Michel Temer deixa o jeito sisudo de lado e surge fazendo piadas sobre mesóclises e sobre os poemas que escreveu. Um Romero Jucá sem bigode posa para uma foto com bonecos da saga Star Wars. Roseana Sarney mostra seus dotes culinários, toca violão e participa de desafios inspirados no TikTok.
Conforme a Folha de S. Paulo, a velha guarda do MDB está de cara nova nas redes sociais. Depois de frequentarem o epicentro da operação Lava Jato e amargarem derrotas nas urnas, caciques do partido trabalham para suavizar suas imagens públicas. Parte deles deve disputar novos mandatos em 2022.
O ex-presidente Michel Temer, que em um não distante 2015 mandava cartas físicas a então presidente Dilma Rousseff (PT) com expressões em latim, lançou em julho uma nova estratégia com um vídeo no qual diz que vai ser mais ativo em suas redes e convida os seus segu idores a interagirem.
Assista abaixo:
No primeiro vídeo, contudo, recorre a uma gíria dos primórdios das salas de bate pato da internet para reforçar o seu convite: “Vamos teclar”? Admite que ainda não tem “os traquejos da internet” e que está tentando se familiarizar.
Em outros vídeos, foi entrevistado pelo filho Michelzinho, falou sobre livros e filmes e organizou uma conversa com um grupo de jovens. Também apostou, de forma sutil, em um tipo de humor no qual ri de si mesmo, falando sobre mesóclises e sobre seus poemas.
Responsável pela comunicação do ex-presidente, o publicitário Elsinho Mouco afirma que o retorno de Temer às redes sociais tem como objetivo fazer o resgate do legado de seu governo e de seu perfil político marcado pela capacidade de articulação, pacificação e construção de maiorias.
“A estratégia nas redes sociais é uma só: recuperar a verdade dos fatos. Recuperar o direito do presidente Michel Temer de ter uma biografia leal ao que ele construiu. Não é o ‘Volta Temer’, é simplesmente fazer justiça a uma história de vida”, afirma Mouco.
A nova estratégia de redes foi iniciada dois anos depois de o ex-presidente ter enfrentado seu principal revés político, ao ser preso por duas vezes, em março e maio de 2019, no âmbito da operação Lava Jato.
Na época, o ex-presidente foi acusado de ter participado de supostos desvios de recursos na construção da usina nuclear Angra 3. Temer nega as acusações. No episódio da prisão, disse lamentar a “postura açodada da Justiça”.
A nova estratégia nas redes também coincide com o momento em que Temer voltou à ribalta política ao articular uma carta escrita pelo presidente Jair Bolsonaro após os protestos de raiz golpista do 7 de Setembro.
A carta foi devidamente festejada em suas redes: “Sempre que fui chamado para ajudar o país, busquei o diálogo e coloquei as instituições acima dos homens. A solução para muitos problemas que os brasileiros enfrentam está na pacificação e no entendimento”, disse o ex-presidente.
O ex-senador Romero Jucá, do MDB de Roraima, tomou o mesmo caminho e começou a repaginar sua imagem pública, o que incluiu até a retirada do bigode que mantinha há décadas.
Depois de 24 anos de mandato em que foi um dos cabeças do MDB no Senado, sendo líder dos governos FHC (PSDB), Lula (PT), Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer, Jucá foi derrotado em sua tentativa de reeleição por Roraima em meio à onda antipolítica de 2018.
Investigado pela operação Lava Jato, o ex-senador começou a perder espaço a partir de 2016, quando áudios revelados pela Folha mostraram que ele sugeriu que uma mudança no governo federal com o impeachment de Dilma resultaria em um pacto para “estancar a sangria” representada pela Lava Jato.
Após a abertura das urnas em 2018, disse que sua derrota era resultado de uma crucificação dos políticos tradicionais.
Assimilado o revés, Jucá começou a trabalhar para retomar o seu espaço político em Roraima, mantendo uma agenda entre Brasília, Boa Vista e viagens pelo interior do estado.
Seu objetivo é retornar ao Senado a partir das eleições de 2022. Para isso, deve formar chapa com a sua ex-mulher, Teresa Surita (MDB), que encerrou o mandato como prefeita de Boa Vista em 2020 com alta aprovação.
Ao mesmo tempo em que retomará as articulações políticas, Jucá mudou a sua estratégia de comunicação digital. Passou a ancorar um podcast, fazer postagens mais informais no Instagram e criou até uma conta no TikTok.
As postagens incluem fotos com cachorro, com botecos da saga Star Wars e vídeos de passeios românticos com sua mulher, Rosilene Brito. Assim como Temer, também apostou em memes e em vídeos no qual interage responde a perguntas de apoiadores mais jovens.
Governadora do Maranhão por quatro mandatos, Roseana Sarney (MDB) também trouxe mais leveza para as suas redes sociais desde o ano passado. Sem mandato desde 2014, quando deixou o governo maranhense, ela tem planos de voltar ao Congresso em 2020 como candidata a deputada federal.
Nos vídeos no Instagram, fala sobre o seu dia a dia, ensina receitas de picadinho de carne e bolinho de caranguejo e toca violão. No repertório, estão músicas como “Preta, Pretinha”, “Esse seu olhar” e “Como é grande o meu amor por você”.
Também apostou em uma estética mais jovem ao aderir a desafios típicos do TikTok. Em um deles, aparece dançando enquanto fala de realizações de seus governos. Em outro, responde a perguntas com gestos de sim e não.
O movimento foi recente. Na eleição de 2018, quando concorreu ao Governo do Maranhão e foi derrotada pelo governador Flávio Dino (PSB), Roseana fez apenas cinco postagens no Instagram entre o dia da convenção que lançou a sua candidatura até a eleição.
Procurado, Romero Jucá não quis falar com a reportagem. A Folha não conseguiu contato com a ex-governadora Roseana Sarney.
Professor de Comunicação da Universidade Federal Fluminense e pesquisador associado do INCT.DD (Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Democracia Digital), Viktor Chagas avalia que caciques emedebistas adotaram uma estratégia que traz riscos.
“O uso da linguagem dos memes parte de um caráter de espontaneidade e de interação direta e aberta nas mídias sociais. Uma campanha tomada por um aspecto profissional é incapaz de reproduzir isso. Acaba soando um pouco artificioso e pode gerar um estranhamento.”
Ele ainda destaca que esse tipo de estratégia não decola sozinha: ela carece do impulso de uma militância engajada que, de alguma maneira, consiga fazer com que essa mensagem ganhe tração e se espalhe pelas redes.
No caso de um meme, diz Chagas, não basta viralizar. É preciso que os eleitores se apropriem, incorporem e ressignifiquem a mensagem que um candidato ou ator político que transmitir. Um conjunto de interações que passam pela paródia e pelo remix, por exemplo.
Na avaliação do pesquisador, não há uma fórmula exata no uso de memes, de humor e informalidade nas campanhas. Mas, bem dosadas, estas estratégias podem ajudar a suavizar a imagem de candidatos e aproximar aqueles com mais tempo de política das novas gerações de eleitores.