A Polícia Rodoviária Federal (PRF) eliminou a disciplina sobre direitos humanos do curso que forma os novos agentes da corporação.
Todos os policiais que ingressam na PRF são obrigados a fazer o CFP (Curso de Formação de Policiais), que tem de 3 a 4 meses de duração.
No programa pedagógico atual foi informado que “a disciplina de Direitos Humanos e Integridade – DHI teve a carga horária suprimida. Segundo a BBC News, os encontros presenciais foram suprimidos e temáticas abordadas em sala serão trabalhadas de maneira transversal por todas as demais disciplinas”.
A carga horária (ver abaixo) apresentada no programa pedagógico também não prevê aulas virtuais sobre a temática.
A abordagem de direitos humanos na formação dos policiais agora entra em uma oficina transdisciplinar chamada Práticas Orientadas para o Trabalho.
Mas o documento do curso introdutório cita que é competência dos agentes “atuar na vida profissional e pessoal para promoção dos direitos humanos fundamentado nas diretrizes internacionais”.
O conteúdo sobre direitos humanos já chegou a ter uma carga horária equivalente a 30 horas nas aulas de formação, segundo agentes da PRF.
Eram abordados temas como proteção de crianças e adolescentes, violência sexual, trabalho infantil, tráfico de pessoas, machismo dentro da corporação e também brutalidade policial.
Essa edição mais recente do curso de formação, por sinal, destaca em sua apresentação que foram introduzidas ao longo da história da PRF disciplinas como “uso legal e progressivo da força” e “direitos humanos com enfoque no trabalho policial”.
O documento menciona ainda que em 2009 a instituição ganhou um prêmio na área após o trabalho contra o tráfico de pessoas. A PRF teve também, no âmbito de direitos humanos, um trabalho de mapeamento de pontos de exploração sexual infantil com reconhecimento da ONU.
De acordo com Fabrício Rosa, doutorando em Direitos Humanos da Universidade Federal de Goiás (UFG) e diretor da Rede Nacional de Operadores de Segurança Pública LGBTI+, “nos últimos quatro anos tem havido uma diminuição gradual do conteúdo relacionado a direitos humanos, com fusão de disciplinas, no curso de formação dos agentes da PRF”.
No começo de maio, uma outra medida, uma portaria assinada pelo diretor-geral da PRF, Silvinei Vasques, revogou o funcionamento e as competências de Comissões de Direitos Humanos dentro da polícia rodoviária.
Essas comissões também tinham o papel de orientação educacional dos agentes a respeito do tema.
A BBC News Brasil entrou em contato com a Polícia Rodoviária Federal para questionar sobre a retirada da disciplina e como são realizadas orientações para abordagem policial, mas não obteve resposta. Se ela chegar, será acrescentada à reportagem.
Morte de Genivaldo
Na quarta-feira (25/05), agentes da PRF colocaram Genivaldo de Jesus Santos, de 38 anos, em um porta-malas de uma viatura na cidade de Umbaúba, interior de Sergipe, e atiraram bombas de gás lacrimogêneo e spray de pimenta dentro.
Ele morreu com sinais de asfixia, segundo laudo preliminar do IML (Instituto Médico Legal).
Nos vídeos que circulam nas redes sociais, a pessoa que filmava avisa os policiais que o homem sofria de transtornos mentais — ao portal G1, sua esposa, Maria Fabiana, afirmou que ele tinha esquizofrenia.
A Polícia Rodoviária Federal emitiu nota informando que “está comprometida com a apuração inequívoca das circunstâncias relativas à ocorrência” e “os agentes envolvidos foram afastados das atividades de policiamento”.
Em um primeiro momento, a instituição divulgou comunicado sobre a morte de Genivaldo dizendo que “foram empregadas técnicas de imobilização e instrumentos de menor potencial ofensivo para sua contenção”.
Mais de 600 candidatos aprovados no concurso da PRF tiveram a nomeação autorizada na última quarta em decreto do presidente Jair Bolsonaro (PL). Eles terão de passar pelo curso introdutório.
Para Ariel de Castro Alves, advogado e especialista em direitos humanos e segurança pública, a eliminação de conteúdo de direitos humanos da formação na PRF “demonstra que ocorrências como essa, de tortura e assassinato, são premeditadas e planejadas pela instituição”.
“As aulas de direitos humanos na formação dos agentes colaboraria para prevenir essas situações e levantam discussões sobre as verdadeiras causas da violência e da exclusão social.”