A Comissão de Agricultura e Política Rural da Assemblei Legislativa da Bahia (AL-BA) promoveu, na manhã desta terça-feira (5), concorrida audiência pública em conjunto com a Comissão de Saúde e Saneamento sobre o PL 24.938, de autoria do deputado Hilton Coelho (Psol), que proíbe a pulverização aérea de agrotóxicos na Bahia. O assunto é polêmico e tido como um dos mais importantes abordados pelo colegiado, e reuniu o secretário Estadual de Agricultura, Wallace Tum, entidades públicas gestoras e de pesquisa, além de técnicos, ambientalistas e parlamentares.
O secretário Tum informou que seu papel na audiência pública foi o de ouvir e debater. É preciso haver tecnologia, mas sem abrir mão da saúde e da preservação do meio ambiente, disse, ao revelar a opinião de que o agronegócio e a agroecologia podem “ser harmônicos”. Presidente do colegiado, Manoel Rocha (UB) é contrário à proposição, assim como o deputado Leandro de Jesus (PL), presidente da Comissão de Saúde. Rocha, entretanto, destacou que a ALBA é a Casa do contraditório e do diálogo e, portanto, a Comissão de Agricultura não poderia deixar de fora o debate proposto pelo projeto de lei. Defendeu a tecnologia aplicada na agropecuária que é “regulamentada, fiscalizada e traz produtividade ao setor”, gerando emprego e renda e queda nos preços dos alimentos.
Leandro de Jesus advertiu sobre os riscos de desabastecimento e de aumento dos preços caso a produtividade da agropecuária despenque com a falta do uso de defensivos agrícolas. Para ele, se o projeto que proíbe a pulverização for aprovado, será “um retrocesso, um atraso”. Como presidente da Comissão de Saúde, adiantou, fará “de tudo” para que a proposição não avance.
Painéis
A audiência pública foi composta por três painéis. O primeiro deles com palestrantes defendendo posição contrária e favorável ao projeto de lei; o segundo com falas de ambientalistas e o terceiro com o posicionamento dos parlamentares presentes aos debates. No primeiro painel, a promotora Pública Luciana Khoury, do Fórum Baiano de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos, abriu sua fala denunciando que no Brasil ainda estão em uso defensivos agrícolas banidos pela União Europeia.
Ela afirmou que eles causam danos indiscriminados. Prejudicam a saúde humana, o ar, a água, incluindo a flora, e agora também as abelhas. Os impactos negativos dos agrotóxicos são pouco conhecidos e debatidos, e, quando chegam à promotoria, já se encontram em fase de reparação de danos. Há, ainda, um agravante, relatou: a dificuldade nos diagnósticos. Os profissionais de saúde, segundo ela, não estão acostumados com os sintomas de doenças, internas e de pele, provocadas pelo uso dos defensivos, o que agrava a situação.
“Cada agrotóxico produz um dano”, assegurou, ao revelar que os limites de tolerância praticados no Brasil são muito maiores do que os praticados no resto do mundo, o que coloca a população em risco ainda maior. Conforme relato da promotora, em uma fiscalização realizada no Estado, em todos os supermercados, sem exceção, foram encontrados alimentos com resíduos danosos de agrotóxico. Falta também fiscalização estatal, criticou, ao citar, por exemplo, que o Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema) não analisa a água, que sofre grave contaminação pela pulverização aérea. Outro exemplo citado por Khoury foi a região de Irecê, onde dos 15 agrotóxicos utilizados, somente cinco são monitorados.
Segurança
Um dos palestrantes que discursou a favor dos defensivos agrícolas foi J.O. Memlen, professor e integrante do Conselho Superior do Agronegócio. Com “50 anos de experiência”, ele discorreu sobre a segurança dos defensivos agrícolas em uso no país e alertou que as doenças e pragas são responsáveis pela redução de 40% da produtividade do setor. Em condições tropicais, as medidas de controle dessas pragas têm que ser mais intensas, disse, citando o exemplo ocorrido em Mato Grosso, onde uma doença abateu 30% da produção e causou prejuízo de um bilhão de reais. Com o uso dos defensivos, revelou, para cada real gasto com o agrotóxico, o produtor ganha quatro.
Para ele, a legislação brasileira está “velha”, precisa de ajustes, “mas é muito bem feita” e uma das melhores do mundo. Ainda de acordo com o professor, o desenvolvimento dos defensivos exige 10 anos de pesquisas, e os estudos toxicológicos e ambientais estão cada vez mais eficazes. São gastos, para cada produto, R$ 256 milhões e os novos defensivos “estão cada vez melhores”.
Autor da proposição, o deputado Hilton Coelho acha o contrário. “É veneno”, disse, “para matar praga, mas veneno”. Ao defender sua proposição e elogiar a audiência pública como o início de um grande debate que precisa acontecer sobre o tema, o parlamentar denunciou que 49% dos agrotóxicos em uso no Brasil causam problemas extremos; 10% causam câncer, segundo a Organização Mundial de Saúde e, em áreas onde houve pulverização, os lavradores apresentaram seis vezes mais câncer do que outros não expostos aos agrotóxicos.
Ainda de acordo com Coelho, estudos promovidos pela professora Larissa Bombardi, do laboratório de geografia agrária da Universidade de São Paulo, apontam que o uso de pesticidas causa doenças mentais, infertilidade e câncer. Ele também informou que, nas áreas bombardeadas, apenas 32% dos defensivos atingem o solo. Os outros 62% são disseminados pelo ar e para a água.
Também integrante da mesa dos trabalhos, ao lado de Manoel Rocha; Ricardo Rodrigues (PSD) vice-presidente da Comissão de Agricultura; Hilton Coelho e do secretário Tum, a deputada Neusa Cadore (PT), coordenadora da Frente Parlamentar Mista Ambientalista e em Defesa de Territórios dos Povos e Comunidades Tradicionais, também se mostrou contrária ao método de pulverização. Citando dados da OMS, ela informou que 193 mil pessoas morrem anualmente no mundo vítimas dos agrotóxicos, e que 30% dos “venenos” usados no Brasil são condenados. Aqui, continuou, “se tolera veneno na água”, numa proporção de 5 mil vezes maior do que o aceitável na União Europeia. Ela defende a “tecnologia em favor da vida”.