A água que dá vida, o desmatamento na região do cerrado, a grilagem de terras e o agravamento das mudanças climáticas dominaram os debates da audiência pública “As Águas do Oeste e seus Múltiplos Usos e Impactos”, realizada nesta última segunda-feira (10), na Sala José Amando, pela Comissão de Direitos Humanos e Segurança Pública da Assembleia Legislativa da Bahia (AL-BA). “Esta reunião é fruto da demanda de diversos movimentos populares da Região Oeste, como as comunidades de fundo e fecho de pasto, comunidades atingidas por barragens e outros povos que estão diretamente impactados pelo agronegócio no cerrado baiano”, explicou o deputado Hilton Coelho (Psol), proponente da reunião.
Citando o último Mapeamento Anual do Uso e Cobertura da Terra no Brasil, o Mapbiomas, do Observatório do Clima, o parlamentar disse que o agro respondeu por 97% do desmatamento do Brasil nos últimos cinco anos, sendo o município de São Desidério, na Bahia, o que mais desmatou, com mais de 40 mil hectares devastados. O deputado lembrou ainda que a região de São Desidério é responsável pela grande parte da disponibilidade de água nos rios que alimentam a Bacia do Rio São Francisco e mostrou sua preocupação com a violência institucional contra os povos da região, seja na gestão ilegal de licenças de desmatamento, bem como na concessão das outorgas hídricas. “O cerrado hoje é um bioma ambientalmente comprometido por agrotóxicos. Esses agrovenenos estão sendo encontrados em altas concentrações nos animais, nos corpos dos moradores vizinhos das monoculturas e, o que é mais preocupante, também na água”, afirmou o deputado, referindo-se aos estudos da respeitada geógrafa Larissa Lombardi.
Conflitos
A professora da Universidade Federal do Oeste da Bahia, Samara Fernanda, fez uma palestra sobre o “Uso e Cobertura do Solo e Precipitação no Regime das Vazões da Bacia do Rio Grande”. A pesquisadora falou sobre as características físicas e geológicas da bacia, o aumento da temperatura a partir das mudanças climáticas e a expansão da agricultura irrigada na região. Marcos Rogério Beltrão, do Movimento Ambientalista Grande Sertão Veredas, relatou a luta pela preservação do cerrado por parte dos povos que vivem da agricultura familiar, abordando os conflitos socioambientais na Bacia do Rio Corrente. Ele criticou o reflorestamento em décadas passadas, denunciou a grilagem de terras e a construção dos chamados “piscinões”, assegurando que só beneficia grandes produtores rurais. Ele elogiou o atual chefe do Poder Executivo estadual, Jerônimo Rodrigues, que, no ano passado, pela primeira vez, recebeu uma comissão de posse, da região de Correntina, para discutir a problemática da questão da água.
Criado em 2012, o Fórum Baiano de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos conta atualmente com 38 entidades filiadas. No seu pronunciamento, Cláudio Mascarenhas, coordenador da FBCA, comentou sobre o combate aos impactos dos Agrotóxicos, Transgênicos e pela Agroecologia, destacando a Fiscalização Preventiva Integrada, com ações de fiscalização e diagnóstico que visam uma maior educação ambiental. O geógrafo Maciel Viana garantiu que os rios do oeste baiano (Grande, Corrente e Carinhanha), todos afluentes do Rio São Francisco, estão sendo atingidos diretamente pelo desmatamento, outorgas de água, uso de agrotóxicos e também pelas pequenas centrais hidrelétricas que estão sendo construídas. O professor da Ufob esclareceu que quanto mais se desmata, mais o solo fica exposto e, por consequência, a água deixa de infiltrar e passa a escoar superficialmente. “O primeiro passo para mudar essa realidade é não autorizar mais desmatamento no cerrado e começar a reflorestar as áreas de recargas do aquífero para que mantenham a perenidade dos rios durante o período de seca”, resumiu.
Sustentável
Welton Rocha, chefe de gabinete do Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos da Bahia, mencionou as diversas ações do órgão com relação a procedimentos sobre a legislação ambiental. O representante do Inema apontou a necessidade da meta “Desmatamento Zero”, considerando que se deve evoluir para essa questão, já que não se pode continuar movimentando e operando esse sistema socioeconômico atual, porque não é sustentável. “O que foi colocado aqui, nesta audiência pública, temos a certeza de que vamos ter essas representações, que o deputado vai fazer aos nossos órgãos, para que a gente possa acelerar a revisão de atos e até de leis, no sentido de haver uma diminuição desse processo”, pontuou Welton, que veio acompanhado dos diretores do Inema, Antônio Martins e Eduardo Topázio.
O engenheiro agrônomo Ivanildo Corte, da Agência 10Envolvimento; o ambientalista Renato Cunha, do Grupo Gambá; a professora e administradora de empresas, Acácia Roberta, da Comunidade do Rio Grande de São Desidério; a liderança popular Denízia Rodrigues, da Comunidade de Morrão de São Desidério; e o representante do Movimento Atingidos pelas Barragens, Timóteo Gomes também participaram das discussões, contribuindo com denúncias e sugestões. No final da audiência, o deputado Hilton Coelho agradeceu a presença dos convidados, assumindo o compromisso de se manter na luta em defesa das águas do oeste e da manutenção dos modos de vida das comunidades tradicionais da região, “que são as guardiãs desse bioma que é o coração do Brasil”.