunda-feira contra a cassação do mandato do parlamentar. Os argumentos foram apresentados no julgamento que o investiga por suposto abuso de poder econômico em ação movida pelo PT e PL por gastos irregulares na campanha eleitoral de 2022. Após a leitura do voto, o desembargador José Rodrigo Sade pediu vista ao processo, que retornará ao plenário nesta quarta-feira.
Segundo o relator do caso, não há precedência conforme Luísa Marzullo, do O Globo, para cassar o mandato ou deixar Moro inelegível. Entre os principais argumentos apresentados está o somatório feito pelas siglas oposicionistas dos gastos da pré-campanha à Presidência e ao Senado. De acordo com o magistrado, esta conta não seria suficiente para concluir que houve abuso de poder econômico:
– Não é possível simplesmente somar as despesas das pré-campanhas para concluir pelo abuso porque a aplicação da restrição dos direitos políticos, o julgador deve ser restritivo sob pena de violação aos direitos fundamentais –defendeu Falavinha.
Segundo o jurista, os denunciantes também não demonstraram os gastos dos demais concorrentes para verificar que, de fato, Moro teria tido uma maior verba. Outro ponto levantado pelo desembargador é a não comprovação de que o senador havia, desde o início, a intenção de concorrer ao Senado pelo Paraná.
– As iniciais não trouxeram esses dados empíricos (…) Sem o parâmetro mínimo da campanha presidencial, não há como se afirmar que o investigado tenha gasto demasiadamente. Sob pena de indiscutível injustiça. Acusa-se o candidato A de gasto excessivo, mas o acusador não diz quanto gastou, tendo aí a possibilidade de ter gasto mais – afirma.
Foco em São Paulo
Em mais de um momento do voto, Falavinha diz que não há prova alguma de que Moro havia o intuito de ser senador pelo Paraná desde o início e cita, inclusive, que sua pré-campanha à Presidência, inicialmente, estava focada em São Paulo.
– Nos meses iniciais da sua agenda eleitoral, sua agenda não estava voltada ao Paraná, mas ao estado de São Paulo.
O desembargador diz que há uma série de viagens que foram realizadas para fora do estado, o que não acarretaria em vantagem eleitoral, já que esteve com populares de outro domicílio.
Limites da pré-campanha
A ausência de legislação no período da pré-campanha é outro ponto levantado pelo relator para inocentar o senador. Segundo ele, a legislação não especifica qual seria o limite de gasto antes do início da campanha de fato:
– Por mais que o limite de gastos da campanha possa ser um eventual parâmetro, ainda não há ideia de qual percentual de gastos de campanha seria considerado razoável como limite de gastos da pré-campanha.
Uma comparação com os denunciantes também foi traçada. Segundo o relator, PT e PL agiram como se não tivessem tido gastos na pré-campanha.
Notoriedade
A notoriedade do senador também foi evocada por Falavinha que, em seu voto, afirmou que Moro não teria necessidade de cometer irregularidades na pré-campanha para se tornar conhecido.
– Até as pedras sabem que o investigado Sergio Moro não precisaria realizar pré-campanha para tornar o seu nome popular, tendo em vista a operação Lava-Jato. (…) cito os bonecos de Olinda que os representavam e as manifestações em defesa da Lava-Jato. Esses indicativos mostram a grande exposição do investigado.
Neste contexto, o desembargador defendeu que uma possível propaganda antecipada deveria ter sido destinada ao Senado Federal, o que, em sua avaliação, não foi averiguado.
Caixa dois
Na inicial, o PL afirmou que houve caixa dois na contratação do escritório do suplente de Moro, Luis Felipe Cunha, no valor de R$ 1 milhão. O magistrado afirmou que vê estranheza nos fatos narrados, mas que não há dados concretos que indiquem irregularidade.
– É certo que o escritório não tinha especificação em direito eleitoral, tendo mudado sua propaganda no dia seguinte. Também é certo que o valor cobrado foi alto, comparando-se a grandes parecistas como ex-ministros do STF, a alguém sem notoriedade alguma. Sucede que tais fatos que causam estranheza não são suficientes para considerar caixa dois.
Abuso de poder econômico?
Ao contrário do que PT e PL alegam, Luciano Carrasco Falavinha sustenta que não houve abuso de poder econômico:
– O abuso de poder econômico ocorre pelo uso exorbitante de recursos patrimoniais, de forma a comprometer a isonomia, o que não é o caso aqui. Configura também a negociação de apoio político com o oferecimento de vantagem, o que também não ocorreu.
Uso indevido dos meios de comunicação
Em relação a uma possível propaganda antecipada, Falavinha afirmou que não é competência da Corte analisar peças publicitárias que tenham sido veiculadas em outros estados. Em especial, em São Paulo.
O relator explicitou que não identificou uso indevido dos meios de comunicação, que seria configurado pela exposição de um pré-candidato em detrimento dos demais.
Citação a Lula
Logo no início de seu voto, o desembargador citou nominalmente o presidente Lula e afirmou que o julgamento não iria abordar os acertos e erros da Lava-Jato.
– Não se vai aqui julgar a Operação Lava Jato. Seus personagens, acertos e erros. Não se vai aqui se dizer de seus acertos, ou seja, dos bilhões de reais devolvidos aos cofres públicos pela prática confessada de corrupção nunca vista antes na história desse pais. Muito menos seus erros como a arbitrária quebra do sigilo telefônico do presidente Lula, familiares e até advogados e divulgação ilegal de áudios ou do levantamento do sigilo na última semana antes do primeiro turno da delação premiada de Antonio Palocci cuja narrativa buscava incriminar o ex-presidente na época – disse.
Caso Selma Arruda
Ao contrário do que os advogados do PT e PL sustentaram, o desembargador defendeu que o caso da senadora Selma Arruda nada tem a ver com o processo de Moro.
– Toda a campanha de Selma era dirigida ao Mato Grosso e não a Presidência da República (…) aqui não houve doações pessoais e todas as despesas foram contabilizadas. Aqui afasto qualquer precedente do caso Selma Arrud.
Conhecida como “Moro de Saias”, a ex-senadora foi acusada de caixa 2 e abuso de poder econômico na disputa eleitoral de 2018, o que ocasionou em sua cassação no ano seguinte.
No período de pré-campanha, ela teria recebido um empréstimo de seu suplente, o fazendeiro Gilberto Possamai, no valor de R$ 1,5 milhão — a soma não foi informada à Justiça Eleitoral. O apelido dado a Selma Arruda se deu por sua campanha pautada no combate à corrupção, principal bandeira da operação Lava-Jato.
Entenda o processo
O senador Sergio Moro é alvo de um processo de cassação movido por PT e PL. Além do relator, outros seis magistrados irão votar. Caso a Corte opte pela providência, a perda do mandato ainda precisaria ser referendada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Segundo as iniciais dos processos que foram anexados, o senador teria driblado a legislação eleitoral durante a campanha de 2022. Os partidos alegam que Moro teria gasto R$ 6,7 milhões para chegar ao Congresso, quando o limite permitido por lei é de R$ 4,4 milhões. A suposta vantagem teria sido obtida por meio de dois movimentos: a desistência de concorrer à Presidência e a mudança partidária do Podemos para o União Brasil.
Em dezembro passado, o Ministério Público Federal se manifestou por sua cassação, sustentando que houve abuso de poder econômico. Nos bastidores, a vaga do ex-juiz já é disputada em uma espécie de pré-campanha eleitoral.
Caso o mandato seja perdido, um novo pleito será disputado. Entre os possíveis postulantes, despontam a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro (PL) e a presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann.