Pesquisadoras francesas decifraram segundo Luisa Costa, da revista Super, o código de uma carta escrita em fevereiro de 1547 pelo governante mais poderoso da Europa na época: Carlos V, imperador do Sacro Império Romano entre 1519 e 1556. A equipe ainda não publicou uma tradução completa, mas revelou o conteúdo da carta – que inclui uma suspeita de assassinato.
Carlos V enviou o manuscrito a Jean de Saint-Mauris, seu embaixador na corte real francesa. O imperador havia se envolvido na Guerra Italiana contra o rei Francisco I, da França, 20 anos antes. O conflito já estava resolvido, mas a desconfiança entre eles prevalecia. Para completar, dois grandes eventos políticos tinham acabado de acontecer: a morte do rei inglês Henrique VIII e uma rebelião protestante na Alemanha.
Na carta, o imperador pede que Saint-Mauris o mantenha a par dos rumores que circulavam na corte francesa sobre esses eventos. Ele tinha medo que franceses e ingleses estivessem se unindo para apoiar a rebelião – mas não só. Carlos V também escreve sobre um boato de ele seria alvo de tentativa de assassinato por um mercenário italiano. A missão do embaixador é descobrir se a ameaça é verdadeira – ou se tudo não passa de fofoca. (Spoiler: o imperador não foi assassinado.)
Como era o código
A carta de 1457 tem três páginas e 70 linhas de texto. Até então, o conteúdo era um mistério – a única parte compreensível era a assinatura de Carlos V. O imperador usou um código com 120 símbolos, mas há também três trechos escritos em francês comum.
Cecile Pierrot, pesquisadora do instituto francês Loria, encontrou dois grupos de símbolos que substituíam as letras comuns: símbolos simples e símbolos complexos, que aparecem nas duas primeiras fileiras da imagem abaixo. As vogais também poderiam aparecer como sinais diacríticos junto das consoantes – algo que o imperador provavelmente emprestou da escrita árabe.
A maioria dos símbolos representava letras ou combinações de letras (como MM, UV ou QU). Mas havia também sinais para conjuntos de palavras. Um símbolo parecido com uma agulha, por exemplo, significava “rei da inglaterra” – roy d’Angleterre, em francês na imagem acima. Logo abaixo estão os símbolos para “rei da Boêmia” e “rei da França”.
Para tornar ainda mais difícil que alguém decifrasse o conteúdo da carta, o imperador espalhava símbolos que não significavam nada e economizava na letra E. Esta é a letra mais comum do francês, e seria a primeira a ser procurada por quem tentasse descobrir a mensagem.
A historiadora Camille Desenclos indicou à equipe de Pierrot outras cartas codificadas que o imperador Carlos V trocou com o embaixador. Em uma delas, o destinatário rabiscou uma tradução na margem – o que ajudou os pesquisadores a decifrarem o código. Agora, eles esperam traduzir outros textos do poderoso governante.