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A proposta da cidade é que todas as pessoas, edifícios e veículos possam se comunicar uns com os outros por meio de dados em tempo real e sensores incorporados / Foto: Reprodução
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terça-feira 19 de setembro de 2023 às 19:07h

Cidades têm janela de oportunidade para ficarem inteligentes

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O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que prevê injetar R$ 1,7 trilhão em mais de 12,5 mil projetos em todas as regiões do país, é visto por especialistas em gestão pública e urbanistas como a abertura de uma janela de oportunidade para que municípios brasileiros acelerem o processo de transformação a caminho do que tem sido chamado de “cidades inteligentes”. Segundo Rafael Vazquez , do jornal Valor, esse conceito é usado internacionalmente como norteador para a digitalização das cidades e a melhoria de serviços para os habitantes. O obstáculo, porém, é a capacidade técnica das prefeituras de aproveitarem o momento.

“O lançamento do PAC tende a trazer investimentos significativos ao trabalhar a ideia de cidades sustentáveis e resilientes”, afirma Sergio Andrade, diretor-executivo da ONG Agenda Pública, que assessora governos a promoverem e medirem a qualidade dos serviços públicos. Ele cita que o tema já havia ganhado corpo com a elaboração da Carta Brasileira para Cidades inteligentes, lançada em 2021 pelo então Ministério do Desenvolvimento Regional do governo Bolsonaro e que contou com a colaboração de 126 instituições de natureza pública e privada.

De acordo com especialistas, o PAC, lançado em 2007 no segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foi marcado por projetos mal concebidos, obras inacabadas, corrupção e desperdício do dinheiro público.

Agora, com o chamado PAC 3, Andrade vê a possibilidade de que a ideia comece a sair do papel para ser executada mais rapidamente. A premissa da nova edição do programa é ter investimento majoritariamente privado, o que agrada empresas e especialistas, mas traz incertezas em questões como fontes de financiamento e regulação.

“É um incentivo para replanejar as cidades com novas políticas de desenvolvimento econômico”, diz. “É sempre bom abraçar as janelas de oportunidade quando elas aparecem, ainda mais prefeitos que têm na digitalização e na mobilidade urbana como um grande tema.”

Contudo, especialistas do tema têm se esforçado para esclarecer que cidades inteligentes não necessariamente são espaços urbanos ultradigitalizados com tecnologias de ponta por todos os lados. “A gente vem tentando desmistificar isso há alguns anos e os prefeitos estão começando a entender. Isso é importante”, comenta Willian Rigon, geógrafo e diretor da Necta, consultoria na qual é o pesquisador responsável pelo ranking Connected Smart Cities.

Rigon explica que, nove anos atrás, quando o ranking começou a ser feito para mapear 680 municípios brasileiros com mais de 50 mil habitantes e descobrir as cidades mais inteligentes e conectadas, o assunto era muito focado na tecnologia, mas atualmente há uma compreensão cada vez melhor de que o conceito gira em torno da qualidade de vida dos moradores.

“Uma transformação digital feita pelo governo ajuda a cidade a ser mais eficiente, menos burocrática. Esse um ponto importante para o indicador de governança. Mas ter acesso a água tratada, por exemplo, gera qualidade de vida. Empregar tecnologia como ferramenta é interessante, mas não é isso que determina se uma cidade é inteligente”, diz Rigon. “Até porque existe um monte de tecnologia mal empregada. Uma cidade que compra um sistema de semáforo eletrônico sem ter tráfego lento investiu mal. Contratar serviços digitais para estudantes sem ter infraestrutura adequada para a conectividade nas escolas é outro exemplo de investimento ruim.”

O geógrafo explica que o ranking Connected Smart Cities, que na edição de 2022 foi liderado por Curitiba, Florianópolis e São Paulo, busca entender quais são as cidades mais inteligentes do país a partir de 74 indicadores e 11 eixos como governança, tecnologia e inovação, urbanismo e mobilidade. As três tiveram as melhores notas, no conjunto, mas na prática ainda estão distantes de serem cidades realmente inteligentes porque ainda apresentam falhas em pontos fundamentais relacionados ao bem-estar geral dos habitantes.

“Fazemos análise para entender quais são as mais inteligentes da nossa realidade. Mas, hoje, podemos dizer que nenhuma cidade brasileira é inteligente porque nenhuma atingiu o nível máximo de todos os 11 eixos”, pondera Rigon.

Hoje, podemos dizer que nenhuma cidade brasileira é inteligente”
Willian Rigon

Segundo o presidente do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de São Paulo (Crea-SP), Vinicius Marchese, o primeiro passo para uma cidade se tornar inteligente é entender a sua própria vocação – geográfica e econômica. Porém, o maior desafio apontado é a capacitação técnica dos funcionários das secretarias.

“Um dos grandes problemas, mesmo no Estado de São Paulo é material humano, corpo técnico para desenvolver projetos para que as prefeituras consigam resolver os problemas das cidades”, observa Marchese, que tem liderado iniciativas no Crea-SP para orientar tanto técnicos quanto prefeitos, secretários e inclusive vereadores sobre o tema. “O caminho para que as cidades sejam efetivamente inteligentes passa pela necessidade de preparação dos servidores e dos gestores públicos.”

Em termos de modelos e estratégias, existe consenso de que Parcerias Público Privadas (PPPs) são soluções interessantes transformar cidades inteligentes, principalmente em municípios com orçamentos menores. Por outro lado, Andrade aponta o PAC coloca o Estado no papel de indutor de políticas públicas e permite que as gestões locais avaliem quando vale a pena comprar soluções tecnológicas oferecidas por startups ou mesmo quando é benéfico entregar a execução de serviços públicos a empresas privadas. “É preciso tirar a ideia de que basta vender equipamentos tecnológicos para as cidades. O que estamos falando é mais do que isso.”

Na visão do urbanista Nabil Bonduki, mais além do vetor tecnológico, cidades consideradas inteligentes têm olhado cada vez mais para públicos específicos da sociedade, como crianças, idosos e deficientes físicos, além das mulheres, para promover mudanças urbanísticas que melhoram a qualidade de vida de todos.

“Ter essa atenção naturalmente leva os gestores a irem atrás de soluções para questões como segurança, iluminação pública. Cidades com esse olhar vão ficando mais amigáveis no sentido de dar mais tempo para as pessoas atravessarem a rua, têm mais passarelas e uma série de adaptações para pessoas em certo sentido mais vulneráveis, mas que favorecem todo mundo”, diz Bonduki.

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