O início do ano legislativo do Congresso Nacional em 2025 foi marcado por uma “guerra de bonés” travada entre integrantes da base e da oposição ao governo do presidente Lula da Silva (PT). A iniciativa faz parte de uma estratégia antiga de congressistas, que buscam criar símbolos conforme reportagem de Gabriel de Sousa, do Estadão, para atrair a atenção dos eleitores.
Em outras ocasiões, parlamentares levaram outros objetos como faixas, dinheiro falso e um lança confete para os plenários da Câmara e do Senado.
![O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, e o líder da oposição na Câmara, Luciano Zucco](https://i0.wp.com/www.estadao.com.br/resizer/v2/XUL3SSUN55HUTBPBSUPR2U6QVU.jpeg?w=660&ssl=1)
A “guerra dos bonés” começou no dia 1.º, quando aliados de Lula utilizaram um acessório com os dizeres “O Brasil é dos brasileiros”, em referência ao distribuído por Donald Trump, nos Estados Unidos, com o lema “Make America Great Again” (Torne a América Grande de Novo, em português). A oposição ao presidente reagiu, confeccionou peças com as frases: “Comida barata novamente. Bolsonaro 2026″, e apareceu com o item no Congresso na segunda-feira, 3.
De acordo com especialistas ouvidos pelo Estadão, apesar de a prática do uso de elementos no Legislativo ser comum, o significado da simbologia se tornou outra no decorrer dos anos. Antes, a utilização dos objetos era uma forma encontrada pelos congressistas para se manifestarem sobre os acontecimentos políticos e, agora, refletem mais as estratégias para viralizarem nas redes sociais.
De acordo com Thiago Valenciano, cientista político da Universidade Federal do Paraná (UFPR), os políticos entenderam que, ao levar objetos que simbolizam uma mensagem para o Congresso, conseguem provocar a atenção de dois grupos importantes: os redutos eleitorais e a imprensa.
“Se antes, se chamava a atenção a boa retórica, hoje, cinco minutos de discurso é tempo demais. É preciso, para eles, pensar em novas estratégias. Com os objetos, você atinge dois grupos importantes para um político: a sua militância e a imprensa, que acaba tratando do tema porque chama a atenção por fugir do corriqueiro dia a dia do Parlamento”, afirmou Valenciano.
Para Murilo Medeiros, cientista político da Universidade de Brasília (UnB), o uso de símbolos para representar uma pauta é uma estratégia que também está sendo adotada em outros países. Segundo ele, os movimentos mostram como a publicidade está se tornando mais importante para os políticos do que o debate de proposições. Como exemplo, estão os adereços utilizados por Trump que acabaram inspirando o governo Lula e, consequentemente, desencadearam a “guerra dos bonés”.
“É uma estratégia corriqueira de lideranças públicas utilizar imagens e símbolos para conectar uma ideia ao seu eleitor, ou para desfazer determinados conceitos pré-estabelecidos pela sociedade. É um marketing guiando a política em despeito do debate de ideias”, disse Medeiros.
Os regimentos internos da Câmara e do Senado não proíbem que os parlamentares levem objetos para os plenários. Porém, os congressistas que presidem as sessões podem censurar oralmente ou até mesmo expulsar dos recintos os colegas que “perturbarem a ordem” dos trabalhos legislativos.
Impeachment de Dilma teve faixas com ‘Tchau, querida’
Durante o processo de impeachment de Dilma Rousseff (PT), deputados que apoiavam ou eram contra a medida levaram faixas para o plenário onde ocorreu a votação sobre o prosseguimento da ação de cassação do mandato da então presidente.
Enquanto os defensores do impeachment exibiram cartazes escritos “Tchau, querida”, “Impeachment, já” e “Acabou a boquinha”, os aliados de Dilma apresentaram faixas com os dizeres “Fora, Cunha” (em referência ao então presidente da Câmara Eduardo Cunha), “Brasil contra o golpe” e “Fica, querida”.
Durante a votação, o deputado Wladimir Costa (Solidariedade-PA), um dos apoiadores do impeachment, acionou um lança confete ao votar contra Dilma. “Nós votamos sim, e quem vota sim, coloca a mão para cima”, gritou o deputado, liberando os confetes em seguida.
‘Pixuleco’ de Lula causou tumulto na Câmara
Em agosto de 2017, durante a sessão da Câmara que analisou uma denúncia de corrupção sofrida pelo ex-presidente Michel Temer (MDB), deputados aliados do emedebista exibiram “Pixulecos” – bonecos infláveis de Lula vestido como um presidiário – para o plenário.
Os bonecos causaram uma confusão, novamente protagonizada por Wladimir Costa, que começou a fazer barulho ao levantar dois “Pixulecos” e batê-los um contra o outro. Quando os objetos escaparam da mão do paraense, a oposição resolveu estourá-los e escondê-los.
![Bonecos infláveis que mostravam Lula como um presidiário causou tumulto na Câmara em 2017](https://i0.wp.com/www.estadao.com.br/resizer/v2/OMXPXAMA4VBRZLKPT5RCCPN4WE.jpg?resize=660%2C397&ssl=1)
A oposição a Temer, composta majoritariamente pelo PT, também levou objetos para a Câmara naquele dia. Os parlamentares atiraram notas de dinheiro falso sobre a Mesa Diretora, deixando o então presidente da Casa Rodrigo Maia, visivelmente constrangido.
![Oposição ao então presidente Michel Temer jogou dinheiro falso no ar durante sessão na Câmara](https://i0.wp.com/www.estadao.com.br/resizer/v2/ILMPQSWSNBER3HTOPOCRUS63KU.jpg?w=660&ssl=1)
Em julho de 2019, o então ministro da Justiça, Sérgio Moro, recebeu um troféu das mãos do deputado Boca Aberta (PROS-PR) em sessão da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara. Sob aplausos dos aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro e vaias da oposição, o parlamentar entregou o presente ao ministro justificando que seria um prêmio para a “maior estrela do combate à corrupção brasileira”.
“Sérgio Moro, neste momento o entrego o troféu da Champions League (em referência ao maior torneio de clubes de futebol clubes do mundo) ao senhor. Na gravura, eu fiz questão de colocar: Sérgio Moro, a maior estrela do combate à corrupção brasileira. Beijo no coração, Sérgio Moro”, disse Boca Aberta ao entregar o item para o então ministro.
Essa não foi a primeira vez que um parlamentar levou para o Congresso um objeto relacionado ao futebol. Em agosto de 2009, o então senador Eduardo Suplicy (PT-SP) mostrou um cartão vermelho (em referência ao gesto dos árbitros de futebol ao anunciarem a expulsão de um atleta) ao pedir a renúncia do presidente do Senado à época José Sarney.
“Para o povo brasileiro entender bem o que isso significa é nós falarmos a linguagem do esporte mais popular no Brasil. O que faz um juiz nos campos de futebol do Brasil para que todos entendem? Apresenta o cartão vermelho. Então, eu avalio que, nessas circunstâncias, o melhor passo para a saúde do Senado e do próprio presidente José Sarney é o simbolizado neste cartão vermelho”, disse Suplicy.
![Em 2009, então senador Eduardo Suplicy mostrou um cartão vermelho para o presidente do Senado, José Sarney](https://i0.wp.com/www.estadao.com.br/resizer/v2/TLB5SGDPHZNIRL45MFFR5ILPCY.jpg?w=660&ssl=1)
Deputados expulsos após levarem faixa provocando o PT
Desde o início do terceiro mandato de Lula na Presidência, a oposição ao petista aposta em faixas e adesivos que contêm provocações dirigidas a ele e ao PT. O recado de como seria a relação entre os blocos antagonistas foi dado no primeiro dia da legislatura da Câmara, em 1.º fevereiro de 2023.
Naquele dia, os deputados Eduardo Bolsonaro (PL-SP), Gilvan da Federal (PL-ES), Gustavo Gayer (PL-GO), Julia Zanatta (PL-SC) e Nikolas Ferreira (PL-MG) apareceram com adesivos escritos “Fora, Lula” e “Fora, Ladrão”.
![Deputados de oposição ao governo Lula tomaram posse em 2023 com adesivos provocativos ao chefe do Executivo](https://i0.wp.com/www.estadao.com.br/resizer/v2/YUE4O6OUMNDZVEOKXVTQJ6AFRM.jpg?w=660&ssl=1)
Em fevereiro do ano passado, durante uma sessão solene que celebrou os 44 anos de fundação do PT, os deputados Coronel Meira (PL-PE), Eduardo Bolsonaro e Paulo Bilynskyj (PL-SP) entraram no plenário com uma faixa escrita: “44 anos de corrupção. Parabéns”, ironizando o aniversário da sigla.
Após o início de uma discussão entre os deputados autores da ação e o deputado Lindbergh Farias (RJ), a deputada Maria do Rosário (PT-RS), que presidia a sessão, chamou Polícia Legislativa para guardar a faixa. Os deputados do PL foram retirados do plenário pelos policiais após a ordem de Rosário que, seguindo o regimento interno, entendeu que eles estavam perturbando a ordem da atividade legislativa.
Bonecos de fetos para debater aborto no Senado
Um dos maiores críticos do aborto legal no Senado é o senador Eduardo Girão (Novo-CE), que costuma carregar réplicas de fetos para tentar convencer outros parlamentares dos malefícios do procedimento. Em uma palestra realizada em Belo Horizonte, em maio de 2023, ele disse que entregou os objetos para quase todos os colegas da Casa.
“No Senado, já entreguei para pelo menos uns 80% dos senadores. Fui de gabinete em gabinete logo que cheguei no Senado”, disse Girão em reunião do Vida, Família e Liberdade, organizado por políticos da direita mineira.
Em junho do ano passado, o senador organizou uma sessão na Casa para discutir a assistolia fetal, procedimento previsto para o aborto legal em até 22 semanas de gravidez. Durante a reunião, Girão mostrou dois bonecos para mostrar o tamanho dos fetos na idade máxima permitida para a realização do procedimento médico.
![O senador Eduardo Girão (Novo-CE) exibe réplicas de fetos em sessão para discutir aborto.](https://i0.wp.com/www.estadao.com.br/resizer/v2/23L5KXEXVBD2NFYBQQEHI3SXWU.jpg?w=660&ssl=1)
Na mesma sessão, o deputado Zacharias Calil (União Brasil-GO) colocou na tribuna do Senado um modelo anatômico que mostrava um útero feminino durante o procedimento de aborto legal. A exposição dos bonecos, além de uma encenação de uma artista que simulou ser um feto durante uma assistolia fetal, causou indignação do então presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
![O deputado Zacharias Calil levou modelo anatômico para o Senado para encenar procedimento de aborto legal](https://i0.wp.com/www.estadao.com.br/resizer/v2/LSLK6L7OTFBLPN4BBLIP4WRIVY.jpg?w=660&ssl=1)