A decisão do ministro Ricardo Lewandowski de se aposentar do Supremo Tribunal Federal (STF) em abril pode embaralhar os planos até então traçados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para o julgamento de ações que miram Jair Bolsonaro (PL), informa Julia Chaib, da Folha.
Lewandowski deixou a cadeira que ocupava havia 17 anos no STF nesta terça (11). Ele poderia ter se aposentado até 11 de maio, quando completará 75 anos, mas resolveu antecipar a saída.
A aposentadoria do ministro pode mexer tanto com o placar como com a data do julgamento de Bolsonaro na Justiça Eleitoral.
Segundo magistrados que acompanham o tema, a ideia de uma ala do tribunal era que a primeira ação contra o ex-presidente fosse colocada em pauta no final deste mês.
Ministros queriam que Lewandowski participasse da análise do caso com o objetivo de evitar que Kassio Nunes Marques, que vai substituí-lo, estivesse no julgamento. A ideia era que todos os três integrantes do STF votassem da mesma forma, mas a entrada de Kassio como ministro titular da corte levanta dúvidas sobre esse placar.
O ministro indicado por Bolsonaro costuma votar de acordo com interesses do ex-presidente em pautas no Supremo.
Além disso, Kassio suspendeu no ano passado decisão do TSE que cassou o mandato do deputado estadual paranaense Fernando Francischini.
Francischini havia sido cassado em outubro de 2021 devido à publicação de um vídeo, nas eleições de 2018, em que alegava ter havido fraude nas urnas eletrônicas para impedir votações em Bolsonaro. O caso tornou-se um precedente no TSE sobre como o tribunal pretendia agir diante de candidatos que atacam o sistema eleitoral.
O fato de Kassio ter suspendido a decisão é visto como um indício de que ele votará para manter a elegibilidade de Bolsonaro.
Sobre o prazo, pessoas próximas ao presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes, esperam que ele coloque a primeira das ações contra Bolsonaro em julgamento até o final de abril. Ponderam, no entanto, que o presidente do TSE só levará o tema ao plenário se tiver certeza de que Bolsonaro será declarado inelegível por oito anos —prazo que conta a partir da eleição de 2022.
Nesta terça, por exemplo, Moraes divulgou a pauta de julgamentos de abril sem o processo que mira o ex-presidente, em sinal de que não tem certeza sobre o assunto. Ele ainda pode incluir o caso na análise do mês depois que o relator liberar o processo. Aliados do ministro, porém, temem que ele postergue o início do julgamento.
Das 16 ações de inelegibilidade protocoladas contra Bolsonaro, a mais avançada é uma proposta pelo PDT, que trata de uma reunião com embaixadores no Palácio da Alvorada em julho passado. No episódio, o ex-presidente apontou dúvidas e difundiu mentiras sobre a segurança das urnas eletrônicas.
A ação argumenta que Bolsonaro usou a estrutura do Palácio da Alvorada, na reunião com embaixadores, para atacar a integridade do sistema eleitoral e o acusa de abuso de poder político e de uso indevido dos meios de comunicação.
O PDT pediu em janeiro que fosse incluída na ação a minuta golpista encontrada pela Polícia Federal durante busca e apreensão na casa de Anderson Torres, que foi ministro da Justiça de Bolsonaro. O documento propunha um decreto para instaurar estado de defesa na sede do TSE para rever o resultado do pleito. A minuta deu robustez à ação, avaliam integrantes do tribunal.
O prazo para as alegações finais da defesa nessa ação já terminou e foi aberto período para manifestação do Ministério Público, que acaba nesta quarta (12).
Isso significa, na avaliação de membros do TSE, que o relator, ministro Benedito Gonçalves, pode finalizar o parecer sobre o tema e liberar o caso para julgamento ainda na semana que vem. Se isso se confirmar, caberá a Moraes definir se inclui ou não o processo na pauta de abril.
Ministros da corte eleitoral e de outras tribunais consideram que o relatório será favorável à inelegibilidade. Eles também preveem que Bolsonaro deve ser condenado no plenário —embora haja dúvida sobre o placar. Nesta terça, o TSE rejeitou um pedido do ex-presidente para que Moraes fosse declarado impedido de participar dos julgamentos das ações por seis votos, inclusive com o de Kassio.
O TSE é formado por sete ministros, dos quais três são oriundos do STF, dois do STJ (Superior Tribunal de Justiça) e dois são advogados indicados pelo Supremo. Além deles, há sete ministros substitutos.
Kassio deve entrar no lugar de Lewandowski por ser o substituto com origem no STF mais antigo. A avaliação no Judiciário é que o voto dele e de Raul Araújo, do STJ, são considerados dúvidas. Como a composição do tribunal é pequena, ministros acreditam que a presença de Lewandowski daria mais segurança de que seria atingido um placar robusto contra Bolsonaro.
A pior hipótese para quem defende a inelegibilidade do ex-presidente seria a de os ministros Carlos Horbach e Sérgio Banhos, vindos da advocacia, não acompanharem o voto de Benedito. Nessa hipótese, caso os quatro divirjam do relatório, Bolsonaro sairia vitorioso e manteria sua elegibilidade.
Em 2021, Horbach foi contra cassar o mandato de Francischini por ataques ao sistema eleitoral, divergindo do restante dos ministros.
Entre as 15 demais ações que pedem que o ex-presidente seja impedido de disputar eleições, há outra considerada mais embasada: a que aponta a existência de uma ampla rede de desinformação que atuou a favor da candidatura do ex-mandatário, proposta pelo PT.
Segundo pessoas próximas de Moraes, o ministro considera a ação bem elaborada e que também pode levar à inelegibilidade de Bolsonaro.
CONHEÇA OS MINISTROS DO TSE, SUA ORIGEM E PERMANÊNCIA NA CORTE:
Ministros titulares
- Alexandre de Moraes (STF, até jun.24)
- Cármen Lúcia (STF, até ago.24)
- Benedito Gonçalves (STJ, até nov.23)
- Raul Araújo Filho (STJ, até set.24)
- Sérgio Silveira Banhos (advocacia, até mai.23)
- Carlos Bastide Horbach (advocacia, até mai.23)
Novo titular, na vaga de Ricardo Lewandowski
- Kassio Nunes Marques (STF, até ago.23)
Ministros substitutos
- André Mendonça (STF, até abr.24)
- Dias Toffoli (STF, até out.24)
- Maria Isabel Gallotti (STJ, até set.24)
- Maria Claudia Bucchianeri (advocacia, até ago.23)
- André Ramos Tavares (advocacia, até nov.24)