A entrada explícita da campanha eleitoral em templos evangélicos, como o jornal O Globo mostrou, tem causado, em alguns casos, reação de fiéis ao chamado “voto de cajado” e já motivou até briga com violência política. Falas de pastores e líderes religiosos pedindo que frequentadores votem e elejam candidatos que, segundo eles, seguem os direcionamentos de Deus têm motivado migração e saída de evangélicos para congregações apartidárias. O cenário de violência motivou manifestações de preocupação entre a classe religiosa.
Na última quarta-feira, o assessor empresarial Davi Augusto de Souza, de 40 anos, foi baleado pelo policial militar Vitor da Silva Lopes, de 37, durante uma discussão por motivação política, na Congregação Cristã no Brasil, em Goiânia. Souza levou um tiro na perna e seu estado de saúde é estável.
A briga começou após uma pregação do pastor Djalma Pereira Faustino, que pedia para os fiéis não votarem “em vermelhos”, em referência aos partidos de esquerda. Souza e outros frequentadores da congregação ficaram indignados. A Polícia Civil informou a O Globo que o caso está sendo investigado pela 21°DP de Goiânia e que, até o momento, segue fazendo diligências para apurar “toda a dinâmica e responsabilidades do fato, mas que não pretende se manifestar com detalhes para não causar prejuízo à investigação”.
O pastor Djalma Pereira, afastado de suas atividades por decisão do conselho da igreja, ainda não prestou depoimento. Já o policial Vitor da Silva, autor dos disparos, compareceu à delegacia na sexta-feira passada.
No mesmo dia, um vídeo compartilhado por um internauta no Twitter mostra o ex-ministro Marcos Pontes, candidato ao Senado pelo PL de São Paulo, pedindo voto durante a celebração do culto no Colégio Batista Brasileiro, em São Paulo. Na ocasião, o candidato, apoiado por Jair Bolsonaro, mal concluiu sua fala quando foi interrompido pelo fiel:
“Tá errado isso aqui. Tá errado! Isso aqui é a casa do Senhor. Isso aqui não é lugar de política. Vocês estão todos errados. Eu vim aqui emprestar minha voz ao culto. Eu não vim aqui fazer isso”, disse.
A situação deixou o candidato e o pastor desconfortáveis. O vídeo mostra o desapontamento de Pontes, cuja apresentação havia sido autorizada por um dos pastores que comandaram o culto:
— Todos candidatos a uma função pública digam só o seu nome e o cargo que pretende — disse o religioso, sem imaginar que nem todos entre os fiéis concordariam com esse tipo de conduta dentro do templo.
No mesmo culto — que comemorava os 80 anos da Ordem dos Pastores Batistas de São Paulo —, Sylvio Malheiro (PTB-SP), coronel da Força Aérea Brasileira, aproveitou para anunciar que é candidato deputado federal.
“Glória a Deus por essa oportunidade de estar aqui entre irmãos. Sou candidato a deputado federal”.
A liberação do pedido de voto autorizado pelo pastor no Colégio Batista Brasileiro foi semelhante à que ocorreu em dezembro, na Igreja Batista de Água Branca, uma das mais tradicionais do país, na capital paulista. Na ocasião, a autorização foi dada pelo pastor Ed René Kivitz, líder da congregação e crítico do presidente Jair Bolsonaro (PL). O religioso foi desligado dos quadros da igreja.
No Rio, o locutor de comício Gabriel Granja disse que ele e a mulher deixaram de frequentar a Segunda Igreja Batista Bandeirantes, em Santa Cruz, há quatro meses, porque estavam sendo excluídos por lideranças e frequentadores. O local, ele conta, estava sendo usado como palanque político para promover e pedir votos a determinados candidatos, e o casal se posicionou contra congregação. Atualmente, o locutor faz parte da Igreja Batista Vila Alexandrino, também em Santa Cruz, e diz que trocou de comunidade porque não queria ser forçado a votar por orientação dos líderes religiosos.
— Eles nos intimaram a votar no Bolsonaro e falavam mal da esquerda. Eles nos olhavam torto e diziam “ou você é Bolsonaro ou você não é bem-vindo na igreja”. Eu disse que não me identificava com nenhum dos candidatos que eles queriam que a gente apoiasse. Eles começaram a excluir eu e minha esposa. Nem bom dia nos davam mais — contou Granja.