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terça-feira 10 de setembro de 2024 às 09:49h

Bolsonaro perde o monopólio da direita

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Hoje Pablo Marçal assusta o eleitor moderado como Bolsonaro também o fazia antes de se eleger, mas é ofensiva estratégia para herdar seu eleitorado

Segundo artigo de Maria Cristina Fernandes, jornalista do jornal ValorO bolsonarismo arrumou uma encrenca com o ato de 7 de Setembro. A ideia era se valer da força da direita na eleição paulistana e da última grande efeméride antes da disputa pelas mesas diretoras para bombar duas pautas que passam pelo Congresso: a anistia pelo golpismo do 8/1 e o impeachment do ministro Alexandre de Moraes.

Findou passando recibo para a concorrência de Pablo Marçal. O candidato do PRTB não se limitou a transformar a Avenida Paulista no laboratório de sua preferência no eleitorado bolsonarista. Saiu ovacionado ao se evidenciar como herdeiro de Jair Bolsonaro num ato convocado para pressionar pela devolução dos direitos políticos do ex-presidente. Não foi por 2024, mas por 2026 que se puseram em conflito.

Marçal joga – e confunde – em todas as posições. Quando foi barrado no palanque e subiu na grade para pedir pela volta de Bolsonaro, já havia uma bandeira estendida na avenida, onde se lia: “Bolsonaro parou. Marçal começou. Pablo Marçal presidente do Brasil”. Ao mesmo tempo se valia de uma passagem bíblica para dizer a um seguidor no Instagram que torce pela volta de Bolsonaro, como Davi espera o reinado de Saul chegar ao fim.

A história, moldada para o público evangélico – Marçal tem 29% deste eleitor x 27% de Nunes (Datafolha) – fala de um líder de origem militar, Saul, que perdeu a humildade e levou Deus a preferir o jovem temente e obediente Davi. Com sua capacidade de contar lorotas, Marçal ainda há de encaixar nessa história sua recusa em criticar Moraes.

Quando se recusa a embarcar no “fora Xandão”, Marçal mostra que Bolsonaro tem uma pauta que arrisca envelhecer da mesma maneira que a do presidente Luiz Inácio Lula da Silva contra a Lava-Jato. Lula teve que escanteá-la para falar de futuro e voltar ao poder. Bolsonaro está impedido de fazê-lo pela inelegibilidade e, ao contrário de Lula, se vê acossado por um herdeiro que já virou a página.

Não importa que hoje Marçal assuste o eleitor moderado. O importante é roubar a bandeira do bolsonarismo e depois se consolidar como líder de seu campo político. O eleitor moderado que aderiu a Bolsonaro em 2018 o fez a despeito das ameaças de morte ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, do histórico de indisciplina militar e das exibições de misoginia, homofobia e preconceito racial. A metade do eleitorado nacional que confirmou a opção por Bolsonaro em 2022 o fez acrescentando a ficha corrida de sua passagem pela Presidência.

A rota de Marçal para se transformar na liderança deste campo passa por assumir o papel de malvado favorito da extrema-direita, ante um Bolsonaro com sobrepeso e adoentado cuja agenda de liderança partidária mais o aproxima do Centrão do que de um nome antissistema.

Bolsonaro esperava manter os pés nas duas canoas, de Marçal e Nunes, na esperança de um segundo turno de direita puro-sangue sem o candidato do Psol, Guilherme Boulos. Por isso, convidou Marçal ao ato.

Foi quando viu a Paulista lotada de bonés e bandeiras com a letra “M”, o delírio provocado na multidão pela passagem do candidato do PRTB e a bandeira anunciando-o como sucessor que resolveu partir pra cima chamando-o de “traidor”.

Marçal empoçou nas pesquisas mas divide um triplo empate na liderança da disputa paulistana. Não tem tempo de TV e vê a estratégia que montou para os debates se esgotar. Como não colou bem a recusa em discutir plano de governo, armou uma viagem a El Salvador de onde promete um “documentário” sobre a solução para a segurança pública que passa pela prisão sem mandado judicial.

O candidato do PRTB foi capaz de levar um hesitante Tarcísio de Freitas a mergulhar de vez na campanha de Nunes. Em qualquer corrida de táxi de 15 minutos o paulistano se deparará pelo menos uma vez com o comercial de Nunes que convida o ouvinte a buscar no Google o “áudio Marçal Polícia Federal”.

Bolsonaro hoje depende desta dupla para barrar Marçal e da bancada do PL para pressionar por anistia e impeachment. Os deputados presentes ao ato da Paulista bradaram pela anistia, a começar pelo deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), o mais colérico deles, mas a bancada de senadores foi tímida. Apenas cinco, dos 31 que se dizem pelo impeachment de Moraes, compareceram.

Se os parlamentares gozam da simpatia do ecossistema bolsonarista o mesmo não pode ser dito sobre o prefeito e o governador. Nunes chegou e saiu do ato sem ser percebido e Freitas fez um discurso institucional, de defesa do governo Bolsonaro, sem uma única menção a Moraes ou ao STF. Caiu em desgraça com os órgãos de comunicação mais simpáticos à causa. “Ele não é de direita, devia se filiar ao PSDB”, disse um comentarista.

Esses canais exibem o dilema do bolsonarismo. Aderem à anistia porque têm colaboradores foragidos mas não escondem o entusiasmo com Marçal e o cansaço com Bolsonaro. Um jornalista da “Gazeta do Povo”, um dos organizadores do ato, foi chamado por Bolsonaro de “picareta” porque o volume do seu carro de som estaria atrapalhando os discursos. Seus colegas se revoltaram quando o ex-presidente, em vez de pedir que baixassem o som, mandou o governador acionar a Polícia Militar. Um comentarista resumiu: “Se a manifestação é contra o autoritarismo de Alexandre de Moraes como é que ele faz uma coisa autoritária dessas? Bolsonaro quer o monopólio da perseguição”.

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