O ministro Luís Roberto Barroso, relator da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) 7.418, ajuizada pelo Partido Verde para garantir que a revisão prevista na Lei de Cotas não seja usada para encerrar a ação afirmativa, determinou que o Supremo julgue a ação em “rito abreviado, de modo a permitir a célere e definitiva resolução”.
Na decisão, o ministro Barroso afirma que o pleito do PV é de “inequívoca relevância e possui especial significado para a ordem social e de segurança jurídica”. Barroso determinou um prazo de dez dias para que o Presidente da República da República, o presidente do Senado e o Presidente da Câmara prestem informações e em seguida, prazo de cinco dias para que abra-se vista ao Advogado Geral da União e ao Procurador-Geral da República.
A Lei de Cotas vale desde 2012 e garante reserva de vagas para alunos pretos, pardos, indígenas, pessoas com deficiência e alunos oriundos de escolas públicas nas universidades federais.
O PV entende que o artigo que prevê “a revisão do programa especial para o acesso às instituições de educação superior de estudantes pretos, pardos e indígena e de pessoas com deficiência, bem como daqueles que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas” pode dar espaço para interpretação de extinção ou expiração da Lei de Cotas.
A ação também requer concessão de medida cautelar que mantenha a Lei de Cotas como está até que o Congresso determine nova legislação sobre as Cotas, no prazo de um ano.
Informação para imprensa
Julio Moreira
11 986989003
Íntegra da decisão do ministro
Ação Direta de Inconstitucionalidade 7.418 Distrito Federal
Relator : Min. Roberto Barroso
REQTE.(S) : PARTIDO VERDE
ADV.(A/S) : VERA LUCIA DA MOTTA
ADV.(A/S) : MARIA MARTA DE OLIVEIRA
ADV.(A/S) : LAURO RODRIGUES DE MORAES REGO JUNIOR
ADV.(A/S) : CAIO HENRIQUE CAMACHO COELHO
ADV.(A/S) : FABIANA CRISTINA ORTEGA SEVERO DA SILVA
INTDO.(A/S) : CONGRESSO NACIONAL PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO INTDO.(A/S) : PRESIDENTE DA REPÚBLICA PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO
DESPACHO:
- Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade, com pedido de medida cautelar, ajuizada pelo Partido Verde (PV) contra o art. 7º da Lei nº 12.711/2012, com redação dada pela Lei nº 13.409/2016, que tem o seguinte teor:
Art. 7º No prazo de dez anos a contar da data de publicação desta Lei, será promovida a revisão do programa especial para o acesso às instituições de educação superior de estudantes pretos, pardos e indígenas e de pessoas com deficiência, bem como daqueles que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas. (Redação dada pela Lei nº 13.409, de 2016)
- O requerente narra que o dispositivo, embora fixe um prazo decenal para revisão das políticas afirmativas de ingresso nas instituições de ensino superior, deixou de prever expressamente a manutenção da determinação legislativa até que sobrevenha novel legislação. Alega que, diante de insegurança jurídica e risco de retrocesso
em matéria social, o dispositivo impugnado deve ser interpretado (i) no contexto do histórico decisum assinalado na ADPF 186, sob a relatoria do Min. Ricardo Lewandowski, Pleno, DJe 20.10.2014; (ii) na linha dos fundamentos vinculantes desse precedente; (iii) à luz da alteração do quadro fático-normativo delineadona ADI 7.184, haja vista o consumodo prazo decenal sem qualquer lei que venha a disciplinar a matéria, mesmo passado um ano de sua expiração; e (iv) diante do flagrante estado de coisas inconstitucional, consistente em mora legislativa para editar novel diploma sobre a temática, mesmo após o decurso de um ano de expiração do dispositivo impugnado.
- Sustenta que a expiração do prazo decenal da referida política de cotas, sem que tenha sido editado novo diploma pelo Congresso Nacional, gera violação à CRFB/1988, por (i) transgredir o conteúdo material dos direitos e garantias fundamentais, notadamente;
(ii) os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, notadamente, além dos arts. 1º, caput (princípio republicano), III (dignidade da pessoa humana); 3º, IV (vedação ao preconceito de cor e à discriminação); 4º, VIII (repúdio ao racismo); 5º, I (igualdade), II (legalidade), XLII (combate ao racismo); 37, caput; 205 (direito universal à educação); 206, caput, I (igualdade das condições de acesso ao ensino), e; 207, caput (autonomia universitária), todos da Constituição Federal; (iii) os princípios implícitos da proporcionalidade em sentido estrito, da vedação ao retrocesso, a vedação à proteção deficiente.
- Requer, assim, a concessão de medida cautelar para (i) conferir interpretação conforme a Constituição ao art. 7º da Lei nº 12.711/2012, estabelecendo o alcance da palavra “revisão” não significa extinção, consumação ou expiração da Lei de Cotas e que, por isso mesmo; (ii) determinar que os entes federados, em seus diferentes níveis, observem o conteúdo constante da Lei de Cotas, ainda que superado o prazo decenal nela previsto,até que sobrevenha novel legislação sobre a
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temática; (iii)fixar prazo de um ano para o Congresso Nacionallegisle sobre a matéria.
- No mérito, pede que seja julgado procedente o pedido para (i) conferir interpretação conforme a Constituição ao art. 7º da Lei nº 12.711/2012, estabelecendo o alcance da palavra “revisão” não significa extinção, consumação ou expiração da Lei de Cotas e que, por isso mesmo; (ii) determinar que os entes federados, em seus diferentes níveis, devem observar o conteúdo constante da Lei de Cotas, ainda que superado o prazo decenal nela previsto, até que sobrevenha novel legislação sobre a temática; (iii) fixar prazo de um ano para o Congresso Nacional legisle sobre a matéria.
- No plantão judiciário, a Ministra Presidente do Supremo Tribunal Federal proferiu despacho no sentido de que, em análise sumária, a redação do art. 7º da Lei nº 12.711/2012 não parece sugerir existir um período de vigência pré-determinado ou termo final para a duração dos programas especiais de acesso à educação superior. Afirma ainda que o requerente não indicou qualquer ato ou medida concreta tendente a restringir, suprimir ou abolir os programas especiais de acesso à educação a que se refere a Lei nº 12.711/2021. Por isso, por não ter sido comprovada situação de risco atual ou iminente apta a configurar a hipótese prevista no art. 13, VIII, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, a Ministra Presidente determinou o encaminhamento do feito ao Ministro Relator.
- Ato contínuo, o requerente opôs embargos de declaração, no qual alegou que o referido despacho ostenta vício de contradição e pleiteou a sua reconsideração, o reconhecimento da situação de urgência e o provimento dos pedidos veiculados na petição inicial. Para tanto, argumentou que, por se tratar de procedimento de controle abstrato de constitucionalidade, é desnecessária a apresentação de casos concretos.
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Afirma ainda que, mesmo que assim não fosse, a dúvida sobre a continuidade da política de cotas para acesso ao ensino superior gera insegurança jurídica e arrola diversos casos noticiados de descumprimento à reserva de vagas para pessoas negras em concursos públicos.
- A matéria submetida à apreciação desta Corte é de inequívoca relevância e possui especial significado para a ordem social e a segurança jurídica. Assim, estando presentes os requisitos legais, deixo de analisar por ora o recursointerposto e aplico o rito abreviado do art. 12 da Lei nº 9.868/1999, de modo a permitir a célere e definitiva resolução da questão.
- Diante disso, determino as seguintes providências: (i) solicitem-se informações ao Excelentíssimo Senhor Presidente da República, ao Excelentíssimo Senhor Presidente do Senado Federal e ao Excelentíssimo Senhor Presidente da Câmara dos Deputados, no prazo de 10 (dez) dias; (ii) em seguida, abra-se vista ao Advogado-Geral da União e, sucessivamente, ao Procurador-Geral da República, para manifestação no prazo de 5 (cinco) dias.
Publique-se. Intime-se. Brasília, 4 de agosto de 2023.
Ministro LUÍS ROBERTO BARROSO
Relator
Documento assinado digitalmente