Em entrevista ao jornal Tribuna da Bahia, o deputado federal Daniel Almeida (PCdoB) falou sobre a exclusão, por parte do governo da Bahia, do seu partido, o PCdoB, na disputa pela vaga de conselheiro no Tribunal de Contas dos Municípios (TCM). Ele compartilhou percepções sobre as implicações desse episódio na relação do PCdoB com o Estado e a postura da sigla diante dessa questão.
Daniel destacou que o partido comunista não considera normal o ocorrido.
Tribuna: Um dos principais entraves no diálogo do governo federal com o Congresso nos últimos meses era a questão das emendas. Isso está se pacificando em sua avaliação?
Daniel Almeida: O governo está em um momento de entendimento com o Congresso, entendimento bastante avançado com o presidente da Câmara, Arthur Lira, da liberação de parte das emendas, inclusive, algumas que foram vetadas pelo presidente Lula quando sancionou a Lei Orçamentária. Esse é um encaminhamento que está prevalecendo, e eu acho que tudo indica que haverá entendimento para liberação das emendas.
Tribuna: Como o senhor viu a decisão do governo de reverter a reoneração das empresas de 17 setores? O senhor acha que foi uma decisão acertada? Qual a sua avaliação?
Daniel Almeida: Esses setores são muito relevantes para a economia na geração de empregos e já vinham tendo esse benefício, ou pelo menos, eu não diria nem benefício, e, sim, um reconhecimento sobre o papel desses setores, e o impacto que eles geram na economia. Então o governo não perde nada, porque essa desoneração já vinha acontecendo, e mantém o nível de emprego e atividade econômica desses setores. Não justificaria esse veto, também foi um entendimento feito pelo Congresso com a própria participação do governo, então acho que foi um equívoco, por isso o governo agora retirou a proposta de reonerar e fez um projeto de lei, esse vai ser um debate intenso no Congresso, mas acho que vai prevalecer a desoneração por algum tempo ainda.
Tribuna: Alguns parlamentares criticaram o fato de as prefeituras terem ficado de fora desse projeto de lei. Foi um equívoco do governo?
Daniel Almeida: Sim, porque esse debate vem de longe, as prefeituras pagam uma alíquota de previdência muito elevada, e prefeitura não é uma atividade econômica; é um serviço público, não pode ser equiparado a uma atividade econômica. As prefeituras em geral não conseguem pagar, ficam com dívidas acumuladas, de tempos em tempos há uma renegociação, alonga essa dívida, e logo depois se verifica que não há possibilidade de pagar, então fica um jogo de “faz de conta”, o governo faz de conta que não perdoou, a prefeitura faz de conta que vai pagar, e tudo fica do mesmo jeito, e só gera insegurança jurídica e inadimplência. A medida que foi adotada de reduzir a alíquota para até 8% é uma medida correta e dá estabilidade, tanto na relação da prefeitura com o governo federal, quanto na tranquilidade para os prefeitos programarem os seus orçamentos junto às suas bases. Então foi uma coisa errada, espero que esse assunto continue sendo discutido.
Tribuna: Qual foi a impressão que o senhor teve do movimento convocado por Jair Bolsonaro na Avenida Paulista? O bolsonarismo mostrou força em sua avaliação?
Daniel Almeida: Nada mudou. Nós sabemos que o bolsonarismo tem força no Brasil, de uma parcela expressiva da sociedade que se vincula a esse tipo de discurso de ódio, de fake news, de mentiras e de tentativas de golpe. A eleição de 2022 demonstrou essa polarização, as pesquisas demonstram essa polarização, os debates na sociedade e os debates no Congresso demonstram essa polarização, então seria natural que esse campo político mobilizasse um número expressivo de pessoas, ainda mais em um ato que foi concentrado em um determinado lugar, pessoas ricas, com dinheiro, que podem pegar avião para se deslocar até São Paulo. Então foi um ato expressivo, dentro do previsível, e não muda nada o cenário nacional, porque a oposição vai continuar fazendo oposição, o governo tem a tarefa de governar, e eu acho que a gente tem que buscar nos preocupar mais em debater como enfrentar a fome, como gerar mais empregos, como cuidar dos problemas sociais, esse é que é o grande desafio do Brasil. Quem está no governo, o objetivo é esse, e fazendo isso tudo logo essa população vai perceber que essa polarização não interessa às pessoas de bem do Brasil.
Tribuna: O bolsonarismo vai ter algum peso na eleição municipal? Acredita que Bolsonaro vai conseguir puxar voto para uma quantidade expressiva de prefeitos?
Daniel Almeida: Sim, o bolsonarismo terá o peso correspondente à força que ele tem na sociedade hoje, mas em eleições municipais, o debate nacional sempre fica mais reduzido, deve prevalecer sempre a tratativa das questões locais. Então tem um peso, mas é um peso relativamente menor do que em uma eleição nacional, para quem está na oposição esse peso diminui mais ainda. Já quem é governo consegue interferir através do discurso, através da identidade programática e política, e às vezes através das ações de governo. Quem está na oposição tem sempre uma dificuldade maior de vincular esses discursos nas disputas locais. Então terá um peso, mas será um peso relativamente menor.
Tribuna: Mudará alguma coisa na relação do PCdoB com o governo do Estado após essa exclusão do partido na disputa pela vaga ao TCM? Como o partido está lidando com essa questão agora?
Daniel Almeida: Nós não achamos normal o que aconteceu nesse episódio, porque o entendimento político não se é obrigado a fazer, mas fazendo nós achamos que é obrigado a cumprir, e nós sempre entendemos é que houve um acordo político para que essa vaga fosse do PCdoB, não tivemos uma explicação para o não cumprimento desse acordo político. Essa será uma dívida que eu acho que essa base tem para o PCdoB. Vamos continuar cobrando isso, mas naturalmente é um episódio dessa relação que não deve estar em um patamar de abalar toda trajetória e relação política e programática que nós temos com o projeto de governar a Bahia. Nós somos parte desse projeto, consultores desse projeto, estamos nele desde sempre, acreditamos nele, e achamos que esse episódio deve ser tratado, mas superado no tempo mais curto possível.
Tribuna: E em relação ao voto? O PCdoB chegou a dizer na última semana que não iria participar da votação. Mas existe possibilidade de voltar atrás nessa decisão e até de apoiar um dos candidatos, inclusive Marcelo Nilo?
Daniel Almeida: Essa é uma discussão que a bancada está fazendo. Não participei dessa decisão da bancada, participei de uma conversa com a direção do partido, e o que prevalece até aqui é de não ter o voto da bancada do PCdoB na eleição. Nem para um nem para outro candidato. E, sim, uma abstenção, ou de uma ausência, na sessão que irá deliberar sobre essa matéria.
Tribuna: Na última semana, Geraldo Júnior afirmou que gostaria de ter Olívia Santana como vice em sua chapa. Esse desejo é recíproco no partido e na própria Olívia?
Daniel Almeida: Não vi essa manifestação do Geraldo. Se ela foi feita, acho que Olívia deve ficar grata pela lembrança, pela manifestação, mas esse é um assunto que ainda não foi tratado na direção do partido. E como a disputa em Salvador envolve um comando do candidato e do próprio governador, o PCdoB está aguardando para tratar o assunto tanto com Geraldo quanto com o governador, que é o comandante do projeto.
Tribuna: O senhor acredita que setores mais à esquerda vão ter alguma dificuldade de colar com a candidatura de Geraldo, visto que ela é muito identificada com o centro e a centro-direita?
Daniel Almeida: O grupo político liderado pelo governo do Estado estará integralmente na campanha de Geraldo. Acho que, dependendo da montagem da chapa, vai ficar uma chapa com características do governo, um governo de ampla frente de coalisão pelo Jerônimo. Nisso não levará nenhuma dificuldade de a esquerda se engajar nessa campanha. E vai depender também do programa a capacidade que ele tem de incorporar o programa vinculado mais à esquerda, com temas que são mais afeitos às posições que a esquerda defende. Acho que isso ele também vai ter capacidade de fazer, então não vejo isso como dificuldade. Ele tem muita simpatia, transmite muita simpatia, tem muita energia, circula muito. Ao longo da pré-campanha e da própria campanha, acho que essa desconfiança que paira em alguns setores vai ser superada.
Tribuna: De modo geral, qual a sua avaliação desse primeiro ano do governo de Jerônimo Rodrigues? O senhor acha que teve mais pontos positivos ou mais pontos negativos?
Daniel Almeida: Nesse primeiro ano prevaleceu a afirmação da liderança do Jerônimo como líder muito carismático e bom contato com o povo, com os setores da sociedade. Onde ele passou, transmitiu confiança e liderança, e ganhou adesões e apoio. Jerônimo, hoje, está mais forte do que quando ganhou a eleição. Acho que tem a necessidade de, neste ano, estabelecer uma marca, uma identidade, da gestão dele. O primeiro ano foi de tocar os compromissos, as obras, os contratos que o Rui Costa tinha feito no governo anterior, estabelecer um patamar de relação com o governo federal, que foi muito positivo ter contato com Lula, com a vinda de Lula aqui, estabelecendo alguns acordos, alguns entendimentos com o governo federal. Penso que esse ano é o ano de apresentar projetos que definam melhor a marca da gestão de Jerônimo. Mas considero o primeiro ano de governo dele muito positivo.