Não são só os pleitos municipais e a Covid-19 que atrapalham o funcionamento do Congresso Nacional, as eleições das mesas diretoras da Câmara dos Deputados e do Senado Federal também fazem a sua parte. A cerca de quatro meses da votação interna das Casas, que ocorre em 1º de fevereiro de 2021, alguns processos seguem indefinidos, como a instalação da Comissão Mista de Orçamento, da Comissão de Constituição e Justiça e do Conselho de Ética na Câmara, que vai julgar o caso Flordelis, além da Comissão de Ética no Senado, que analisará a situação de Chico Rodrigues.
Segundo o portal Metrópoles, há expectativa de que o Supremo Tribunal Federal (STF) julgue até dezembro deste ano, antes do recesso, a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) do PTB contra a reeleição dos presidentes das Casas. O Artigo 57 da Constituição Federal veda a possibilidade de recondução. A Advocacia-Geral da União (AGU) e a Procuradoria-Geral da União (PGR) já se manifestaram dizendo que se trata de assunto interno das Casas.
Enquanto esse impasse não for resolvido na Suprema Corte, um embate não é recomendável, brincam parlamentares nos bastidores.
Dinheiro nas nádegas
Um exemplo foi a determinação do ministro Luis Roberto Barroso, do STF, de afastar o senador Chico Rodrigues (DEM-RR), flagrado escondendo dinheiro nas nádegas. Senadores se manifestaram contrariados com a decisão do ministro, que estaria, segundo eles, afrontando outro poder. Alguns cobraram posição do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), mas ele preferiu se calar.
O parlamentar também não tem se esforçado para instalar o Conselho de Ética, que julgará o correligionário. Alcolumbre disse que não poderia criar uma comissão por “conveniência de um ou outro assunto”. A solução encontrada por aliados a fim de evitar desgastes para a Casa foi pressionar Rodrigues a se afastar por 121 dias. A ideia, agora, é deixar o tempo passar.
Assim o presidente da Casa não precisou enfrentar o STF nem tomar atitude que desagrade aos seus pares neste período de articulação pela reeleição.
“Alcolumbre vai agindo e manipulando tudo conforme as conveniências dele e do DEM. Então, isso tem atrapalhado o andamento de tudo. O Conselho de Ética não funciona, jogou tudo para o ano que vem. A CMO entrou nesse imbróglio porque ele quer que vença o deputado dele, do DEM, e não a concorrente”, reclamou o senador Lasier Martins (Podemos-RS).
Orçamento
A Proposta de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) 2021 chegou ao Parlamento em 15 de abril e a Proposta de Lei Orçamentária Anual (PLOA) 2021, em 31 de agosto, mas a Comissão Mista de Orçamento ainda não foi instalada – a dois meses do final do ano. Duas sessões foram convocadas e canceladas por falta de acordo.
Nos bastidores, a avaliação dos parlamentares é a de que a instalação do colegiado é “uma prévia da eleição da Mesa”.
Ainda em abril, o Centrão indicou o nome do deputado federal Elmar Nascimento (DEM-BA) para a presidência do colegiado. Mas o tempo passou e o bloco começou a se desfazer. Em meio à aproximação do líder do bloco, Arthur Lira (PP-AL), com o governo Bolsonaro, DEM e MDB saíram, em julho.
Em setembro, quando tentaram instalar a CMO, Lira indicou a deputada Flávia Arruda (PL-DF). Não houve acordo, tampouco votação nas duas tentativas de instalação. Posteriormente, Pros e PTB deixaram o bloco e se uniram ao PSL, em outro grupo, em outubro.
Lira é pré-candidato a presidente da Câmara. O atual presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), correligionário de Elmar Nascimento, não desistiu de um novo mandato, embora negue publicamente. Uma disputa pelo comando do colegiado seria o prenúncio da eleição interna, ao menos, para os grupos de Lira e Maia.
O deputado federal Afonso Florence (PT-BA) disse que a antecipação da eleição da mesa diretora tem influenciado a falta de acordo para a instalação do colegiado. “Não houve acordo da base do governo, que está brigando entre si. O problema é a disputa das presidências da CMO e da Câmara”, afirmou.
O deputado federal Fábio Ramalho (MDB-MG) criticou a postura dos grupos que disputam a presidência do colegiado. “Não podemos ficar sem a CMO, é uma irresponsabilidade. É só colocar para instalar e ir para o voto. Quem ganhar, ganhou. Temos que ter responsabilidade, entender que o país precisa de orçamento e saber que, na democracia, ganha quem tiver mais voto”, disse.
“A eleição da mesa é no ano que vem e quem vai decidir é o plenário. Hoje precisamos que seja instalada a CMO”, acrescentou o emedebista.
Alcolumbre disse que se trata de uma comissão que só funciona por consenso e que vai tentar novamente, a partir do dia 4 de novembro, quando o Congresso Nacional tem sessão marcada. Caso consiga, o colegiado deve funcionar por cerca de 40 dias.
Candidatos
Partidos da oposição que na eleição passada ofertaram apoio a Maia sinalizaram que podem não repetir a ajuda diante dos acenos do parlamentar ao governo, caso ele consiga se viabilizar para a recondução.
Enquanto isso, alguns deputados se movimentam para a sucessão: Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), Marcelo Ramos (PL-AM), Fábio Ramalho (MDB-MG), Baleia Rossi (MDB-SP) e Marcos Pereira (Republicanos-SP).
Da mesma forma ocorre no Senado. Para minar a candidatura de Alcolumbre, dois nomes do grupo Muda Senado, que possui bandeiras lavajatistas e defende o impeachment de ministro do STF e a prisão após condenação em segunda instância, lançaram candidaturas: Major Olímpio (PSL-SP) e Jorge Kajuru (Cidadania-GO).
Cálculo político
O professor de ciência política da Universidade de Brasília (UnB) David Fleischer destaca que parlamentares evitam desgastes em momentos estratégicos com alguns atores por cálculo político. “O parlamentar tenta agradar a Deus e todo mundo e, com isso, está atrapalhando o andamento do Parlamento”, pondera, destacando o caso de Alcolumbre.
Fleischer acrescenta que a vedação à reeleição de Maia é “uma questão constitucional”: “[Se quiser resolver,] precisa de uma PEC [Proposta de Emenda à Constituição]”.