Após mudar o comando do Exército e enfrentar os ataques às sedes dos três Poderes em Brasília, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem novos desafios na relação com militares. O primeiro deles é o preenchimento de cargos de estatais ligadas a projetos estratégicos da Defesa. Em seguida, está o destino da empresa Avibrás, responsável pelos projetos de mísseis das Forças Armadas. E, por fim, há as promessas do governo sobre a previdência militar às entidades de praças sem que generais fossem consultados.
A Marinha é a Força mais preocupada com as movimentações do Centrão. Elas passam pela nomeação das diretorias da Nuclep, das Indústrias Nucleares do Brasil e da Empresa Brasileira de Participações em Energia Nuclear e Binacional (ENBPar). Petistas querem substituir o contra-almirante Carlos Henrique Seixas, visto como homem ligado ao ex-ministro de Minas e Energia, o almirante Bento Albuquerque, desgastado pelo episódio das joias do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) – caso revelado pelo jornal O Estado de S. Paulo.
Seixas, no entanto, tem apoio do deputado Aureo Ribeiro (SD-RJ), que pressiona o governo pela manutenção do almirante ou pelo direito de indicar o novo presidente da estatal. Com sede em Itaguaí (RJ), a Nuclep é uma das empresas do Prosub, o programa de submarinos da Marinha. Ela está trabalhando agora no Bloco 40, seção onde ficará o reator do protótipo, em terra e escala real, do submarino de propulsão nuclear do Brasil (SN-BR) – o projeto deve consumir mais R$ 17,5 bilhões antes do término.
O programa de submarinos tem ainda a Itaguaí Construções Navais. A montagem do reator em terra está no Centro Experimental Aramar, em Iperó (SP), no Laboratório de Geração Nucleoelétrica (Labgene). Posteriormente, o sistema será replicado no submarino. Após o reator, os turbogeradores, o motor elétrico e outros sistemas serão testados ali. Validados, serão instalados a bordo. A previsão da Marinha é de que o submarino vá ao mar em 2034. O projeto já custou R$ 35 bilhões.
Antes de assumir o comando da Força Naval, o almirante Marcos Sampaio Olsen foi diretor-geral de Desenvolvimento Nuclear e Tecnológico da Marinha. Olsen esteve com Lula em Itaguaí, no dia 22, com quem almoçou e teve uma conversa a sós. O receio da Marinha é de que as verbas do Prosub sejam capturadas por aliados do Centrão. Em 2017, no governo Michel Temer (MDB), três deputados do Rio fizeram uma ofensiva para dominar a Nuclep. Não conseguiram. A solução após a exoneração de Jaime Wallwitz Cardoso – que dirigiu a empresa de 2003 a 2017 – foi a nomeação do contra-almirante Seixas.
Além do submarino, a Nuclep é a única empresa do Brasil com certificação ASME-3, da Sociedade Americana de Engenharia Mecânica, para fabricação de componentes nucleares. Trata-se de selo que precisa ser renovado. Almirantes temem que a desorganização da empresa leve à perda do certificado.
A Nuclep está envolvida na construção de plataformas de petróleo e de equipamentos da Usina Angra 3, além de ter sido responsável pela troca dos geradores de vapor de Angra 1. O plano de privatização da Nuclep foi suspenso por Lula.
Mísseis
Enquanto o petista não bate o martelo sobre a direção das empresas envolvidas nos projetos da Marinha, o destino de outra empresa preocupa os militares. A Avibrás está em recuperação judicial. Teme-se que a venda a estrangeiros signifique perda do controle sobre tecnologias que não são encontradas na “prateleira de supermercados”.
A Avibrás desenvolve o míssil tático de cruzeiro brasileiro: o AV-TM300. Faz ainda parte do projeto do Mansup, o míssil antinavio de superfície, o primeiro desse tipo produzido no Brasil sem depender de equipamentos estrangeiros. O Mansup está na fase de transformação de protótipo em produto capaz de ser produzido industrialmente. Já o AV-TM-300 deve ser operado pelo Exército em lançadores Astros, da Avibrás. O Exército já investiu mais de R$ 100 milhões no míssil, arma fundamental no conflito da Ucrânia.
Previdência
Lula recebeu sargentos no dia 2 de março para discutir a previdência dos militares. Entre outros, esteve no encontro o presidente da Associação dos Militares das Forças Armadas do Estado de São Paulo (AMFAESP), Vanderley Carlos Gonçalves. E isso sem a presença e sem consultar nenhum dos comandantes das Forças Armadas.