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domingo 9 de junho de 2019 às 09:26h

Confira o que diz decisão que suspendeu bloqueio de verbas a universidades

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A juíza federal baiana Renata Almeida de Moura Isaac, da 7ª Vara Federal, em Salvador, decidiu suspender na sexta-feira (7) os bloqueios orçamentários determinados pelo MEC (Ministério da Educação) sobre as verbas destinadas às universidades federais.

Ela analisou oito ações contra a decisão do governo, uma delas de autoria do Diretório Central dos Estudantes da Universidade de Brasília, e fixou multa de R$ 100 mil por dia caso a decisão não seja cumprida em 24 horas. O governo pode recorrer.

O bloqueio é de 30% das despesas discricionárias (não obrigatórias), como investimentos (construção de salas, laboratórios, renovação, bolsas para pesquisas, custeio de projetos científicos, por exemplo), contratação de serviços, além de pagamentos de terceirizados, luz e energia. A decisão, do fim de abril, gerou diversos protestos pelo país.

Hoje, o governo federal gasta mais do que arrecada, e uma de suas alternativas é suspender temporariamente o gasto de verbas enquanto a situação do Brasil não melhora. Gestões anteriores também já congelaram verbas destinadas à educação.

Por meio de sua assessoria de imprensa, o Ministério da Educação informou à BBC News Brasil na manhã deste sábado (8) ainda não ter sido notificado da decisão da Justiça da Bahia. Disse ainda que a defesa judicial é de competência da AGU (Advocacia-Geral da União). O Palácio do Planalto, também nesta manhã, não quis se pronunciar sobre o assunto.

Mas o que diz exatamente a decisão que pode atrapalhar os planos do governo?

Declarações do ministro

No texto, a juíza Renata Almeida de Moura Isaac citou entrevista que o ministro da Educação, Abraham Weintraub, deu ao jornal “O Estado de S. Paulo” no fim de abril. Na ocasião, três universidades tinham sido escolhidas para terem seus repasses reduzidos: a Universidade de Brasília, a Universidade Federal Fluminense e a Universidade Federal da Bahia.

Na entrevista, o ministro declarou: “Universidades que, em vez de procurar melhorar o desempenho acadêmico, estiverem fazendo balbúrdia, terão verbas reduzidas”. Também disse que a universidade “deve estar com sobra de dinheiro para fazer bagunça e evento ridículo”.

A juíza levou em conta as declarações do ministro para tomar sua decisão. Afirmou, no texto, não haver “necessidade de maiores digressões para concluir que as justificativas apresentadas não se afiguram legítimas para fins de bloqueio das verbas”.

Ela citou nominalmente as três universidades que a princípio tiveram suas verbas contingenciadas, a UNB, a UFF e a UFBA. “As instituições de ensino em questão sempre foram reconhecidas pelo trabalho de excelência acadêmico e científico ali produzido, jamais pela promoção de ‘bagunça’ em suas dependências.”

Para a juíza, a entrevista foi além da “mera retórica política”, já que as três universidades de fato tiveram parte de suas verbas bloqueadas, o que ela classificou como uma “promoção de política discriminatória e persecutória”.

Em seguida, a juíza escreve que, depois da entrevista, o MEC emitiu nota esclarecendo que o bloqueio no orçamento havia sido “operacional, técnico e isonômico para todas as universidades e institutos”, ou seja, não apenas nas três instituições citadas antes.

Ela considera então que o MEC teria mudado de critério – daquele divulgado em um primeiro momento por Weintraub, o da “balbúrdia” — para aquele divulgado em um momento posterior pelo MEC, de que o congelamento era técnico e em igual medida para todas as universidades. E, então, se propõe a analisar a legitimidade do novo critério.

A juíza destaca ainda que os bloqueios realizados pelo MEC incidiram sobre verbas discricionárias, ou seja, não legalmente obrigatórias.

Educação como direito fundamental

A segunda parte da argumentação da juíza começa fazendo referência à Constituição de 1988, que definiu a educação como “direito fundamental social” e estabeleceu que o financiamento das instituições de ensino públicas federais compete à União.

Então, conclui a juíza, “ao permitir que estas instituições se sujeitem ao risco de não cumprir obrigações contratuais, inclusive de serviços básicos e imprescindíveis à continuidade da atividade acadêmica, a exemplo de custos de energia, água, vigilância, limpeza e manutenção”, a União estaria se eximindo de obrigações constitucionais.

‘Autonomia das universidades’

Uma terceira regra constitucional, então, é citada. É a regra da autonomia universitária.

A juíza cita o artigo 207 da Constituição: “as Universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão”.

Ela afirma, então, que os cortes “poderão retirar por completo a efetividade da autonomia universitária contemplada na Carta Magna, uma vez que os dirigentes já não poderão decidir acerca dos rumos da instituição”, principalmente em relação à “gestão financeira e patrimonial”.

‘Ofensa ao princípio de vedação ao retrocesso social’

A decisão segue com mais argumentos. O seguinte é de que a paralisação das atividades das universidades implicará “ofensa ao princípio da vedação ao retrocesso social”.

O que significa isso?

Vedação ao retrocesso social é um princípio do direito que estabelece que direitos sociais já adquiridos pela sociedade devem ser considerados como constitucionalmente garantidos. Portanto, quaisquer medidas que anulem os direitos sem criar outro método compensatório são consideradas inconstitucionais.

“(…) as universidades e institutos são verdadeiras conquistas da população brasileira, responsáveis pela formação de milhares de indivíduos. Inegável, portanto, que a descontinuidade dos serviços prestados por essas instituições traria grave prejuízo a toda coletividade”, diz a decisão.

Para reforçar o ponto, a juíza cita voto proferido pelo Ministro Celso de Mello em um julgamento sobre a legalidade da redução do orçamento destinado à Justiça do Trabalho, em que ele também evoca esse princípio para dizer que uma redução da verba produziria “inaceitável efeito perverso em detrimento dos trabalhadores”. O ministro escreve que o princípio “impede que sejam desconstituídas as conquistas já alcançadas pelo cidadão ou pela formação social em que ele vive”.

Necessidade de estudo ‘técnico e minucioso’

Por fim, a juíza conclui sua decisão exigindo que haja “prévio estudo técnico e minucioso, inclusive com a participação dos representantes destas instituições, para fins de se garantir que o bloqueio incidente sobre as verbas discricionárias não interferirá na continuidade das atividades acadêmicas”.

Do contrário, afirmou no texto, haverá “esvaziamento das diretrizes constitucionais na área de educação e das prerrogativas das universidades públicas”.

“O corte na forma realizada pelo MEC, tido por linear e isonômico, lança os dirigentes das instituições de ensino federais a sua própria sorte, ficando à mercê da boa vontade do alto escalão ministerial. Não resta dúvida, portanto, se tratar de hipótese de abuso de direito, que não deve passar despercebida pelo Poder Judiciário.”

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