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segunda-feira 25 de dezembro de 2023 às 12:04h

As incógnitas para 2024: as disputas entre partidos da base de Lula nas eleições vão afetar a governabilidade?

ELEIÇÕES 2024, NOTÍCIAS, POLÍTICA


Diante da movimentação de integrantes de partidos da base do presidente Lula da Silva (PT), que ensaiam embates na maioria das capitais a um ano das eleições de 2024, o Palácio do Planalto tenta evitar atritos que afetem a governabilidade. Especialistas lembram que entreveros em disputas municipais já tiveram impacto em alianças partidárias nacionais no passado. Por outro lado, acenos do PT a siglas de esquerda e do Centrão sugerem preocupação em blindar o governo de eventuais fissuras nos municípios

O próprio Lula expressou esse receio na última reunião ministerial do ano, quando pediu cautela a seus auxiliares em cidades onde mais de um partido da base lançar candidato. Esta será a situação de 22 das 26 capitais — as exceções, por ora, são Belo Horizonte, Manaus, Macapá e Porto Velho. Há cidades em que, por conta de alinhamentos regionais, o PT, partido do presidente, considera inevitável enfrentar siglas aliadas a nível federal. Parte dessas disputas, embora aguardadas, podem gerar abalos de maior proporção à base de Lula, na avaliação de especialistas, por envolverem caciques de peso no Congresso e na Esplanada dos Ministérios.

— Manter a base legislativa azeitada é uma das variáveis que o PT levará em conta para definir alianças ou candidaturas em 2024. Mas esta é uma construção bastante complexa, porque também há um interesse do próprio Lula de usar as eleições municipais para ocupar espaços — avalia o cientista político João Feres, coordenador do Observatório do Legislativo Brasileiro (OLB), vinculado à Uerj.

Cenários locais — Foto: Editoria de Arte
Cenários locais — Foto: Editoria de Arte

 Influência regional

A eleição de Maceió, por exemplo, tende a virar um novo capítulo da disputa por influência regional que opõe o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e o senador Renan Calheiros (MDB-AL), um dos principais aliados de Lula no Senado. Renan lançará uma candidatura do MDB e tem buscado fustigar a gestão do atual prefeito João Henrique Caldas (PL), que tem Lira como seu maior cabo eleitoral.

O presidente da Câmara já sinalizou descontentamento com a movimentação de Renan, que conseguiu instaurar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no Senado para investigar a atuação da mineradora Braskem em Maceió. Aliados de Lira e até interlocutores do Palácio do Planalto temem que a comissão seja usada como palanque contra Caldas e acabe desgastando também o governo.

Para evitar alinhamento a um ou a outro lado da disputa local, o PT anunciou no último mês que lançará candidato à prefeitura de Maceió, embora ainda não tenha apontado um nome.

O partido de Lula deve protagonizar embates tanto com aliados de esquerda quanto com outras siglas que se juntaram à coalizão do Planalto após as eleições presidenciais do ano passado. O envolvimento de ministros como Carlos Lupi (PDT) e Márcio França (PSB) nas disputas de Fortaleza e de São Paulo, respectivamente, acende alerta no Planalto.

Lupi tentou articular o apoio petista ao atual prefeito de Fortaleza, Sarto Nogueira, cidade que é hoje o principal reduto do PDT. O PT, porém, anunciou que terá candidato e filiou o presidente da Assembleia Legislativa, o ex-pedetista Evandro Leitão, desafeto de Lupi. Leitão é tido como possível candidato. Já na capital paulista, França e o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) têm se engajado na pré-campanha da deputada pessebista Tabata Amaral. A parlamentar tem feito críticas ao deputado Guilherme Boulos (PSOL), que tem apoio do PT.

Outro cenário que desafia a engenharia política do Planalto é a eleição de Salvador. O atual prefeito Bruno Reis (União) faz parte de um grupo historicamente rival ao PT na Bahia, embora o União Brasil tenha se aliado ao governo Lula e indicado três ministros. Na quinta-feira, o governador petista Jerônimo Rodrigues anunciou apoio a seu vice, Geraldo Junior (MDB).

Caciques dos dois partidos, como o ministro da Casa Civil, Rui Costa (PT), e o líder do União Brasil na Câmara, Elmar Nascimento, têm ensaiado uma aproximação, que dependerá da temperatura da disputa municipal. Elmar busca o apoio do Planalto para concorrer à sucessão de Lira na presidência da Câmara em 2025.

— A eleição vai gerar contradições com partidos como MDB e União Brasil, que têm posições locais divergentes do governo do qual são base. Em alguns casos, Lula age para fazer composições, mas há uma queda de braço constante no seu entorno entre os mais pragmáticos, que fazem esse jogo da conciliação de bastidor, e os ideológicos — afirma o cientista político Murillo de Aragão, diretor da Arko Advice.

Coordenador do Observatório Político e Eleitoral na UFRJ, o cientista político Josué Medeiros avalia que o PT tende a evitar campanhas “com sangue nos olhos” mesmo em capitais onde estiver disposto a enfrentar aliados. Um exemplo citado por Medeiros, na eleição de 2020, é a disputa ferrenha entre os primos João Campos (PSB) e Marília Arraes (PT) pela prefeitura do Recife — algo “impensável” nas circunstâncias atuais, segundo o especialista, que lembra a decisão petista de apoiar a reeleição de Campos.

A precaução, segundo o especialista, remete a abalos anteriores em coalizões governistas após eleições municipais. Na primeira eleição de Lula, em 2002, o petista recebeu apoio de caciques do antigo PMDB em estados como Pará, Paraíba e Goiás, que haviam ficado descontentes com o PSDB, do então presidente Fernando Henrique Cardoso, por disputas mal resolvidas nas principais cidades.

Na eleição presidencial seguinte, quando o PMDB havia passado a compor a base de Lula, o ex-governador do Rio Anthony Garotinho foi um dos principais articuladores de um movimento do partido por candidatura própria, que acabou empurrando a sigla à neutralidade. Garotinho se ressentia do apetite do PT para vencer seu grupo político na eleição de Campos dos Goytacazes, município do Norte fluminense, em 2004, disputa que marcou o início da derrocada do ex-governador.

— Até o governo Bolsonaro, que não trabalhou como líder partidário, os conflitos municipais iam criando rusgas que, se não abalavam a aliança nacional inteira do governo, por vezes geravam sequelas graves — pontua Medeiros.

O cientista político João Feres, por outro lado, considera que o comportamento dos parlamentares em votações na Câmara costuma se afastar de brigas paroquiais e fica mais atrelada ao posicionamento dos respectivos líderes na Casa.

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