Mais uma vez, a Assembleia Legislativa da Bahia (AL-BA) abriu espaço para discutir, em audiência pública, a situação de profissionais da área de saúde que há quase um ano e meio estão na linha de frente no combate à pandemia da Covid-19. Nesta quarta-feira (30), a Comissão de Educação, Cultura, Ciência e Tecnologia e Serviços Públicos da ALBA realizou uma sessão virtual, na qual se debateu o tema: “Piso salarial dos fisioterapeutas e farmacêuticos: um olhar sobre a filantropia na Bahia”.
No início dos trabalhos, a deputada Olívia Santana (PC do B), proponente da reunião, enalteceu a luta dessas categorias na recuperação da saúde do povo brasileiro, seja em hospitais e unidades básicas de saúde, bem como no tratamento domiciliar, e destacou a negligência do Governo Federal em relação ao uso de máscara, distanciamento social e lentidão na compra das vacinas, “sendo um dos piores países no enfrentamento ao coronavírus”.
Autor do Projeto de Lei 1731/2021, que estabelece um piso salarial para fisioterapeutas e terapeutas ocupacionais no valor de R$ 4.800, com jornada de trabalho de 30 horas semanais, o senador Angelo Coronel (PSD-BA) considerou que o PL é uma medida justa para as categorias e ressaltou a atuação desses profissionais durante a crise sanitária, “ajudando a evitar complicações cardiorrespiratórias em pacientes, além de contribuir para restaurar a capacidade pulmonar e motora de quem se curou da doença”.
O senador baiano confessou que vem recebendo muita pressão dos municípios, que estão sofrendo com a questão da previdência, para a não aprovação do piso salarial, mas adiantou que conta com o apoio do senador Otto Alencar (PSD-BA) para “convencer os prefeitos de que é possível beneficiar essas categorias sem prejudicar a gestão das cidades”. O projeto de lei, apresentado na Câmara Alta no dia 6 de maio, ainda não tem relator indicado nem uma data para apreciação.
Regulamentada no país há 51 anos, a fisioterapia tem na Bahia cerca de 17 mil profissionais que exercem suas atividades nas UTIs, nas enfermarias, no Programa de Saúde da Família, nas clínicas e também nas residências da população, compondo uma grande equipe de pessoas dedicadas exclusivamente na assistência dos pacientes com sequelas, buscando devolver o indivíduo à sociedade com plena saúde e condições de inserção na economia.
Glaucio Santana de Jesus, presidente do Sindicato dos Fisioterapeutas e Terapeutas Ocupacionais do Estado da Bahia, criticou a atual posição da entidade representativa do setor filantrópico quanto ao piso salarial: “A minha fala acaba sendo a fala de todos os profissionais que estão atendendo seus pacientes, com problemas cardiológicos e neurológicos e que neste momento deveriam ser valorizados, mas estão tendo que conviver com a redução de salário por parte de empresas filantrópicas”, disse o líder sindical, citando que esses hospitais e santas casas recebem doações e incentivos fiscais, mas continuam depreciando a remuneração da categoria.
Retrocesso
Já o presidente do Sindicato dos Farmacêuticos da Bahia, Clóvis Reis, informou que alguns setores do empresariado, a exemplo do comércio, fizeram acordos salariais durante a pandemia e estranhou não ter acontecido o mesmo com o segmento dos hospitais e das santas casas de misericórdia. “De 2019 pra cá, após termos acumulado acordos históricos e conquistas para a categoria, passamos a amargar um retrocesso da não negociação do reajuste que deveria haver todo ano e tivemos que judicializar as ações por intransigência do sindicato das entidades filantrópicas que não aceitam qualquer avanço nas cláusulas salariais”, lamentou Reis.
O sindicalista disse que, nos últimos dias, o patronato deu uma orientação de que “enquanto não houver qualquer decisão da justiça, os estabelecimentos vão apenas cumprir genericamente o que determina a legislação trabalhista, não se preocupando com questões outras, como adicional noturno, horas extraordinárias e insalubridade”. Ele apela ao Sindicato de Entidades Filantrópicas da Bahia para que volte a negociar e não ande na contramão da sociedade, que – em função da crise de saúde pública- está redefinindo suas relações.
Gustavo Vieira, presidente do Conselho Regional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional da 7ª Região, também participou da audiência pública transmitida ao vivo pela TV ALBA e redes sociais da emissora do Parlamento baiano. O conselheiro começou seu pronunciamento condenando a precarização do trabalho que está sendo imposta pelos donos do capital, expondo as pessoas a um risco desnecessário, pois muitos profissionais de saúde são praticamente obrigados a ter múltiplos vínculos para tirar o sustento do pão de cada dia. “Eu já senti na pele esta situação. Como profissional de terapia intensiva, já cheguei a trabalhar até 72 horas ininterruptas e isso compromete a assistência devido ao cansaço”, afirmou o dirigente do Crefito 7. Segundo ele, a filantropia existe para trazer benefícios à saúde dos brasileiros, mas denunciou a existência de grupos que estão lucrando, ganhando dinheiro com esses investimentos repassados pelo Governo Federal.
“Não basta bater palmas para os profissionais de saúde que estão nesta luta diária pelo povo brasileiro. Tem que materializar esses aplausos com atitudes concretas de valorização de todas as categorias”. Este é o pensamento do deputado federal Jorge Solla (PT-BA), revelando que – na sua opinião- apenas 130 parlamentares na Câmara Federal estão realmente interessados nas causas populares e, por essa razão, diversos projetos sobre piso salarial para a área de saúde encontram-se travados na tramitação do Congresso Nacional.
O médico sanitarista e ex-secretário estadual de Saúde da Bahia entende que este quadro só poderá ser alterado através de um conjunto de ações. Dentre elas, cita o aumento do orçamento federal para investir na saúde, a mobilização da sociedade organizada nas ruas e o impeachment do presidente Bolsonaro, “garantindo o retorno dos direitos e conquistas da classe trabalhadora”.
Alice Portugal, deputada federal do PCdoB, apresentou na Câmara dos Deputados, no primeiro dia do mês de junho, o PL 2028/2021, que institui o piso salarial de R$ 8.360 e a jornada de trabalho de 30 horas para os farmacêuticos de todo o país. O projeto propõe ainda a correção anual pelo valor consolidado do Índice Geral de Preços, divulgado pela Fundação Getúlio Vargas. Na sua fala, a comunista lembrou uma antiga conquista da categoria, que assegurou- por meio da chamada Lei da Nova Farmácia- a obrigatoriedade de se colocar um farmacêutico para cada turno nas farmácias do Brasil. Portugal salienta que os farmacêuticos são de fundamental importância para o bem-estar da saúde da população, ” porque permite com seu labor uma maior segurança no comércio e na administração de remédios às pessoas”. Farmacêutica de profissão, Alice criticou a reforma administrativa, em particular na atenção à saúde, e conclamou o setor de filantropia a avançar na questão dos salários, já que são instituições que recebem subsídios e podem conceder uma maior remuneração, “precisando acolher os seus parceiros não com olhos de patrão, porém como seus funcionários”.
Altamiro José, do Conselho Federal de Farmácia, Moisés Tonielo, do Conselho Nacional de Saúde, Marcos Lessa, da Associação de Moradores do Estado da Bahia e a fisioterapeuta Isabela Conde fizeram intervenções, de um modo geral, elogiando o Sistema Único de Saúde e dizendo que se sentiam orgulhosos pela atuação de fisioterapeutas, farmacêuticos, enfermeiros, ́técnicos de enfermagem e médicos no exercício da profissão em 15 meses da pandemia. A deputada Olívia Santana concluiu a reunião agradecendo às mais de 150 presenças, inclusive de outros estados, e frisou que vai fazer os devidos encaminhamentos das sugestões, inclusive a criação de uma comissão de acompanhamento “para que haja a abertura de um diálogo franco e sensível entre os trabalhadores e as empresas de filantropia na Bahia”.