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quarta-feira 14 de fevereiro de 2024 às 10:08h

China é único gigante em que comércio brasileiro ganha espaço

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Apesar dos recordes de exportação e superávit em 2023, o Brasil, exceto para a China, ainda é pequeno fornecedor quando se consideram os dez maiores importadores do mundo. Nesse grupo de países, somente na China o Brasil tem lugar entre as dez maiores origens de importações. No restante está da 14ª posição para baixo. E em 2023 só subiu no ranking dos maiores exportadores em três dos dez maiores importadores globais: China, Japão e Reino Unido. Na China, subiu do nono ao sétimo lugar. Em quatro dos dez destinos – Estados Unidos, o maior importador do mundo, Coreia do Sul, Índia e Itália – os produtos brasileiros perderam posição, mostra reportagem de Marta Watanabe e Álvaro Fagundes , do jornal Valor.

Os dados sobre a posição brasileira nos destinos são do governo ou de agências de estatísticas dos respectivos países. Foi considerado o ranking dos maiores importadores em 2022. Segundo dados do governo chinês, o país asiático comprou em 2023 do Brasil o total de US$ 122,4 bilhões, valor 11,8% superior ao de 2022. A importação total da China caiu 5,9% em igual período. Como resultado, a fatia brasileira no total dos desembarques chineses subiu de 4% para 4,8%. A China é o segundo maior importador do mundo. Há dez anos a fatia brasileira nos desembarques chineses era de 2,8%.

Na venda aos americanos, o Brasil perdeu uma posição e caiu para o 18º na lista de maiores fornecedores. A fatia de participação dos produtos brasileiros na importação dos EUA ficou estável, em 1,2%.

José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), diz que o quadro resulta da concentração da exportação brasileira, cujo principal destino é a China. No ano passado, segundo dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex), os chineses absorveram 30,7% de tudo o que o Brasil exportou. Os Estados Unidos, segundo maior destino dos embarques brasileiros, ficaram bem atrás, com 10,9%.

O superávit do ano passado, ressalta Castro, foi em grande parte resultado da queda da importação brasileira, o que aconteceu não somente na balança total como também nas trocas sino-brasileiras. Em termos de saldos comerciais, lembra, a China teve papel importante. Segundo a Secex, o comércio com os chineses rendeu em 2023 superávit de US$ 51,2 bilhões, o que contribuiu para o saldo positivo comercial recorde na balança total brasileira, de US$ 98,9 bilhões. Com os EUA, o Brasil teve déficit de US$ 1 bilhão.

No nearshoring dos EUA, Brasil deve ficar apenas com rebarba”
— Livio Ribeiro

Dados do governo americano mostram que em 2023 a China perdeu a posição de maior fornecedora aos Estados Unidos, posto ocupado pelo México. Para Livio Ribeiro, sócio da BRCG e pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), isso resultou de um movimento de nearshoring dos EUA e deve trazer poucas chances para maior avanço do Brasil no mercado americano. “O espaço deixado pela China tende a ser preenchido por México e Canadá, parceiros mais tradicionais dos EUA. Pegaremos somente a rebarba.”

“O quadro da posição brasileira nos diversos mercados reflete fundamentalmente as vantagens comparativas do Brasil”, diz Silvio Campos Neto, economista da Tendências. “Não crescemos muito nas importações de outros países porque eles demandam produtos nos quais não somos competitivos. O Brasil cresce na importação dos chineses porque eles são grandes demandantes de produtos nos quais somos bem competitivos, como minério de ferro, petróleo, grãos e carnes.” Segundo a Secex, os chineses compraram 73% de toda soja que o Brasil exportou em 2023, além de 64% do minério de ferro e de 47% do petróleo bruto. Os três itens somam 75% do valor que o Brasil vende ao país asiático.

Ribeiro, do Ibre, lembra que não somente o que é vendido para a China, mas a pauta da exportação total brasileira também é concentrada. O trio dos produtos mais embarcados pelo Brasil, que são exatamente soja, petróleo bruto e minério de ferro, responderam por 37,2% da exportação brasileira em 2023, segundo dados da Secex. Se a lista for expandida aos cinco produtos mais exportados, incluindo açúcar e milho, a fatia sobe a 45,9%. “Então nossa exportação tende a ser concentrada para qualquer lugar. Não vejo isso como um problema. É uma característica da nossa pauta de exportação.”

Rafael Cagnin, economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), lembra que os diversos choques desde 2021 resultaram em alta de cotações de commodities, que também devem ter favorecido o ganho de participação do Brasil no mercado chinês em 2021 e 2022, embora tenha havido certo ajuste de preços no ano passado.

“Em outros países há demanda crescente por produtos manufaturados e serviços de alta tecnologia, mas essa exportação não é a nossa realidade, embora tenhamos algumas ilhas, como na fabricação de aeronaves”, diz Campos Neto. Para os EUA, exemplifica, a pauta de exportação é mais diversa do que para a China. “Os EUA são um grande produtor de grãos, de carnes e de petróleo e na verdade competem com o Brasil no fornecimento desses produtos no mercado global.”

A concentração da pauta exportadora traz um pouco de volatilidade, a princípio, diz Ribeiro. “Mas buscar uma pauta que não é a nossa envolve custos e nos afasta das nossas vantagens comparativas. Não temos capacidade de produção somente para commodities, mas a imensa maioria do que produzimos bem são commodities. Uma política para diversificar a pauta terá beneficiados que certamente ficarão felizes, mas não sei se o país ganha como um todo dentro do equilíbrio geral.”

“Para galgar participações maiores em mercados dinâmicos economicamente e que estão na fronteira tecnológica, como EUA, Coreia do Sul e alguns países europeus, é preciso ter uma indústria mais exportadora, com pauta mais diversificada de produtos que permita ao país se encaixar nos elos intermediários das cadeias globais de produção”, defende Cagnin. A literatura internacional, diz, mostra que o agente integrador no comércio global é a indústria, por ter cadeias produtivas mais longas.

Os dados levantados nos destinos mostram que a participação brasileira na importação da Coreia do Sul ficou parada em 1,1% em 2022 e 2023, período no qual o Brasil caiu da 21ª para a 23ª posição. Na Alemanha o Brasil ficou estagnado na fatia de 0,6% e também no mesmo posto, no 31º lugar.

Dados levantados pelo Iedi, diz Cagnin, apontam que a indústria de transformação teve melhora de saldo comercial em 2023, mas puxada pela queda de importações. Em 2023, diz Cagnin, a exportação dessa indústria caiu ou ficou estagnada em quase todas as faixas de intensidade tecnológica. Segundo ele, houve crescimento na alta tecnologia, faixa na qual está a fabricação de aeronaves, mas mesmo assim esse grupo está ainda em nível de embarques inferior ao do pré-pandemia. “O quadro geral revela falta de dinamismo exportador. Dessa forma a maior fatia em mercados com atividades mais complexas, em que a indústria é importante, fica mais difícil.”

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