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segunda-feira 28 de agosto de 2023 às 08:34h

Brasil registra 3,8 mil empresas em recuperação judicial no 1º semestre de 2023

DESTAQUE, JUSTIÇA, NOTÍCIAS


Duas a cada mil empresas em atividade no país encerraram o primeiro semestre em recuperação judicial. São, ao todo de acordo com Joice Bacelo, do jornal Valor, 3.823 – de uma base de 2,1 milhões de matrizes de pequeno, médio e grande portes. O setor de cana-de-açúcar lidera em quantidade de processos.

A cada mil companhias ativas desse segmento, 38,6 estão em recuperação. Os processos se concentram, principalmente, em Alagoas, Maranhão, Paraná e São Paulo.

Abaixo da cana-de-açúcar aparecem os setores de construção de rodovias e ferrovias, com 16,3 empresas em recuperação a cada mil em atividade, e o de fabricação de calçados de couro, com 13. Em seguida estão transporte coletivo (12,5) e cultivo de soja (12).

Esses dados são do Monitor RGF de Recuperação Judicial, desenvolvido pela consultoria RGF & Associados. Além da quantidade de empresas em recuperação, a plataforma detalha cada setor por Estado, região e posição nacional.

“É uma foto do semestre, não um acumulado do que aconteceu mês a mês. Mostramos, naquela data [mês de junho], quantas empresas estavam em recuperação judicial, independentemente de quando o processo teve início”, diz Rodrigo Gallegos, sócio da RGF.

Em termos precisos, ele afirma, o índice nacional é de 1,8 empresas em processo de recuperação judicial a cada mil em atividade.

Na pandemia muitas coisas foram feitas para proteger as empresas”
— Samantha Longo

O indicador utiliza a base de dados do Ministério da Fazenda – que divulga, mensalmente, todas as empresas em atividade no país. A partir desses dados é possível extrair as que estão em recuperação. As companhias são obrigadas por lei a alterar a razão social quando estão nesse processo. O nome da “empresa x” passa a ser “empresa x – em recuperação judicial”.

Para o levantamento foram excluídos os microempreendedores individuais (MEI) e, dentre as empresas de pequeno, médio e grande portes, foi feita uma consolidação por matriz. “Porque uma empresa pode ter várias filiais. Se considerarmos todas, os números de recuperação podem apresentar distorções”, justifica Gallegos.

O Monitor da RGF terá atualização trimestral. A partir das próximas análises, portanto, haverá uma base de comparação, mostrando se o número de processos – o que entrou e o que ainda não foi encerrado – se mantém estável, está maior ou menor.

Em relação à quantidade de novos pedidos de recuperação, dizem especialistas, a tendência é de aumento neste ano de 2023. O primeiro semestre fechou com o maior patamar dos últimos três anos, segundo a Serasa Experian.

Foram registrados 593 novos pedidos entre janeiro e junho, uma alta de 52% se comparado com o mesmo período do ano passado, quando foram contabilizados 390 pedidos.

Dentre as companhias que, neste ano, precisaram recorrer ao Judiciário para renegociar com credores estão Americanas, Light, Oi e Grupo Petrópolis. As dívidas dessas quatro empresas, somadas, superam a marca de R$ 100 bilhões.

O que se vê em 2023 é um cenário bem diferente dos anos de pandemia. Em 2020, 2021 e 2022 o número de pedidos de recuperação ficou abaixo da média histórica. Em 2022, para se ter ideia, 833 empresas bateram à porta do Judiciário. Foi o menor índice dos últimos oito anos.

“No momento pandêmico muitas coisas foram feitas para proteger as empresas. O Judiciário estava mais protetivo, os credores mais dispostos a negociar e teve também a questão governamental e de liberação de crédito”, recorda Samantha Longo, sócia do Bichara Advogados. Agora, ela afirma, não temos mais esse cenário de tanta benevolência. O credor quer receber e o devedor está em uma situação difícil.

Muitas empresas se alavancaram com a oferta de crédito quando os juros estavam baixos, durante a pandemia – em 2020, a Selic esteve em 2%. Agora, com a Selic a 13,25%, não estão conseguindo honrar os pagamentos.

“Com a Selic nesse patamar e sem mais as vantagens negociais, as empresas não têm muita alternativa”, afirma André Moraes, do Moraes & Savaget Advogados. “O perfil dos clientes que têm nos procurado é o mesmo. Endividamento por alavancagem e pela alta da taxa de juros”, acrescenta.

O ano de 2023 deve restabelecer o que se via no período de pré-pandemia. Mas, segundo os especialistas, não de forma tão extrema, como registrado em 2016 e 2017 – os piores anos da série histórica. Em 2016, quando teve o impeachment de Dilma Rousseff, foram registrados 1.863 pedidos de recuperação.

O setor de cana-de-açúcar, que conforme os dados do Monitor, lidera o ranking das empresas com o maior número de recuperações do país – quando levada em conta a proporção a cada mil companhias em atividade – está há anos na corda bamba.

É afetado por variações do clima e de mercado – como as commodities em geral -, mas, além disso, precisa lidar com as intervenções governamentais no setor de combustíveis.

Ricardo Siqueira, do escritório RSSA, que atua para o setor, explica que a maioria das usinas opera com açúcar e etanol. A proporção costuma ser de 70% e 30% para um e outro. “Se você tem um preço muito ruim em um dos dois isso gera um desequilíbrio. Desde de 2020, no Brasil, se vende etanol abaixo do custo”, frisa.

O advogado tem, entre os seus clientes, um conglomerado de usinas sucroalcooleiras do Estado de São Paulo. A companhia entrou em recuperação judicial em 2020 com um passivo de R$ 4 bilhões. Ele também atua para empresas da cadeia do açúcar que precisaram se socorrer do Judiciário. Dentre elas, uma fornecedora de máquinas e equipamentos.

Joelson Sampaio, professor de economia da FGV, diz que as dificuldades enfrentadas pelos setores de construção de ferrovias e rodovias e de fabricação de calçados – que também estão no topo do ranking – podem estar atreladas ao custo dos insumos. “São setores que vêm sofrendo bastante desde o início da pandemia”, ele avalia.

Já as ocorrência envolvendo o setor de transporte coletivo, afirma o professor, estão relacionadas às questões de mercado. “É um pouco cíclico. Já sofreu muito, empresas entraram em recuperação, mas nesse ano tem um efeito positivo.”

De acordo com os dados do Monitor, São Paulo é o Estado que concentra o maior número de empresas que buscaram a Justiça para negociar com credores. São 1.198, um terço do total do país. Mas é também o Estado onde está localizada a maior parte das companhias – 793.194.

Quando analisado de forma proporcional, comparando o número de processos de recuperação com o de empresas em atividade, o índice fica em 1,51 para cada mil, o que o deixa bem atrás de outras localidades.

Na região Centro-Oeste são 3,12 a cada mil empresas ativas. O Estado de Goiás é quem puxa o índice para cima: a cada mil companhias, 5,34 estão em crise. O índice em Mato Grosso do Sul é de 1,06 e em Mato Grosso 3,42.

O Nordeste ocupa o segundo lugar no ranking das regiões: a cada mil empresas ativas, 2,36 estão em processo de recuperação. No Sul – que está em terceiro – são 2,15.

O Sudeste, onde está situado o Estado de São Paulo, surpreendentemente, na visão de especialistas, aparece na quinta posição: 1,44 a cada mil empresas ativas estão em recuperação judicial. Fica à frente apenas da região Norte, que tem índice de 1,09.

Especialistas ouvidos pelo Valor veem dois possíveis motivos para a descentralização das recuperações judiciais: o mercado está mais informado sobre o que é e como funciona o processo e o Judiciário vem se especializando.

“Mato Grosso do Sul, por exemplo, tem varas especializadas na área e esse caminho também está sendo seguido por Mato Grosso e Minas Gerais”, afirma o advogado Ricardo Siqueira. Soma-se a esses fatores, ele diz, o fato de a reforma da Lei de Recuperações e Falências, em vigor desde janeiro de 2021, ter permitido a recuperação de produtores rurais.

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