As crises de segurança que atingem estados como Rio e Bahia, os sinais emitidos pelo Senado e o recente episódio em que a mulher do chefe de uma das maiores facções criminosas do país foi recebida na sede do Ministério da Justiça enfraqueceram o nome do chefe da pasta, Flávio Dino, para ocupar a vaga de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). Auxiliares de confiança do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) avaliam segundo Sérgio Roxo, do O Globo, que, nesse cenário, o advogado-geral da União (AGU), Jorge Messias, ganhou fôlego na disputa que ele trava com o colega de governo nos bastidores.
A vaga no Supremo está aberta desde o dia 30 de setembro, quando Rosa Weber se aposentou ao completar 75 anos. Também está cotado ao posto o presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), Bruno Dantas.
Dino está lidando com as ondas de violência em dois estados populosos do Sudeste e do Nordeste, escalada que fez o Executivo decretar uma operação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO). Uma troca na pasta, no momento, poderia passar uma imagem de que o tema não está sendo tratado como prioridade pelo Palácio do Planalto, segundo o entorno do presidente.
Apesar de ressaltarem que Lula trata pouco do assunto, os auxiliares do petista acreditam ainda que, pelo histórico, a estratégia de Dino de dar protagonismo nas últimas semanas a seu secretário executivo, Ricardo Cappelli, não agrada ao presidente.
A exposição de Cappelli foi lida por integrantes do governo como uma tentativa de Dino de tornar natural a permanência do seu principal auxiliar no comando da pasta caso o presidente o escolha para o Supremo. De acordo com interlocutores, Lula reclama quando entende que ministros estão tratando suas áreas de atuação como “feudos”.
Agenda causa desgaste
Agendas no Ministério da Justiça também foram usadas pela oposição na tentativa de desgastar Dino. O jornal “O Estado de S. Paulo” revelou que Luciane Farias, apontada em investigações como a “dama do tráfico amazonense”, esteve na pasta em duas ocasiões com o secretário de Assuntos Legislativos, Elias Vaz. Ela é mulher de Clemilson Farias, o Tio Patinhas, chefe do Comando Vermelho, que está preso, cumprindo pena de 31 anos. Ela também foi sentenciada a 10 anos, mas responde em liberdade.
Sobre a audiência com Elias Vaz, o Ministério da Justiça afirma que o secretário reuniu-se com uma delegação de mulheres levada por Janira Rocha, ex-deputada estadual pelo PSOL no Rio e vice-presidente da Comissão de Assuntos Penitenciários da Associação Nacional da Advocacia Criminal. Dino reiterou que nunca recebeu “ninguém ligado a facções”, o que não impediu a exploração política do episódio.
Somado aos desgastes, o recado que o Senado deu ao rejeitar, há três semanas, a indicação de Lula para a chefia da Defensoria Pública da União (DPU) também despertou preocupação no Planalto. O resultado desfavorável foi alardeado por senadores oposicionistas como um sinal de que Dino também sofrerá um revés caso seja indicado. Apesar de o Senado só ter barrado indicações presidenciais para a Corte no fim do século XIX, há o receio entre governistas de que uma articulação a favor de Dino faça o governo gastar muito capital político. Como mostrou a colunista Bela Megale, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) compartilha da avaliação de que Messias teria um caminho mais tranquilo no Senado.
Em entrevista ao GLOBO, em setembro, Dino tentou conter uma crítica feita por adversários de sua candidatura, a de que usaria a Corte como trampolim para chegar à Presidência da República, ao dizer que não retornará à política caso seja indicado.
O próprio fato de tratar publicamente do assunto expõe uma faceta de sua atuação no ministério, sempre dando visibilidade às ações, seja nas redes sociais ou em entrevistas — o que muitas vezes o coloca em rota de colisão com opositores. Messias, por sua vez, é visto no entorno de Lula como um nome mais discreto, capaz de aparar arestas.
Dino é defendido pelos ministros Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes, do STF, enquanto o advogado-geral da União tem o apoio da maioria das lideranças do PT. Ele tem uma ligação antiga com o partido, mesmo não sendo filiado. No governo Dilma Rousseff, foi subchefe de assuntos jurídicos da Casa Civil.
Apesar de verem Messias como favorito, os auxiliares do presidente não se arriscam a dizer quando Lula deve fazer a escolha do indicado.
O jornal O Globo mostrou que Lula já leva, em média, mais que o dobro do tempo para definir quem vai ocupar a vaga aberta no STF do que o observado em seus dois mandatos anteriores no Planalto.
O presidente também precisa escolher o novo procurador-geral da República. A vaga vem sendo ocupada interinamente por Elizeta Ramos desde o fim do mandato de Augusto Aras.
Influência em jogo
Enquanto vê um caminho mais difícil para a Corte, Dino teve uma derrota em uma indicação de Lula para o cargo de desembargador do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), que fica em Brasília. O presidente nomeou ontem os juízes federais João Carlos Mayer Soares e Alexandre Machado Vasconcelos. O ministro Nunes Marques, do STF, apoiou a indicação de Soares, visto com bons olhos também pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), segundo integrantes do Judiciário.
Nos bastidores, além de a nomeação ser vista como um aceno a ambos, a escolha de Soares é apontada como um revés para Dino, que apoiou Pablo Zuniga.
Em abril, quando as primeiras nomeações de Lula para o TRF-1 foram feitas, um veto feito por Dino ao nome de Soares irritou o presidente da Câmara, segundo interlocutores.
Vasconcelos foi indicado pelo critério de antiguidade. Já a escolha de Soares se deu pela regra de merecimento. Eles assumem as vagas abertas com as aposentadorias de Olindo Herculano de Menezes e Cândido Artur Medeiros Ribeiro Filho.