Nos oito primeiros meses de 2022, com uma semana de campanha, foram registradas 1.300 pesquisas eleitorais junto ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Em todo o ano 2018, quando ocorreram as últimas eleições presidenciais, houve 697 registros. Contudo, não é fácil navegar no oceano de informações que elas trazem.
Por isso, o Estadão conversou com especialistas em pesquisa eleitoral para entender o que é necessário observar para saber se uma pesquisa possui informações confiáveis ou não.
O registro no TSE
O primeiro ponto que pode ser observado é o registro da pesquisa na Justiça Eleitoral, que gera um número que pode ser consultado por qualquer pessoa na página do PesqEle (Sistema de Registro de Pesquisas Eleitorais) (acesse aqui). Como explica a professora Rose Marie Santini, diretora geral do Netlab UFRJ (Laboratório de pesquisas da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro), “somente as pesquisas de intenção de voto registradas no TSE devem ser consideradas pelo eleitor como válidas”.
Contudo, o registro é diferente do controle. De acordo com o TSE, “o registro de pesquisas eleitorais é um ato unilateral”, e as empresas e institutos são responsáveis pelas informações prestadas.
Quem financia pesquisa eleitoral no Brasil?
Os institutos de pesquisa devem, obrigatoriamente, disponibilizar junto com os resultados da pesquisa o valor do investimento e quem a solicitou – identificando o contratante com CPF e CNPJ. Essa é a regra estabelecida pela resolução n. 23/2019 do TSE. Para Jimmy Medeiros, professor e pesquisador da FGV (Fundação Getúlio Vargas), o financiamento de pesquisas por bancos e instituições financeiras, por si só, não é um problema: “o trabalho bem feito para essas empresas também é um trabalho bem feito para o público. Se eu sou o dono de um instituto sério, eu nunca estragaria a minha credibilidade para uma eleição. A marca do instituto é o grande ativo dele”.
Por outro lado, um fator que causa preocupação na ABEP (Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa) são as pesquisas autofinanciadas – isto é, quando os institutos as custeiam com recursos próprios. João Francisco Meira, coordenador do Comitê de Opinião Pública do órgão, ressalta que “estamos inclusive procurando chamar atenção do Ministério Público Eleitoral”, citando casos de empresas pequenas e com pouco patrimônio que divulgam pesquisas que demandaram um aporte milionário.
Filiação à ABEP
Conferir se a empresa é filiada à ABEP é outro ponto importante para checar a credibilidade das pesquisas publicadas. Isso porque a entidade é filiada a órgãos internacionais e exige que seus mais de 200 associados sigam padrões de governança e de qualidades técnicas. “A gente verifica os procedimentos das empresas e fornece a elas certificado de adesão a determinadas normas”, explica Meira.
A filiação da empresa à ABEP é independente do registro das pesquisas no TSE e tem como diferencial a não-obrigatoriedade. A empresa que se filia aceita seguir determinados critérios e se sujeitar a instâncias internas de auditoria. “Caso haja necessidade de convocar um associado a prestar esclarecimento a respeito das características de algum trabalho que gerou algum tipo de polêmica, nós realizamos a investigação, o que torna tudo mais seguro”, explica Meira.
De acordo com o levantamento da associação, 87% das pesquisas publicadas no primeiro semestre de 2022 vêm de empresas que não são associadas à ABEP.
Pesquisa eleitoral online, por telefone e presencial
Apesar da facilidade dos levantamentos feitos à distância – pela internet e por telefone – o eleitor deve se atentar a esses diferentes métodos de pesquisa. Como explica Santini, “as pesquisas online e por telefone são muito mais limitadas do que as pesquisas presenciais, pois excluem uma parcela da população que não tem acesso ou não usa telefone ou internet”. Medeiros compartilha da posição da professora, afirmando que o método “influencia na amostra da representatividade”, enviesando os resultados.
A pesquisa eleitoral saiu na imprensa?
Outra forma de garantir que uma pesquisa é confiável é checar o veículo que a noticiou. “Se chegou no Whatsapp ou veio de uma página do Facebook estranha, se nenhum veículo deu ou não é encontrado no site do instituto, você pode começar a desconfiar”, afirma Medeiros. Os grandes veículos de imprensa costumam checar vários dos requisitos necessários para uma pesquisa e muitos têm parcerias com empresas consolidadas no ramo, o que reduz a possibilidade de que alguma pesquisa falsa seja veiculada.
Recebi uma pesquisa falsa. Como denuncio?
De acordo com a legislação brasileira, a justiça eleitoral não pode fiscalizar pesquisas eleitorais de ofício – ela precisa ser provocada através de um tipo de processo chamado de representação eleitoral. Além de dados falsos, pesquisas que não tenham o registro junto ao TSE ou informações claras de financiamento podem ser levadas para a justiça por meio de partidos políticos.
No site do Tribunal, contudo, há uma aba para denúncia de informações falsas sobre o processo eleitoral, na qual qualquer cidadão pode preencher um formulário com a denúncia. O site pode ser acessado clicando aqui.
Agregador de pesquisa do Estadão
Em junho deste ano, o Estadão lançou um agregador de pesquisas. A ferramenta disponibiliza dados sobre candidatos que foram levantados por 14 empresas de pesquisa, considerando suas peculiaridades metodológicas, para calcular uma média que aponte o cenário mais provável das disputas eleitorais.
O agregador atualiza todos os dias os números e constrói uma “linha do tempo” com as intenções de voto que cada candidato reúne.
Como é feita uma pesquisa eleitoral?
Não existe uma fórmula para a realização das pesquisas, mas sim uma série de etapas fundamentais que devem ser adotadas pelos institutos. Até que os dados sejam divulgados pelos veículos de comunicação ou pelos próprios centros de pesquisa, muita coisa precisa acontecer.
Tudo começa com o questionário. Para que sejam abordados os entrevistados, é preciso pensar primeiro nas perguntas. Elas precisam ter uma linguagem adequada ao público, de maneira que todos possam compreender o que está sendo questionado.
Depois, vem a parte da amostragem, que é a seleção de quem vai ser entrevistado. É nesse momento que entra o trabalho de uma figura muito importante: o estatístico. “Tem que ter um cuidado gigantesco para não ter viés. Ou seja, para não ‘sobre representar’ um grupo em detrimento de outro”, conta Medeiros.
A partir daí vem o trabalho de campo, isto é, as entrevistas. Algumas pesquisas são feitas pela internet ou por telefone, mas o método mais eficaz para o acesso a um grupo amostral mais diverso é o presencial. Com a coleta concluída, vem a análise dos dados. É nessa etapa que as respostas dos questionários são relacionadas com a formatação do banco de dados ou que se calcula a margem de erro, por exemplo.
Embora o TSE não fiscalize o resultado, isso serve para tornar público o acesso aos dados coletados. Durante o período de campanha eleitoral não são permitidas pesquisas, nem sequer enquetes, que não estejam registradas previamente na justiça eleitoral.