A Frente Parlamentar Evangélica está sob nova direção e terá uma meta para este ano eleitoral: aumentar para 30% sua presença no Congresso, o que acrescentaria em torno de 40 deputados aos 115 membros da atual bancada, e 11 senadores aos 13 já lá.
Nada mais justo, diz o deputado Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ), que assumiu a presidência do bloco nesta quarta (9). Da igreja do pastor Silas Malafaia, a Assembleia de Deus Vitória em Cristo, ele lembra que este é o tamanho da fatia evangélica na população brasileira e reclama, sem nomear, que alguns presidentes de grandes partidos “ainda olham o segmento com algum tipo de preconceito”.
O presidente Jair Bolsonaro (PL) tem apoio maciço da bancada para a reeleição, e Lula (PT) dificilmente recuperaria a simpatia de pastores que já marcharam com ele no passado, Malafaia incluso.
“O PT não consegue nunca mais enganar o público evangélico”, diz o ex-militante do partido nos tempos de líder estudantil. “Já andei com estrelinha do PT.”
O sr. assume a bancada evangélica em ano eleitoral. O bloco defenderá um candidato? Com o tamanho que os evangélicos representam hoje, entendo que não podemos ficar de fora do debate de candidaturas. O foco principal deve ser o Legislativo, o aumento nos estados e no Parlamento.
Mas a gente jamais pode se eximir da participação nas campanhas majoritárias [governadores e presidente]. Só posso cravar depois que a bancada deliberar, mas sinto que há maioria folgada, diria uns 90% de nós, de apoio à reeleição de Bolsonaro.
A ideia é intensificar a ida dele a igrejas? Tivemos um avanço na legislação. Sou grato a Margarete [Coelho, relatora do Novo Código Eleitoral, ainda não aprovado pelo Senado], que não é evangélica.
Havia interpretação dúbia do Tribunal Superior Eleitoral em relação a abuso de poder religioso. Ela deixou claro que, nos ambientes religiosos, fica autorizado, inclusive no período eleitoral, fazer conscientização política. O TSE interpretava a conscientização como pedido de voto.
E não tem formas de pedir voto sem ser explícito? Como separar isso? Existia, erroneamente, pastores, padres, pais de santos, seja qual religião for, que diziam em quem eles votariam [dentro do espaço religioso] e queriam que os fiéis seguissem, se possível, o voto deles. Isso pra mim interfere realmente na consciência.
Bom lembrar que [Fernando] Haddad e Manuela [D’ávila] também foram à igreja em 2018. Inclusive comunistas viraram católicos na época de campanha. Não vejo problema em candidatos frequentarem igrejas. Vai ser natural que [Bolsonaro] visite a Assembleia de Deus Vitória em Cristo e outras igrejas. Assim como entendo que Lula tentará, Sergio Moro também.
Quais as atuais dimensões da bancada? São 115 deputados e, de senadores, são 13, o número do PT [risos]. Entre 14 ou 12 senadores, melhor assim.
Qual a expectativa para o pleito de 2022? A principal dedicação neste ano será traçar uma estratégia com os colegas para finalmente chegar ao tamanho que temos no país, 30%. Ainda nos falta fidelizar mais votos do segmento.
E o fim das coligações pode trazer problemas para muitos dos nossos. Boa parte da bancada era eleita por partidos menores. Tem que chamar [os candidatos] para acertar a escolha de partidos certos.
As grandes legendas, o sr. diz? Há uma dificuldade com presidentes de partido que ainda olham o segmento com algum tipo de preconceito. Em alguns lugares, encontramos algum tipo de resistência. Isso porque o voto de evangélico é mais barato do que a média do voto nacional.
Há um partido de preferência? O grande segredo será não colocar toda a bancada num partido só. Temos comissões [na Câmara], que são divididas por partidos. E, se a gente colocar 80% dos evangélicos em um único partido, vamos estar descobertos nas comissões.
O PT já sinalizou que, na campanha, deve desviar de pautas morais e focar na economia, pensando no evangélico médio, que pode sofrer com desemprego, fome. Pra mim, o PT não consegue nunca mais enganar o público evangélico. Lógico que também não sou amador de achar que não exista no segmento pessoas que, por conta da situação econômica, votam no PT porque acham que na época do PT o padrão de vida era um pouco melhor. Não ignoro isso.
Mas a penetração do PT no segmento diminuiu assustadoramente [hoje, Lula e Bolsonaro aparecem tecnicamente empatados em pesquisas]. Voltei de Belém, fui num encontro com 450 pastores da Assembleia de Deus do Samuel Câmara. O pastor fez uma consulta e, dos 450 pastores, só um declarou votar em Lula. Todos os outros são Bolsonaro.
Temas caros a conservadores não caminharam nos primeiros anos do governo Bolsonaro. Só a pauta armamentista, que não é pleito evangélico. O presidente atendeu às expectativas? Tivemos grandes avanços no governo. Um dos nossos grandes trabalhos era barrar pautas que nos afrontam, o que acontecia antes [nos tempos do PT]. Entendo também que a pandemia dificultou o trabalho de não avançar algumas pautas. E, uma autocrítica que eu me faço, faltou um pouco de articulação nossa. O trabalho remoto é ruim para isso.
A Frente Parlamentar Evangélica foi regulamentada em 2003, primeiro ano de Lula no poder, quando muitos dos líderes que hoje criticam o ex-presidente o apoiavam —Malafaia, Edir Macedo, Magno Malta, Feliciano etc. Caso Lula ganhe, como a bancada deverá se portar? Tenho convicção de que será, em sua maioria, de oposição. Agora tenho também que entender que cada parlamentar tem filiação partidária.
O sr. já foi do PT, certo? Fui líder estudantil no ensino médio. Não cheguei a ser filiado, mas fui militante petista. Já andei com estrelinha do PT. Mas, quando elegeram para vereador o presidente do sindicato de professores na minha cidade [Ituiutaba-MG], vi que as práticas do PT na política eram piores do que as dos demais partidos. Deixei de ser petista com 18 anos. Nunca mais.
O sr. é eleito com apoio de Malafaia. O que isso significa? Muita gente acha que ele manda no seu mandato. Por conta de ter estado mais de 30 anos na TV aberta, o pastor tem uma área de influência muito abrangente. Isso produz muito apoio, mas muita resistência dos que não gostam do estilo dele. É figura polêmica, incisiva.
Quando [alguns deputados da bancada] falam ‘temos que resistir ao Sóstenes porque o pastor Silas pode querer influenciar’, é absurdo, estão querendo me medir com a régua deles. Reconheço que só sou deputado porque [Malafaia] me propôs [a candidatura]. Entretanto, no exercício do meu mandato, nunca, jamais, ele fica dizendo como devo votar. Dá autonomia total.
Temos visto mais discursos de pastores sobre a impossibilidade de ser cristão e de esquerda. O sr. concorda? São ideologias totalmente antagônicas. O conteúdo da esquerda, que alguns podem dizer que não é 100% comunista, no fundo é totalmente de afronta aos valores religiosos. Já fui esquerdista, já fui do PT, e, no auge da maturidade, aos 46 anos, digo que é impossível um cristão ser filiado à esquerda.
Como tratar, então, colegas de bancada como Benedita da Silva e Rejane Dias, ambas do PT? Trato com maior respeito e carinho. O cristianismo ensina a gente a conviver com quem pensa diferente. Não podemos rotulá-las de não cristãs. Só não consigo entender como elas conseguem conviver com um partido cujo estatuto é contrário aos nossos valores. Em algum momento terão problemas de consciência.
Projeções apontam que, em alguns anos, o Brasil poderá ser um país de maioria evangélica. O que isso significa? Há quem tema uma teocracia. O segmento evangélico é oriundo do protestantismo. Ninguém mais do que nós tem autoridade histórica e moral pra falar de laicidade do Estado [a Reforma Protestante rompeu com o catolicismo com críticas à dominação religiosa do Estado].
Muitos pastores, inclusive Malafaia, têm criticado a vacinação infantil, amplamente defendida por cientistas. O sr. concorda com seu pastor? Não temos resistência à vacina de adultos. [Malafaia] se vacinou, eu também. A crítica é em relação à vacinação para crianças.
Como o índice de óbitos na idade de crianças foi bem menor do que em outras faixas de idade, entendo que deve ser decisão dos pais vacinar ou não vacinar. A discussão está na autonomia do direito dos pais, há sempre a tendência da esquerda em solapar essa autonomia, seja na questão educacional, a mesma tática de sexualizar crianças no colégio, seja na questão da vacina.
O sr. tem filha menor de idade. Ela se vacinou? Ela tem 17 anos e se vacinou. Agora, se eu tivesse um filho de 10 anos, se me perguntar, eu, Sóstenes, não vacinaria.