Prefeitos de capitais populosas, o carioca Eduardo Paes (PSD) e o recifense João Campos (PSB) compartilham semelhanças no processo eleitoral de 2024. Além de serem políticos de centro e considerados favoritos à reeleição, ambos têm “cozinhado” o PT, partido do presidente Lula da Silva (PT), que tenta ocupar o cargo de vice nas duas cidades. Os cálculos dos gestores levam em conta um horizonte mais distante, diz reportagem de Caio Sartori , do jornal Valor: 2026, quando vislumbram concorrer aos governos do Rio e de Pernambuco, respectivamente.
Para este ano, em contraponto a 2020, o PT vai buscar alianças em capitais nas quais não tem candidatos fortes. Há quatro anos, o foco era marcar posição em uma conjuntura política caracterizada pelo governo Jair Bolsonaro (PL). Com a volta ao Planalto, a prioridade é construir parcerias que deem a Lula um bom número de prefeitos aliados.
Nas cidades de Paes e Campos, um vice do partido puxaria as chapas para a esquerda, ao contrário de São Paulo, onde o PT vai colocar a petista histórica Marta Suplicy, que havia rompido com a sigla em 2015, ao lado de Guilherme Boulos (Psol). O desafio é conquistar o centro.
No Rio, Paes vive situação diferente das outras vezes em que ganhou a prefeitura – 2008, 2012 e 2020. Naquelas ocasiões, escolheu vices que não eram sucessores naturais. Dessa vez, com a provável renúncia – caso reeleito – para concorrer ao Estado em 2026, quer colocar um nome de confiança, que herdaria o controle do município daqui a dois anos.
Nesse cenário, é considerada quase impossível a possibilidade de ceder a vice para um nome do PT, que ocupa secretarias na gestão há cerca de um ano. Tampouco interessa ao prefeito, agora, alimentar esse tipo de especulação. Do lado do partido, há esperança de que uma entrada mais direta de Lula na história possa abrir caminhos. Mesmo assim, ideias como a que, segundo o jornal “O Globo”, foi ventilada pela primeira-dama Janja – de colocar a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, como vice – são pintadas como descoladas da realidade pelo entorno do prefeito e até no próprio PT, ao qual Anielle sequer está filiada.
O partido, contudo, promete ser firme na cobrança pelo posto: “Há uma tese consolidada e respaldada pela direção nacional de que o PT pleiteia a vice. Quando teve a reunião para consolidar a entrada no governo, a presidenta Gleisi [Hoffmann] disse claramente ao Eduardo que o PT estaria na aliança mediante a vice”, afirma o chefe do diretório municipal da legenda, Tiago Santana: “Se não tiver a vice, de fato vamos ter que voltar à estaca zero das conversas. Não por capricho ou coisa do tipo, mas por política e estratégia.”
Segundo o dirigente, a tese de que o PT atrapalha a chapa é falaciosa. “Em primeiro, temos o Lula e a retomada dos investimentos no Rio. Em segundo, podemos avançar para consolidar o voto da esquerda na chapa, já que tem parte considerável da esquerda que não vota no Paes. E, em terceiro, temos votos: elegemos mais deputados que a própria máquina do PSD [em 2022].”
Não é segredo de ninguém que Paes quer o deputado Pedro Paulo (PSD), principal aliado, como vice. É o caminho natural, dizem pessoas próximas, caso o favoritismo dele nas pesquisas internas se mantenha – o que faria o prefeito precisar ceder menos a outros partidos. Na pesquisa AtlasIntel de dezembro, Paes é aprovado por 54% dos cariocas.
A hipótese de vencer a eleição no primeiro turno é considerada plausível no entorno do mandatário. O principal adversário dele deve ser o deputado federal bolsonarista Alexandre Ramagem (PL). Interlocutores de Paes entendem que o nome da direita vai tentar polarizar a disputa, mas avaliam que o prefeito conseguirá escapar de armadilhas ideológicas e concentrar a eleição nas discussões sobre a cidade.
Mesmo sendo aliado fiel de Lula, o chefe da prefeitura não quer nacionalizar o pleito. Mas, apesar de parte dos movimentos recentes dele serem voltados para neutralizar a candidatura da direita – como propor internação compulsória de dependentes químicos -, Paes afagou o governo federal na área da segurança ao convidar para sua gestão Ricardo Cappelli, que vai sair da secretaria-executiva do Ministério da Justiça. O prefeito também elogia Lula sempre que pode. Ontem, chamou o presidente de “amigo do Rio” na esteira do anúncio de ajuda federal para enfrentar as enchentes.
Um plano B para a vice envolve o ex-presidente da OAB Felipe Santa Cruz, amigo de Paes que assumiu no ano passado o cargo de secretário de Governo. Com histórico político ligado à esquerda – a família fundou o PT, ele próprio foi filiado e sua gestão na Ordem enfrentou Bolsonaro -, o advogado poderia se filiar ao partido para promover uma espécie de “ganha-ganha”: a sigla recebe o cargo de vice, mas Paes não deixa de ter consigo alguém de confiança.
No Recife, o prefeito e herdeiro do clã político Arraes-Campos, João Campos, desfruta de confortável popularidade. Nas pesquisas AtlasIntel, é o mais bem avaliado do país, com 81% de aprovação. O cenário deixa o postulante à reeleição em posição tranquila para a escolha do vice, cargo demandado pelo PT. O passado recente entre petistas e o PSB em Pernambuco é belicoso, com brigas familiares entre os parentes dos ex-governadores Eduardo Campos, pai de João, e Miguel Arraes.
Assim como no Rio, escolher um vice do PT poderia representar, para Campos e o PSB, “entregar” a prefeitura à sigla de Lula. Num outro raciocínio em curso, o prefeito continuaria no eventual segundo mandato até o fim com um vice petista e, em 2026, apoiaria um candidato do PT ao governo estadual, espaço que o PSB perdeu no ano passado para Raquel Lyra (PSDB) depois de quatro vitórias eleitorais seguidas.
Além das duas cidades, há outros casos em que o PT ainda não conseguiu a confirmação de que terá a vice de candidatos de centro. Mas, em locais como a mineira Belo Horizonte, a lógica é oposta à observada no Rio e no Recife: o prefeito Fuad Noman (PSD) quer a sigla consigo, mas os petistas tendem a alimentar mais a candidatura própria de Rogério Correia. Há otimismo entre aliados de Fuad quanto ao apoio do PT.