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Tela "Combate de 4 de maio de 1823”, de Trajano Augusto de Carvalho, retrata batalha naval na baía de Todos-os-Santos - Marinha / Divulgação
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terça-feira 27 de junho de 2023 às 05:56h

Batalhas navais e prisão de general antecederam Independência na Bahia há 200 anos

2 de Julho, DESTAQUE, NOTÍCIAS


As semanas que antecederam a consolidação da Independência do Brasil na Bahia foram marcadas segundo reportagem de João Pedro Pitombo, da Folha de São Paulo, por batalhas navais, disputas táticas por terra, fugas e instabilidades que incluem uma rebelião de oficiais brasileiros contra o seu próprio comandante.

Foram dias de tensão até o 2 de julho de 1823, dia em que as tropas portuguesas foram expulsas de Salvador. A data completa 200 anos na próxima semana e será celebrada nas ruas da capital baiana com um calendário de eventos festivos, culturais, cívicos e acadêmicos.

A guerra pela Independência na Bahia tem sua gênese em um levante que foi sufocado por tropas portuguesas em fevereiro de 1922, sete meses antes do Grito do Ipiranga. Os baianos organizaram a resistência na região do Recôncavo e avançaram para retomar a capital.

As vitórias brasileiras na Batalha de Pirajá e na Batalha de Itaparica marcaram o declínio das tropas portuguesas na Bahia. Mas até a consolidação da Independência muita pólvora e munição foram gastas em combates em terra e mar no entorno de Salvador.

A principal batalha naval aconteceu em 4 de maio de 1823. A esquadra brasileira, que havia sido formada às pressas por d. Pedro 1º, era liderada pelo lorde Thomas Cochrane, almirante escocês que tinha experiência na Marinha britânica e participou das lutas pela independência do Chile.

A formação esquadra era considerada fundamental para a manter integridade do território continental, já que as comunicações entre os núcleos urbanos aconteciam majoritariamente pelo mar.

“Naquele momento não tínhamos rodovias, estradas que fossem razoáveis, sequer ferrovias. Para chegar lá [em Salvador], somente com navio e trafegando pela via marítima” explica o capitão-tenente Anderson de Rieti, historiador da Diretoria de Patrimônio Histórico e Documentação da Marinha.

Os navios da Esquadra Brasileira chegaram à Bahia em 24 de abril e se uniram à Flotilha Itaparicana, conjunto de pequenas embarcações, sobretudo saveiros, que auxiliavam as tropas brasileiras. A flotilha era liderada pelo capitão-tenente João das Botas, português que aderiu à causa da Independência.

Do outro lado, estava a Esquadra Portuguesa, que havia sido reforçada nos meses anteriores e era comandada por João Félix Pereira dos Campos. Ele era subordinado ao brigadeiro português Inácio Luís Madeira de Melo, então governador de armas da Bahia.

Era por volta das 6h quando os marinheiros da Esquadra Imperial avistaram os primeiros navios lusitanos. O combate começou por volta das 11h, quando a nau Pedro 1º disparou o primeiro tiro contra uma fragata inimiga, que revidou com balas, granadas e morteiros.

Os portugueses estavam em superioridade numérica: eram 7 navios brasileiros contra 13 lusitanos. Mas a batalha terminou sem um vencedor: o almirante Thomas Cochrane seguiu com a esquadra para Morro de São Paulo, onde aportou para recuperar os danos nos navios.

No mês seguinte, ganharam relevo as batalhas por terra em ataques ao exército português nas regiões de Brotas, Rio Vermelho e Pituba. A vitória dos brasileiros resultou na ocupação da povoação do Rio Vermelho, fazendo as tropas chegarem ainda mais perto do núcleo urbano da capital baiana.

No campo político, o clima era de instabilidade. Do lado português, o general Madeira de Melo encampou uma proposta que declarou Salvador como uma “praça de guerra e em estado de sítio”, medida que esvaziou a junta governativa civil e lhe deu plenos poderes.

Entre os brasileiros, o Conselho Interino que governava a partir da cidade de Cachoeira se desentendia com o general Pierre Labatut, mercenário francês que liderou as tropas brasileiras.

Em maio de 1823, ao ser informado sobre uma suposta conspiração, Labatut mandou prender o coronel Felisberto Gomes Caldeira, comandante de uma das brigadas, que foi enviado para uma fortaleza na Ilha de Itaparica.

A prisão resultou em uma rebelião dos oficiais brasileiros, que passaram a não mais cumprir as ordens do mercenário francês e decidiram depô-lo. Labatut foi preso em 20 de maio e não participou da tomada de Salvador em 2 de julho de 1823.

A rigidez nos métodos de Labatut, a fama de violento e o fato de o general não se reportar ao governo provisório criaram indisposição com oficiais brasileiros. Também houve críticas dos proprietários de terras quanto ao uso de escravizados como soldados.

Com Labatut preso, as tropas brasileiras passaram a ser lideradas pelo coronel baiano José Joaquim de Lima e Silva, que reorganizou as tropas.

O cenário era de cerco total a Salvador, o que impedia a chegada de suprimentos para os portugueses, incluindo alimentos. A escassez fez escalar o preço da comida, causando fome e doenças.

Do lado brasileiro também havia dificuldades, apesar do apoio de grandes proprietários do Recôncavo. Conforme aponta o historiador Luís Henrique Dias Tavares (1926-2020), o exército brasileiro tinha cerca de 10 mil homens, o que demandava o abate ao menos 40 bois por dia para alimentar as tropas.

Em 28 de maio, Lima e Silva escreveu uma proclamação aos portugueses e fez um ultimato: disse que as tropas inimigas estavam “no mais deplorável estado” e conclamou os portugueses a abaixarem as armas, prometendo que não haveria “rancor ou ódios pessoais”.

Os oficiais brasileiros negociaram uma capitulação sem combate do general Madeira de Melo. O português não aceitou os termos, pois aguardava reforços de Portugal. Como o apoio não chegou, o general iniciou o planejamento para uma fuga em massa de Salvador.

O historiador Sérgio Guerra Filho, professor da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, disse a João Pedro Pitombo, da Folha, que ao menos 8.000 portugueses deixaram a capital baiana nas vésperas da Independência, mas o número pode chegar a 10 mil, já que há registros da saída de barcos que não informam o número de passageiros.

“Não é pouca coisa para um momento como este. Salvador tinha cerca de 60 mil habitantes. Um sexto da cidade evacuou em uma centena de embarcações em direção a Portugal”, afirma.

As tropas de Madeira de Melo embarcaram em seus navios e deixaram a Bahia na madrugada de 2 de julho de 1823, sendo perseguidas pela esquadra brasileira. Nas horas seguintes, em uma manhã ensolarada, as tropas do Exército Pacificador entraram em Salvador sob aplausos.

Dentre oficiais e soldados uniformizados, estavam “homens descalços e quase nus, mostrando na miséria dos andrajos a grandeza dos seus sacrifícios”, apontaria décadas depois o historiador Tobias Monteiro.

Fizeram o mesmo caminho que será repetido no próximo 2 de julho, quando as ruas entre Largo da Lapinha e o Praça da Sé serão tomadas pelos baianos que vão celebrar o caráter popular da Independência.

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