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segunda-feira 25 de julho de 2022 às 07:15h

Conselho de Ética da Câmara dos Deputados arquiva 7 a cada 10 ações contra deputados

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O Conselho de Ética da Câmara já arquivou conforme levantamento publicado por Gabriela Vinhal, do UOL, mais de 70% das representações apresentadas contra deputados desde que foi criado, em outubro de 2001. Nos últimos 21 anos, o colegiado recebeu 212 processos — e engavetou 152 deles. A comissão tem o poder de analisar eventuais quebras no decoro parlamentar e aplicar punições aos congressistas.

Entre as possíveis sanções estão a censura verbal ou escrita, a suspensão do exercício por até seis meses e a cassação do mandato — punição que foi sugerida 24 vezes pelo colegiado ao plenário, que referenda a perda de cargo.

A mais recente delas foi em junho do ano passado contra a ex-deputada Flordelis (então PSD-RJ), acusada de ser mandante do assassinato do marido, o pastor Anderson do Carmo, em junho de 2019.

A primeira perda de mandato sugerida pelo Conselho de Ética ocorreu em 2004. O órgão recomendou a cassação do deputado André Luiz (eleito pelo então PMDB e sem partido, à época em que foi cassado), acusado de tentativa de extorsão de R$ 4 milhões para retirar o nome do bicheiro Carlos Cachoeira do relatório final da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Loterj, realizada naquele ano, na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.

Entre as 24 sugestões de perda de mandato feitas pelo conselho, 8 foram confirmadas pelo plenário da Câmara. Veja a lista:

  • Flordelis (PSD-RJ), com 437 votos
  • Natan Donadon (sem partido-RO), com 467 votos
  • Eduardo Cunha (MDB-RJ), com 450 votos
  • André Vargas (PT-PT), com 359 votos
  • Roberto Jefferson (PTB-RJ), com 313 votos
  • André Luis (sem partido-RJ), com 311 votos
  • José Dirceu (PT-SP), com 293 votos
  • Pedro Corrêa (PP-PE), com 261 votos

Para que uma cassação seja confirmada em plenário, é necessária maioria simples, ou seja, 257 votos entre os 513 deputados.

Antes criação do conselho, outros 17 deputados haviam sido cassados pelo Congresso desde o fim do regime militar (1964-1985) — o último foi Hildebrando Pascoal (AC), em setembro de 1999, acusado de envolvimento com narcotráfico e esquema de venda de sentenças.

Até 2001, as denúncias contra parlamentares eram recebidas pelo corregedor da Câmara e ficava a seu critério pessoal dar continuidade ao processo, bem como a fixação dos prazos para produção de provas e o acolhimento da defesa.

Arquivamento contra o presidente

Um dos casos já arquivados pelo Conselho de Ética foi contra o atual presidente Jair Bolsonaro, em 2016, por “falta de justa causa”. À época, o PV citou a homenagem que o então deputado do PSC fez ao torturador Carlos Alberto Brilhante Ustra durante a votação que confirmou o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT). O militar comandou o DOI-Codi (Destacamento de Operações Internas) de São Paulo entre 1970 e 1974, durante a ditadura (1964-1985).

Outro exemplo de arquivamento foi contra o ex-deputado Alberto Fraga, ex-aliado de Bolsonaro, que em uma sessão de plenário disse que “mulher que participa da política e bate como homem tem de apanhar como homem também”. O PC do B pediu que o parlamentar fosse responsabilizado, mas a ação foi engavetada pelo entendimento do colegiado de que o verbo “bater” não foi utilizado em seu sentido literal.

Bolsonaristas na mira

Desde o início desta legislatura, a maioria das representações apresentadas questionou o decoro parlamentar de deputados aliados do presidente Jair Bolsonaro (PL).

De 2019 até 2022, foram protocolados 58 processos — sendo 39 contra bolsonaristas, o que equivale a 67%. Desses, dez são contra Eduardo Bolsonaro (PL-SP), um dos filhos do chefe do Executivo. Em seu segundo mandato, ele é recordista de representações nos últimos quatro anos. Apenas três desses processos foram analisados até hoje e todos foram arquivados.

Outro aliado de Bolsonaro, o deputado Daniel Silveira (PTB-RJ) já foi alvo de nove processos — basicamente todas as representações tratam sobre o vídeo publicado nas redes sociais no qual o parlamentar faz apologia ao golpe militar e ataca os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal). Nenhum deles avançou até o plenário da Câmara.

Silveira foi condenado pelo STF a 8 anos e 9 meses de prisão, em regime inicialmente fechado por ataques feitos a integrantes da corte. Além da imposição de pena, os magistrados também votaram para cassar o mandato do parlamentar e suspender os direitos políticos. Bolsonaro, porém, concedeu indulto ao deputado — e sua candidatura ainda é incerta (caberá à Corte analisar a constitucionalidade do decreto do presidente).

Procurado, Silveira informou, em nota, que os processos foram abertos “de forma ideológica por partidos de oposição, sem teor técnico e fundamento aceitável. Movidos por apenas ideologias esvaziadas. Vendo quem e quais partidos representaram, vemos, claramente, que estamos no caminho certo”.

“Cito como exemplo um processo aberto por eu ter apresentado projeto de lei por buscar tornar o grupo antifas, grupo de terrorismo. Outro por eu estar em manifestação e alertar aos extremistas da esquerda que em manifestações que eles agrediram pessoas, iriam encontrar um armado que provavelmente defenderia a família e talvez usasse da letalidade”, completou.

A reportagem também procurou Eduardo, mas até a última atualização desta reportagem, não teve resposta.

Outras legislaturas

Na legislatura anterior (de 2015 a 2018), foram apresentadas 28 representações, quase metade do número atual do colegiado. De 2011 a 2015, parlamentares ingressaram com 20 processos no colegiado — 10 a mais da quantidade protocolada entre 2007 e 2010.

Antes disso, operações policiais e escândalos de corrupção serviram de motivo para a apresentação de processos contra deputados. Em 2006, por exemplo, quando foi deflagrada pela Polícia Federal a Operação Sanguessuga — que investigou um esquema de fraude em licitações na área da saúde e desvios de dinheiro público para a compra de ambulâncias — foram apresentadas 71 representações.

No ano anterior, em 2005, quando estourou o escândalo do Mensalão — um esquema de compra de apoio político no Congresso também durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) — foram protocoladas 23. Naquele ano, o plenário da Câmara cassou José Dirceu, ex-ministro da Casa Civil e um um dos principais responsáveis pela campanha vitoriosa do petista em 2002.

No total, de 2003 a 2006, somaram-se 95 representações.

Acusado de corrupção

A demora para a chegada de alguns processos ao Conselho de Ética também chama a atenção. Como é o caso da representação contra Wilson Santiago (Republicanos-PB), apresentada no início deste ano, pelo Novo. O processo foi instaurado só dois anos depois que o plenário derrubou a decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) que afastou o deputado após suspeita de corrupção.

O principal argumento utilizado por integrantes do Centrão para manter o mandato de Santiago e contrariar a decisão da Corte foi que o caso deveria ser tratado pelos próprios parlamentares, por meio do colegiado. Por isso, deveria ser ingressada uma ação no órgão.

Entretanto, o colegiado ainda não deliberou sobre o caso. Santiago é acusado pelo Ministério Público de desviar recursos de obras para mitigar os impactos da seca no sertão da Paraíba.

Mudanças antirregimentais

Já considerado alto, o número de ações engavetadas pelo conselho ainda pode aumentar. Isso porque o presidente do colegiado, o deputado Paulo Azi (União-BA), fez mudanças nas regras do órgão sem que tivesse previsão regimental e criou um “exame prévio de admissibilidade” das representações — ou seja, ele passou a ter o poder de avaliar se o processo se encaixa ou não nas regras sobre quebra de decoro parlamentar.

Se algum membro do conselho discordar, pode entrar com um recurso contra a decisão do presidente — que colocará o caso em votação no colegiado.

Na prática, porém, a manobra permite que Azi barre de antemão ações — sem que elas tramitem na comissão. O presidente do conselho utilizou o recurso duas vezes até o momento — entre eles, o processo apresentado pelo PSOL contra o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).

A justificativa da liderança é que Lira agiu com “autoritarismo, excesso das suas prerrogativas como presidente [da Câmara], ameaça e descumprimento do regimento”.

Na ocasião, Azi negou a abertura do processo “por ausência de justa causa, com base na decisão do presidente do Conselho de Ética”. Foi apresentado um recurso contra a deliberação de não receber a ação. Azi colocou em votação e recebeu 13 votos contrários e 5 favoráveis.

Inicialmente, o rito normal era que todas as representações já tramitavam automaticamente, com a escolha de um relator. A análise de admissibilidade era posterior à apresentação do relatório.

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