domingo 22 de dezembro de 2024
Foto: Marcos Oliveira/Ag.Senado
Home / NOTÍCIAS / Câmara dos Deputados aprova na madrugada pacote que diminui controle sobre licitações
sexta-feira 1 de dezembro de 2023 às 08:12h

Câmara dos Deputados aprova na madrugada pacote que diminui controle sobre licitações

NOTÍCIAS


O relógio marcava 0h39 da madrugada desta quinta-feira (30) e já era feriado em Brasília quando a Câmara dos Deputados aprovou um pacote de projetos que acelera o envio de verbas a redutos eleitorais e diminui o controle sobre licitações de prefeituras. As propostas são criticadas por especialistas, que apontam riscos de desvios, falta de transparência e até formação de cartéis.

Um dos projetos, apresentado pelo deputado Otto Alencar Filho (PSD-BA), permite que prefeituras embarquem em licitações de outros municípios comprando os mesmos produtos dos mesmos fornecedores sem abrir um novo procedimento. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

O modelo é chamado de ata de registro de preços e serve apenas para compras recorrentes de coisas comuns, como copos descartáveis, materiais de limpeza e alimentos. De acordo com especialistas, a prática pode contaminar as licitações nos municípios, ao estabelecer os mesmos produtos e os mesmos fornecedores para cidades que possuem realidades diferentes. Além disso, se for constatado algum problema na contratação, como superfaturamento ou direcionamento para uma única empresa, todas são impactadas.

A adesão para contratações que não são recorrentes já causou desvios de dinheiro público, como nos casos de asfalto do orçamento secreto, compra de kits de robótica e gastos com bistecas não entregues para indígenas na Amazônia.

No total, foram aprovados quatro projetos apensados em um único, o que acontece normalmente quando propostas sobre o mesmo tema são apresentadas. O pacote foi aprovado com 307 votos favoráveis, 27 contrários e uma abstenção.

O relator, deputado Elmar Nascimento (União Brasil-BA), não estava mais na Câmara e quem leu o parecer foi o deputado Domingos Sávio (PL-MG). O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), também havia deixado o local antes da deliberação. A maioria dos deputados votou remotamente, pelo celular. No momento da aprovação, a quantidade de deputados presentes no plenário não passava de 50.

“Nós não sabemos o que estamos votando. Eu não posso nem ser contra, nem a favor, porque nós não sabemos”, disse a deputada Julia Zanatta (PL-SC), que votou contra. O deputado Cabo Gilberto Silva (PL-PB) votou a favor e disse que foi “convencido” por líderes partidários de que o projeto era bom, mas criticou a votação relâmpago na madrugada. “Precisamos ter previsibilidade e saber o que estamos votando.”

O bloco da maioria, que reúne os partidos com o maior número de parlamentares, não orientou a votação. “Vou seguir a maioria e vou embora. A maioria foi embora, presidente”, disse o deputado Evair Vieira de Melo (PP-ES), provocando risos entre os colegas. Ele votou contra.

Prefeituras

O pacote deve facilitar o envio de verbas federais, incluindo as emendas parlamentares, para prefeituras em 2024, ano de eleições municipais. Prefeitos pressionam congressistas por envio mais rápido de dinheiro e entregas antes da disputa.

Outro projeto do pacote aprovado, de autoria da senadora Tereza Cristina (PP-MS), cria um regime simplificado para o envio de recursos federais a municípios que assinam convênios para receber a verba e fazer as obras.

Com a proposta, se o projeto custar até R$ 1,5 milhão, o dinheiro vai cair de uma só vez, de forma antecipada, e só depois a prefeitura vai executar o serviço. Antes, o pagamento era feito em parcelas e dependia do andamento da obra, o que gerava um controle maior, mas também reclamações de prefeitos e parlamentares em função da demora.

Além disso, se a obra custar menos do que o repasse enviado pelo governo federal, a prefeitura não terá mais que devolver o restante e poderá usar a sobra para ampliar o projeto. Por exemplo, se planejou pavimentar 20 ruas, poderá asfaltar mais cinco.

O modelo é uma resposta ao uso da emenda Pix, que também envolve o repasse direto de recursos para prefeituras, mas não é fiscalizada e tem provocado críticas de especialistas e órgãos de controle.

O regime simplificado prevê transferência direta e antecipada, mas ainda mantém a fiscalização federal com exigências técnicas como plano de trabalho, licenciamento ambiental e relatórios de acompanhamento – o que não acontece com a emenda Pix.

A adesão à emenda Pix cresceu e pode atingir R$ 12 bilhões em 2024, ano de eleição municipal, mas o uso tem incomodado alguns parlamentares, pois os prefeitos podem usar o dinheiro de qualquer maneira e muitos não gastam conforme a indicação do congressista.

Propostas sigilosas

O mesmo projeto abre uma brecha para diminuição da transparência em licitações e até a formação de cartéis. Em licitações com valores acima de R$ 1,5 milhão, empresas vão oferecer propostas de forma sigilosa para obras de engenharia, assistência técnica e serviços de limpeza urbana.

Nesse formato, chamado de modo de disputa fechado, as propostas de quem está interessado em vencer a licitação só são conhecidas no momento da divulgação e da abertura de todos os lances apresentados – o que pode facilitar a formação de conluios entre empreiteiras. O modelo já existe, e o projeto diz que, nas compras acima de R$ 1,5 milhão, essa vai ser a regra.

Para o procurador de Justiça e presidente do Instituto Não Aceito Corrupção, Roberto Livianu, o pacote traz preocupações no momento em que o valor das emendas parlamentares aumenta e a fiscalização diminui. “Os ingredientes do projeto nos mostram que a situação é gravíssima e, se tiver problema em uma licitação, o vício vai contaminar as licitações que embarcarem na mesma contratação”, disse. “Não se elimina a burocracia desrespeitando o patrimônio público. O projeto pode gerar uma concentração de mercado, que é nociva e vai na contramão do próprio princípio da licitação.”

‘Obra inacabada’

O relator do pacote, Elmar Nascimento (União-BA), afirmou no parecer que a proposta gera maior rapidez e eficiência nas compras e contratações por parte dos municípios. Agora, o texto irá à sanção ou veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “Precisamos acabar com esse negócio de obra inacabada no Brasil e de perder dinheiro público porque não se consegue concluir uma licitação adequada”, disse Domingos Sávio.

Veja também

Lula lamenta mortes após acidente com mais de 30 vítimas em estrada de Minas Gerais

O presidente Lula da Silva (PT) lamentou as mortes decorrentes de acidente envolvendo três veículos …

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

error: Content is protected !!