O atraso na votação do Orçamento de 2025, que, pela Constituição deveria ter sido aprovado em dezembro do ano passado, tem aumentado o desgaste entre o Congresso e o governo. Nenhum dos dois poderes quer assumir a conta da demora.
Sem a conclusão do Orçamento, o governo só pode gastar com despesas discricionárias 1/12 por mês. A divisão não é feita por programa, mas por órgão, o que significa que cada ministério pode acelerar ou atrasar o que quiser.
A votação não aconteceu no ano passado por conta do imbróglio para liberar emendas depois do bloqueio feito pelo Supremo Tribunal Federal (STF). E parlamentares a par das negociações dizem, reservadamente, que a análise agora também vai depender do resultado de uma reunião marcada para quinta-feira (27) com os chefes dos Três Poderes para discutir sobre esses recursos.
Nesta última segunda-feira (24), a Comissão Mista de Orçamento (CMO) marcou para o dia 11 de março uma sessão para analisar a matéria. Mas a expectativa é que seja apenas o início da discussão, que pode se estender até o dia 17 de março. Em seguida, o plenário do Congresso ainda precisa analisar o texto.
De um lado, integrantes do Executivo têm responsabilizado os parlamentares pela demora na análise. De outro, deputados e senadores dizem que a equipe econômica mandou uma “peça de ficção” no projeto de lei orçamentária enviado em agosto, com valores muito mais baixos do que o necessário.
Com isso, programas como o Auxílio Gás e o Pé de Meia foram impactados – este último chegou a ser suspenso pelo Tribunal de Contas da União (TCU), que deu um prazo de 120 dias para o governo incluir o valor real no Orçamento.
No projeto encaminhado pelo Executivo, o Pé de Meia tem R$ 1 bilhão reservado, embora seu custo real possa chegar a R$ 15 bilhões. O governo contava que poderia usar recursos de fundos educacionais, o que foi barrado pelo TCU.
Já o Auxílio Gás tem R$ 600 milhões programados, mas deve consumir R$ 3,4 bilhões. O tema ainda não chegou à corte de contas, mas os valores extras também precisarão ser incluídos no Orçamento.
O relator do Orçamento, senador pela Bahia, Ângelo Coronel (PSD), reclama que não foi procurado por ninguém da equipe econômica para fazer ajustes.
“Se não houver o ‘vale gás’, não quero que o governo venha botar a culpa na CMO. Estou sendo condescendente, aguardando a equipe econômica entrar em contato. Sempre estive aberto para receber técnicos para ajustar pé-de-meia, vale gás, mas infelizmente nunca fui procurado”, afirma.
Outro ponto de desgaste foi a suspensão do Plano Safra, o maior programa de crédito rural do país, que inclui linhas para pequenos, médios e grandes produtores.
Após reclamação da bancada ruralista e de agricultores, o governo decidiu editar uma medida provisória para liberar R$ 4 bilhões e destravar as linhas de crédito. Mas o desgaste já estava dado e os parlamentares sentiram que a suspensão foi uma forma de jogar a culpa no Congresso.
Um dia depois do anúncio da suspensão, o presidente da CMO, Júlio Arcoverde (PP-PI), soltou uma nota dizendo ver “com estranheza declarações de integrantes do primeiro escalão do Governo Federal ao colocar na conta da CMO a não aprovação do Orçamento 2025 até o momento”.
“Se houve desinteresse em votar o Orçamento no ano passado foi do próprio Palácio do Planalto, em face das confusões jurídicas provocadas pelo STF”, disse Arcoverde, em referência ao imbróglio causado pelo bloqueio das emendas parlamentares. É sabido que parte do Congresso acredita que o Executivo tem responsabilizada conjunta com o STF na suspensão do pagamento destes recursos.
Reservadamente, um parlamentar diz que o Congresso precisa encontrar uma solução para o projeto “totalmente fora da realidade” enviado pela equipe econômica. E reclama que a situação deixa os parlamentares em uma “saia-justa”, já que eles não querem ser responsáveis por impactar programas populares como o Pé-de-Meia, o Auxílio Gás e o Plano Safra.
“Fizeram um orçamento fora da realidade e querem arranjar um bode expiatório. Essa prática de sempre culpar o Congresso não está colando”, disse.