Ciro Gomes não voltou a Paris, mas Paris vive em Ciro Gomes. Em 2018, o ex-ministro zarpou para a capital francesa no segundo turno da eleição presidencial. Escolheu assistir de longe à vitória de Jair Bolsonaro (PL) sobre Fernando Haddad (PT). Seis anos depois, conforme Bernardo Mello Franco, colunista do O Globo, Ciro repete a dose sem sair do país. Desta vez, resolveu se omitir na disputa pela Prefeitura de Fortaleza.
A maior cidade do Nordeste é palco de uma eleição com contornos nacionais. Enfrentam-se o bolsonarista André Fernandes, do PL, e o lulista Evandro Leitão, do PT. O candidato de Ciro era o atual prefeito, José Sarto, do PDT. Num ano que favoreceu quem buscava a reeleição, ele amargou o terceiro lugar, com apenas 11% dos votos.
Depois da derrota, Sarto anunciou que não apoiará ninguém no segundo turno. Apesar da neutralidade do prefeito, o cirismo subiu no palanque do bolsonarismo, conforme o colunista. Dos oito vereadores eleitos pelo PDT, seis declararam voto em Fernandes. O ex-prefeito Roberto Cláudio fez o mesmo, para desgosto de antigos companheiros.
Ciro ainda não se manifestou formalmente, mas sugeriu não ver problema na aliança com a extrema direita. “Não sou nem serei puxadinho do PT”, justificou, em bate-boca com a juventude pedetista.
Os resultados do primeiro turno expuseram o declínio do ex-ministro no Ceará. Em quatro anos, o PDT viu seu número de prefeituras no estado desabar de 67 para apenas cinco. Perdeu até em Sobral, berço do clã Ferreira Gomes. O isolamento é resultado da guerra de Ciro com o PT cearense. Ressentido com Lula, ele rompeu até com o irmão, o senador Cid Gomes.
Ontem o ministro Carlos Lupi, presidente licenciado do PDT, declarou apoio a Leitão. Em recado a Ciro, disse que o partido fundado por Leonel Brizola não pode se juntar a um “filhote da ditadura”. Referia-se ao candidato do PL, investigado no Supremo por instigação aos atos golpistas do 8 de Janeiro.
Ao votar no primeiro turno, Ciro admitiu que sua importância na política cearense é “declinante”. “Tenho humildade para perceber que a minha palavra cada vez tem menos audiência no Ceará”, resignou-se. Faz sentido, mas ele ainda poderia ter alguma influência numa disputa tão apertada. A nove dias das urnas, Fernandes e Leitão estão tecnicamente empatados no Datafolha: 45% a 43%.