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quinta-feira 29 de julho de 2021 às 08:48h

Com novos aliados, Bolsonaro volta a sugerir filiação ao PP

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Enquanto espera decisões do Congresso sobre voto impresso, reforma eleitoral e os desdobramentos da CPI da Pandemia, o presidente Jair Bolsonaro vai adiando a decisão sobre a qual partido se filiará se decidir disputar a reeleição em 2022.

Na manhã da quarta-feira (28), em entrevista à rádio Mundial FM, de Luís Eduardo Magalhães no Oeste da Bahia, o presidente declarou: “Eu tenho que ter um partido político. Não sei se vou disputar as eleições do ano que vem. Devo disputar, não posso garantir.”

Segundo reportagem da CNN Brasil, a entrada no governo federal do senador Ciro Nogueira, presidente do Progressistas (PP), à frente da Casa Civil deixou o presidente mais perto do PP – mesmo partido de Arthur Lira, presidente da Câmara dos Deputados. Na entrevista, Bolsonaro confirmou a possibilidade. “Temos conversado com vários partidos, entre eles o partido Progressistas, ao qual integrei por aproximadamente 20 anos ao longo de 28 que eu fui deputado federal”, lembrou Bolsonaro.

Sem filiação desde novembro de 2019, quando saiu do PSL, Bolsonaro já é o presidente que ficou sem vínculo partidário no Planalto por mais tempo. Pela legislação eleitoral, Bolsonaro precisa estar filiado a um partido no mínimo seis meses antes do pleito. Ou seja, para concorrer a mais um mandato, Bolsonaro precisa se decidir até março de 2022.

Desde que se desfiliou do partido pelo qual foi eleito presidente, Bolsonaro vem tentando montar sua própria sigla, a Aliança Pelo Brasil. De acordo com as regras atuais, simplificando a complicada matemática feita pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral), um novo partido só pode ser criado se tiver 491.967 assinaturas de eleitores (não filiados a outros partidos) de pelo menos nove unidades da Federação.

Ainda de acordo com informações do TSE, a Aliança tem apenas 117.213 assinaturas validadas. Com o baixo desempenho, Bolsonaro não deve conseguir o apoio necessário em tempo para a eleição de 2022. Atualmente, o Tribunal tem 33 partidos registrados e há outros 78 em processo de formação.

Com que roupa?

Ao falar pela primeira vez da possibilidade de ir para o PP, Bolsonaro deixou claro que quer se abrigar numa legenda que possa controlar.  “Tentei e estou tentando um partido que eu possa chamar de meu e possa, realmente, se for disputar a Presidência, ter o domínio do partido. Está difícil, quase impossível. Então, o PP passa a ser uma possibilidade de filiação nossa”.

O senador Flávio Bolsonaro, o filho do presidente responsável pelas tratativas com os partidos, se filiou ao Patriota em maio com a expectativa de organizar a legenda de acordo com os interesses do pai. No entanto, Adilson Barroso, que estava trabalhando internamente para atender a família, foi afastado da presidência do Patriota após decisão judicial.

O vice-presidente da legenda, Ovasco Resende, não aceitou a imposição de mudanças estatutárias e recorreu à Justiça. No início de julho, Barroso foi afastado de seu posto por 90 dias, prorrogáveis por mais 90.

“O presidente não quer instabilidade. Por enquanto, não estamos mais conversando sobre filiação. Na ata que eles fizeram (o grupo de Resende), a única acusação que fazem é tentar filiar o partido. Foi uma decisão ilegítima, mas não vejo mais o presidente no Patriota”, afirmou Barroso à CNN.

Mesmo com o revés judicial, o Patriota ainda era a primeira opção. Mas o cenário mudou completamente com Nogueira, do PP, como ministro. A intenção do PP era aumentar sua bancada nas eleições de 2022. Agora e com uma possível filiação do presidente, o Progressistas fica mais perto de seu objetivo. A filiação, no entanto, tem alguns desafios. Na Bahia, por exemplo, o partido é aliado ao PT. As alianças regionais teriam de ser revisadas.

À CNN, Nogueira afirmou que ainda não há nada definido, mas confirmou que há conversas sobre o assunto. Além do Progressistas e do Patriota, o PTB e o PMB também estavam entre as legendas que discutiram receber a filiação de Bolsonaro.

Histórico de filiação partidária de Jair Bolsonaro
Foto: CNN

Para participar de uma eleição, um partido político deve ter seu registro aprovado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) até seis meses antes do pleito. A criação de uma legenda é um processo longo e repleto de exigências legais, o que leva muitas siglas a ficarem pelo meio do caminho.

O processo de formação de partido é regulamentado pela Resolução do  TSE nº 23.571/2018 e pela Lei nº 9.096/1995 (Lei dos Partidos Políticos). O primeiro passo é a elaboração do programa e do estatuto da agremiação pelos fundadores, que devem ser, no mínimo, 101 eleitores sem pendências na Justiça Eleitoral e de domicílio eleitoral em pelo menos nove unidades da Federação (um terço dos estados brasileiros).

Em seguida, o partido deve ser registrado no Cartório de Registro Civil de Brasília e obter um número de inscrição no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ). Após esse registro, começa a etapa mais difícil: obter o número mínimo de eleitores que é calculado de acordo com o número de votos válidos dados na última eleição para a Câmara dos Deputados –  pelo menos, 0,5% dos votos, não computados os brancos e nulos. Até 2022, esse número é de 491.967 assinaturas, distribuídas em pelo menos nove estados.

Com a pandemia, em outubro de 2020, o TSE autorizou assinaturas digitais para o processo. Mesmo assim, todas são conferidas uma por uma. E muitas são descartadas por algum tipo de irregularidade. Essa costuma ser a etapa mais difícil e demorada de criação de um partido e precisa ser completada em dois anos.

A última etapa consiste no processo de Registro de Partido Político (RPP), que envolve a inscrição nos Tribunais Regionais Eleitorais nos estados e o registro do estatuto e do órgão de direção nacional no Tribunal Superior Eleitoral.

Segundo o TSE, todo esse processo serve para “materializar o caráter nacional da nova sigla e viabilizar o registro do seu estatuto – documento que disciplina as normas internas relativas ao funcionamento, à administração e ao patrimônio do partido político”.

Graziella Guiotti Testa, doutora em Ciência Política e professora da Fundação Getúlio Vargas (FGV),  ressalta que os critérios estabelecidos pelo TSE para criação de novos partidos foram justamente para tentar restringir o número de legendas.

“É interessante lembrar que, mesmo com esses 78 partidos em formação registrados no TSE, é muito difícil que a maioria consiga atingir o número de assinaturas necessárias. Hoje os critérios estabelecidos pelo TSE são muito difíceis de serem atingidos. E isso foi feito justamente para restringir o número de partidos políticos”, explica.

Por que ter um partido para chamar de seu

Os partidos políticos no Brasil contam com duas fontes de recursos públicos para financiar as campanhas dos seus candidatos nas eleições: o Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), também conhecido como Fundo Eleitoral ou ainda Fundão, e o Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos, o Fundo Partidário.

O Fundo Partidário é constituído por dotações orçamentárias da União, multas, penalidades e doações. Com ele, os partidos podem pagar despesas para seu funcionamento como água, luz, salários de funcionários, assessoria jurídica, entre outros.

Para 2022, o Fundo Partidário está previsto em R$ 972 milhões, em que 5% desse valor é distribuído igualmente entre todos os partidos registrados. Os outros 95% são definidos proporcionalmente de acordo com o número de deputados federais de cada legenda.

Para isso, o partido precisa superar a cláusula de barreira.  Em 2022, a legislação estipula que a legenda tenha ao menos 2% dos votos válidos, distribuídos em pelo menos um terço das unidades da Federação, ou conseguir eleger 11 deputados federais distribuídos em nove estados. Isso explica a corrida recente por fusões entre siglas menores.

Já o Fundo Eleitoral foi criado em 2017, na minirreforma eleitoral, depois da proibição de doações de pessoas jurídicas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2015. É esse fundo, também, que obriga as siglas a reservarem, no mínimo, 30% do total recebido para financiamento das campanhas femininas. Estimado em bilhões desde seu início, tornou-se uma das principais fontes de receita para a realização das campanhas eleitorais. E motivo de polêmicas.

O valor desse fundo é decidido pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e é dividido entre os partidos políticos, que decidem como bancar suas campanhas. Nas eleições de 2018, o Fundão foi de R$ 1,7 bilhão. Em 2020, nas eleições municipais, o valor foi de R$ 2 bilhões. No dia 15 de julho, o Congresso Nacional aprovou a LDO de 2022 com um Fundo Eleitoral estimado em R$ 5,7 bilhões.

O presidente Jair Bolsonaro ameaçou vetar o valor, mas nos últimos dias vem sinalizando que vai sancionar. Ele também tem a opção de enviar ao Congresso um valor menor. Segundo estudo do Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA) divulgado recentemente, o Brasil é o país com o maior gasto anual de dinheiro público com campanhas eleitorais e partidos em um ranking com 26 países.

A pesquisa analisou dados entre 2012 e 2020 e aponta que, juntos, os partidos brasileiros recebem, em média, US$ 446 milhões por ano (R$ 2,2 bilhões) dos fundos eleitoral e partidário. Enquanto que o México, em segundo lugar no ranking, gasta US$ 307 milhões (R$ 1,5 bilhão) com seus nove partidos.

A mesma publicação mostra que – entre os 26 países analisados – o Brasil só perde em número de siglas para a Índia, que possui 36 agremiações consideradas efetivas (com assentos), embora apenas três sejam consideradas grandes. No Brasil, no período estudado, eram 24 siglas com assentos no Congresso.

Sem base fixa

Apesar do enfraquecimento dos partidos políticos perante a sociedade – o descrédito nas instituições ganhou força com o bolsonarismo – e da crise no regime democrático, as siglas ainda desempenham papel central no processo eleitoral brasileiro. São os partidos que recrutam candidatos, definem estratégias de alianças regionais e nacional, distribuem os recursos do fundo partidário e costumam garantir a governabilidade no Parlamento.

A cientista política Lara Mesquita, pesquisadora do Centro de Política e Economia do Setor Público (CEPESP) da FGV, destaca que no Brasil o modelo é o do governo de coalizão. E quem forma essa coalizão é o presidente e seu partido. Isso deixa Bolsonaro numa posição peculiar, porque não tem no Congresso um partido que lhe garanta apoio em votações relevantes.

“Ele pode conseguir apoio para votação de matérias específicas, mas nunca carimbamos, por exemplo, que o partido do presidente tem 55 deputados, então ele vai ter no mínimo 55 votos. No parlamentarismo, em princípio, qualquer partido pode tentar formar uma coalizão vitoriosa, qualquer grupo. No presidencialismo, não.  A coalizão é sempre formada pelo partido do presidente.”

Lara afirma que essa situação é inédita na experiência brasileira e traz uma insegurança maior. Os partidos políticos também têm a função de, coletivamente, construir um projeto de governo para disputar as eleições. “Bolsonaro já disse que ele só vai para um partido que ele possa controlar, um partido que seja dele. Ou seja, ele não quer nenhum compromisso com a vida partidária, com bandeiras partidárias. Ele simplesmente precisa se filiar a uma legenda porque a legislação exige que ele seja filiado a um partido político para concorrer à presidência”, afirma a cientista política.

Em princípio, foi esse domínio que se imaginou que ele exerceria quando Bolsonaro foi para o PSL, um partido que em 2014 tinha uma cadeira na Câmara dos Deputados, e saltou para 52 nas eleições de 2018. “O presidente se filiou a um partido nanico sem muitas características e a expectativa era que ele construísse ali uma identidade de direita, como seu partido. Mas não foi isso o que aconteceu. Agora, é inimaginável que um presidente da República não consiga constituir um partido. Um presidente que, mesmo em um momento de crise, tem um apoio muito consolidado em pelo menos 30% do eleitorado brasileiro”, diz Lara.

E o Centrão?

Um número muito baixo de partidos pode indicar um problema de representação em países grandes como o Brasil, com grupos e demandas variadas. No entanto, um número muito grande de siglas com cadeiras no Congresso pode representar maior dificuldade para o presidente formar sua base parlamentar e permitir governabilidade.

“A maior desvantagem do grande número de partidos é a dificuldade de identificação do conteúdo programático da legenda pelo eleitor. Fica difícil de se estabelecer o que cada partido representa, qual é a ideologia, o conteúdo programático. Além disso, o Brasil tem muitos partidos com representação (no Congresso). Isso dificulta a governabilidade, porque há muitos atores com poder decisório e poder de veto no processo”, explica a professora Graziella.

Nessa confusão, convencionou-se chamar de Centrão um grupo de parlamentares que pode ajudar ou atrapalhar a governabilidade, como foi visto durante o processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT). No entanto, essa denominação é equivocada, segundo Graziella.

“O nome Centrão surge no período da Constituinte para falar de um grupo que efetivamente se identificava como um grupo de centro. Hoje, é um termo mal utilizado porque não descreve parlamentares de centro, fala sobre parlamentares que têm um determinado comportamento, que pode ser fisiológico ou excessivamente localista, sem um projeto para o país.”

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