Anunciado nesta última quinta-feira (22) pelo presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) como o próximo chefe da Advocacia-Geral da União (AGU), o procurador da Fazenda Nacional Jorge Messias vai ter segundo a colunista Malu Gaspar, do O Globo, que tomar decisões delicadas sobre algumas questões deixadas pela gestão de Jair Bolsonaro.
Uma das mais sensíveis diz respeito à defesa do próprio Bolsonaro em inquéritos que tramitam no Supremo Tribunal Federal (STF), além dos parlamentares que também são alvo de investigações ou de pedidos de indiciamento pela CPI da Pandemia.
Conforme lei de 1995, entre as atribuições da AGU está representar judicialmente parlamentares e ministros “quanto a atos praticados no exercício de suas atribuições constitucionais, legais ou regulamentares, no interesse público”.
Ou seja, mesmo que já tenham deixado o mandato, podem continuar a ser defendidos pela advocacia do governo, desde que os processos se refiram a assuntos relativos ao tempo em que ocupavam funções públicas.
Só que os inquéritos abertos na esteira da pandemia apuram crimes justamente contra o interesse público, como promover uso de medicamentos ineficazes contra a Covid-19 e incentivar o descumprimento de normas sanitárias.
Por causa disso, o próprio Lula disse várias vezes na campanha que iria buscar a responsabilização de Bolsonaro por atos cometidos na pandemia – a quem chamou repetidas vezes de “genocida”.
Com o fim do mandato de Bolsonaro e a perda do foro privilegiado, algumas investigações contra ele devem migrar para a primeira instância. Outras continuarão no Supremo, como o inquérito das fake news e o das milícias digitais. Nesses, inclusive, estão parlamentares ligados ao atual presidente.
A desconfiança mútua entre o atual e o futuro governo deve fazer com que o próprio Bolsonaro abra mão de ser defendido pela AGU e pedir para um advogado privado fazer a sua defesa, segundo a equipe da coluna apurou.
Mas não se sabe se todos os ex-ministros e parlamentares tomarão a mesma atitude.
Nesse caso, caberá a Messias determinar o que sua equipe deve fazer – se continua defendendo réus que considera culpados ou se abandona os processos.
Para sair da defesa, ele teria de derrubar atos de seus antecessores que autorizaram a assistência jurídica.
Segundo integrantes da AGU ouvidos pela equipe da coluna, se de fato fizer isso, Messias estará tomando uma atitude inédita – que obviamente terá consequências jurídicas.
Os bolsonaristas podem, por exemplo, entrar com ações na Justiça para obrigar que a AGU os defenda. E mesmo que esses processos não deem em nada, certamente terão repercussão política.
“Vai ser o caos”, avalia um integrante da AGU, que torce para os bolsonaristas tomarem a iniciativa de abrir mão da defesa do governo Lula.
Até hoje, o órgão nunca deixou de defender presidentes e ex-presidentes. FHC, Lula, Dilma Rousseff e Michel Temer tiveram a assistência da AGU em casos relacionados às suas administrações. Entre 2019 e 2021, mais de 50 deputados federais de diferentes matizes políticos foram defendidos pelo órgão.