Cotado para relator da CPI que irá investigar o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) na Câmara, o deputado Ricardo Salles (PL-SP) tem um histórico de confrontos com o grupo e de ligação com ruralistas. Ex-ministro do governo Bolsonaro, Salles também é alvo segundo Guilherme Caetano e Ivan Martínez-Vargas, do O Globo, de investigações por suposto favorecimento a madeireiros e obstrução de inquérito por crime ambiental.
Em 2018, quando concorreu à Câmara pelo Partido Novo, Salles produziu um panfleto de campanha no qual fazia alusões a armas de fogo e munições enquanto pregava “tolerância zero” com o MST. Seu número de urna fazia referência a um calibre de rifle, exibido no panfleto junto a uma foto de sem-terras.
As menções depreciativas ao MST seguiram neste ano. Em março, Salles afirmou que o movimento “se disfarça de ONG para encher o bolso de dinheiro” e que a CPI, à época ainda não criada, serviria para investigar as “ações terroristas” do grupo. O deputado também já se referiu ao MST com palavras como “picaretagem” e “bandidagem”.
Já a ligação de Salles com produtores rurais, categoria que articulou mobilizações contra invasões do MST neste mês, incluiu diversos acenos ao setor. Quando ministro do Meio Ambiente, Salles exibiu nas redes sociais imagens de um outdoor pago por ruralistas de Alta Mogiana (SP), com sua foto e os dizeres “o agronegócio está com você”.
Ele também é sócio de um empresário do agronegócio, Gastão de Souza Mesquita Filho, que tem participações em firmas do ramo e figura como diretor da empresa Movimento Endireita Brasil, presidida pelo deputado.
Salles nega que seu histórico represente conflito de interesses à frente da CPI, e afirma que se pautaria de forma técnica enquanto relator:
— Eu sou um dos que mais conhece o assunto na Casa e me comprometi com o presidente Arthur Lira e demais líderes a fazermos um trabalho sóbrio, respeitoso e técnico. Não haverá pirotecnia.
Alvo de processos
Salles responde ainda a processos movidos em razão de supostos delitos cometidos em suas passagens pela secretaria estadual de Meio Ambiente do governo de São Paulo e pelo Ministério do Meio Ambiente. Os dois principais inquéritos se originaram de investigações da Polícia Federal enquanto Salles era ministro. Em junho de 2021, o Supremo Tribunal Federal (STF) autorizou a abertura de um inquérito para investigar o então titular da pasta do Meio Ambiente, suspeito de atuar para atrapalhar as apurações da operação Handroanthus, que havia apreendido em dezembro de 2020 o equivalente a 6,4 mil caminhões lotados de madeira ilegal.
O processo foi aberto após notícia-crime apresentada pelo delegado Alexandre Saraiva, em abril de 2021. Com a exoneração de Salles em junho daquele ano, o inquérito foi enviado ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região.
Um mês antes, o então ministro e sua mãe, Dina Carvalho de Aquino, de quem é sócio em um escritório de advocacia, tinham sido alvo de um mandado de busca e apreensão na Operação Akuanduba, também deflagrada pela PF. A investigação apurava o envolvimento de agentes públicos na exportação de madeira ilegal, especificamente pelos crimes de corrupção, advocacia administrativa, prevaricação e facilitação de contrabando.
Um despacho do ministro do STF Alexandre de Moraes determinou o afastamento de Eduardo Bim, homem de confiança de Salles na presidência do Ibama, e citou Salles e outros servidores públicos e empresários como suspeitos de integrar o que a PF chamou de “grave esquema criminoso de caráter transnacional”.
Em outro inquérito, no Tribunal de Justiça de São Paulo, Salles foi condenado na primeira instância por improbidade administrativa, em 2018. A promotoria o acusa de fraudar o Plano de Manejo da Área de Proteção Ambiental da Várzea do Rio Tietê em 2016, quando era secretário, para permitir mineração e atender a supostos interesses da Federação das Indústrias de São Paulo. Ele foi absolvido na segunda instância, em 2021. O Ministério Público recorreu.