Segundo a revista Veja, nasce uma curiosa aliança: o PT de Lula está se unindo ao governo Jair Bolsonaro e ao PP de Ciro Nogueira e Arthur Lira.
O objetivo é criar uma CPI na Câmara dos Deputados, a partir de fevereiro, contra um adversário comum na disputa eleitoral, Sergio Moro, candidato presidencial do Podemos.
Já está tudo combinado, eles indicam.
Ontem, o deputado Paulo Teixeira, do PT de São Paulo, anunciou a apresentação do requerimento de CPI contra o ex-juiz da Lava Jato por suspeita de “conflito de interesses” contrato privado de Moro com o grupo de advocacia americano Alvarez & Marsal.
Pouco depois, o ministro Ciro Nogueira, chefe da Casa Civil de Bolsonaro, usou uma rede social para aplaudir a iniciativa do deputado petista.
Nogueira é presidente licenciado do Progressistas, que partilha o comando do Centrão com o Partido Liberal, de Valdemar Costa Neto, organização escolhida por Bolsonaro para disputar a reeleição.
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), já teria garantido a instalação da comissão, informou o repórter Claudio Dantas, do portal O Antagonista.
Junto com o PT, o PP e o PL foram os partidos com maior número de políticos processados por corrupção nos casos do mensalão e da Petrobras, durante o governo Lula.
Se o roteiro delineado for confirmado na Câmara, em fevereiro, ocorrerá um fato inusitado a oito meses da eleição presidencial: a aliança de Lula, líder nas pesquisas, com Bolsonaro, segundo colocado, para impedir a ascensão de Moro, terceiro na preferência dos eleitores.
Há sete meses, Lula aparece como favorito nas intenções de voto. Em dezembro, chegou a 48% no Datafolha. Isso representa vantagem de 26 pontos percentuais sobre Bolsonaro (22%).
Ambos estão, nas pesquisas, muito distantes de Moro (9%). Lula com 39 pontos à frente e Bolsonaro com 13 pontos.
Nesse quadro, fabricar uma CPI na Câmara contra Moro equivale a sair armado com mísseis na caça a uma abelha no Planalto Central. Sem lógica eleitoral, sobra apenas o desejo de vingança de petistas e bolsonaristas como bússola política. Nesse caso, é alto o risco de um tiro no pé do bolsolulismo.
A investigação sobre o “conflito de interesses” de Moro começou de forma atropelada no Tribunal de Contas da União. Segue polêmica, não só pela confusão na procuradoria mas, principalmente, porque o TCU não tem como atuar sobre contratos privados que não envolvam dinheiro público.
Tudo começou em junho de 2019, quando a empreiteira Odebrecht pediu recuperação judicial. Acumulava dívidas de R$ 65 bilhões.
Moro, que havia condenado diretores e supervisionado acordos de leniência na empresa, nessa época completava oito meses de aposentadoria no Judiciário e seis meses no Ministério da Justiça de Bolsonaro.
O processo falimentar da Odebrecht foi para a 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais de São Paulo. O juiz João de Oliveira Rodrigues Filho seguiu o ritual, sob supervisão do desembargador Alexandre Lazzarini, e escolheu uma empresa credenciada no tribunal paulista para para gerenciar pagamentos aos credores.
Rodrigues Filho elegeu a Alvarez Marsal Administração Judicial Ltda. Ela já atuava na recuperação judicial de outras empresas que foram à bancarrota durante a Lava Jato, como a empreiteira OAS.
Dez meses depois, em abril de 2020, Moro desembarcou do governo Bolsonaro. O rompimento foi público. O ex-ministro acusou o presidente de usar a Polícia Federal para proteger interesses pessoais e dos filhos parlamentares envolvidos em investigações de corrupção e peculato. Esse caso ainda não tem desfecho previsível no Supremo Tribunal Federal.
Sete meses depois de sair do governo, em novembro de 2020, o grupo Alvarez & Marsal contratou com Moro. Empregou-o na posição de diretor da subsidiária brasileira A&M Disputas e Investigações. Depois, o contratou como consultor da americana A&M Disputes and Investigations Inc.
O grupo informou ao TCU que essas duas empresas nada têm a ver com a subsidiária A&M Administração Judicial que atuou na fiscalização de 89 empresas, em 26 processos de recuperação judicial, a pedido de tribunais de São Paulo e do Rio a partir de 2013, antes da Lava Jato.
Entre 2013 e 2021 faturou cerca de R$ 83 milhões na prestação de serviços à Justiça, dos quais R$ 65 milhões em casos de empresas envolvidas na Lava Jato.
Moro, em nota pública, afirma não ter trabalhado “direta ou indiretamente para a Odebrecht”.
Durante um ano, auditores do TCU analisaram o caso e concluíram pela “falta de consistência”, de “conexão lógica” e “cronológica” nas suspeitas de “conflito de interesses” levantadas pelo procurador Lucas da Rocha Furtado.
Insatisfeito, o relator do processo, Bruno Dantas, resolveu seguir adiante com o processo. Aparentemente, chegou a um beco sem saída, porque não há meios do TCU fiscalizar contratos privados sem envolvimento de dinheiro público. Na quinta-feira, ele retirou o sigilo do processo.
A partir daí fluíram os contatos do PT com o Palácio do Planalto e o Centrão para montagem de uma CPI na Câmara. Se confirmada, será novidade com potencial de desestabilizar o processo eleitoral.