O presidente Jair Bolsonaro desembarcou hoje em Israel para uma visita com potencial polêmico dentro e fora do Brasil. Suas falas e decisões podem desencadear reações no mercado, na comunidade internacional e entre seus eleitores. Ele chegou a Israel a poucos dias de o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, sob investigação por prática de corrupção, disputar a reeleição, no dia 9 de abril.
“O Brasil deve ter pouco a ganhar nessa viagem, mas, para Netanyahu, será um sinal de prestígio em pleno fim de mandato”, avalia o conselheiro do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), Marcos Azambuja, que espera que o presidente não faça algo que crie desconforto. “O que se espera mesmo é que não haja um dano maior. Israel é um espaço pequeno onde muitos conflitos acontecem com múltiplas fontes de tensão.”
A visita do presidente tem uma dimensão de reciprocidade a Netanyahu, que esteve presente em sua posse e enviou militares para ajudar nas buscas em Brumadinho (MG), em janeiro, quando do rompimento da barragem da Mina do Feijão, da Vale. Mas esse não é o cerne da estratégia política de Bolsonaro ao se aproximar de Israel.
Na cena internacional, a diplomacia do presidente busca cumprir a agenda antiglobalista, propagada por seu guru, o escritor Olavo de Carvalho, que mora na Virgínia (EUA). ”O governo acredita que Israel é uma espécie de referência da luta antiglobalista. Em sua posse, o chanceler Ernesto Araújo disse que o Brasil iria reconstruir suas relações com Estados Unidos, Hungria, Polônia, Israel e a Nova Itália, ou seja, o atual eixo populista conservador global”, disse Guilherme Casarão, professor de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e especialista nas relações do Brasil com o Oriente Médio.
Política interna
Domesticamente, Bolsonaro mira seus eleitores evangélicos. Antes mesmo de tomar posse, o presidente prometeu transferir a embaixada do Brasil de Tel Aviv para Jerusalém, uma atitude polêmica na comunidade internacional, já que a maioria dos países espera um acordo de paz entre Israel e a Palestina, antes do gesto simbólico que reconhece Jerusalém, reivindicada por ambas as partes, como a capital de Israel. Apenas Estados Unidos, aliado histórico de Israel, e por iniciativa de Donald Trump, e a Guatelamala têm suas embaixadas em Jerusalém.
“Os evangélicos neopentencostais, que representam boa parte de seu eleitorado, acreditam que, para o cumprimento de uma profecia bíblica da volta de Jesus Cristo à Terra, é necessário que a Terra Santa esteja nas mãos dos judeus e que eles sejam convertidos”, explica Casarão.
Se a mudança da embaixada atende aos princípios ideológicos dos olavistas e religiosos dos evangélicos, que representam boa parte do eleitorado do presidente e têm uma forte bancada no Congresso Nacional, provoca a comunidade internacional e desagrada aos exportadores brasileiros de aves e carnes para países árabes. Já em janeiro, depois de sua posse, a Liga Árabe enviou uma carta em que pedia que o Brasil cumprisse o direito internacional e ameaçou retaliação. E elas vieram. A Arábia Saudita descredenciou cinco frigoríficos brasileiros que exportam para o país. Antes de embarcar, o presidente ensaiou um recuo e disse que pode abrir um escritório comercial em Jerusalém.
A aproximação de Bolsonaro com Israel começou em maio de 2016, quando, em missão parlamentar, ele viajou ao país com os três filhos e foi batizado no rio Jordão pelo pastor Everaldo. Mas o alinhamento é mais antigo. Em 2014, quando Israel bombardeou o território de Gaza, matando centenas de pessoas, principalmente crianças, a então presidente e candidata à reeleição Dilma Rousseff criticou o ataque, que classificou de desproporcional. Em resposta, o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores de Israel, Yigal Palmor, chamou o Brasil de “anão diplomático”. O então deputado Jair Bolsonaro enviou uma carta à embaixada de Israel pedindo desculpas pelo posicionamento do Itamaraty, acusando Dilma de praticar terrorismo durante a ditadura militar.
Por Cláudia Dianni e Rosana Hessel